Tribunal paraense leva cidadania a comunidades ribeirinhas

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Comunidades ribeirinhas que vivem no município de Almeirim (PA) receberam, na semana passada, um grupo formado por juízes, advogados, médicos, psicólogos e outros profissionais. A equipe chegou à região a bordo de barcos para levar atendimento judiciário, de saúde e assistência social a pessoas que dificilmente teriam acesso a esses serviços se não fosse por meio do projeto Ribeirinho Cidadão, realizado pelo Tribunal de Justiça do Pará.

Almeirim é um dos maiores municípios paraenses. Tem área de 72,9 mil quilômetros quadrados e uma população de cerca de 33 mil habitantes. Fica a 680 quilômetros de Belém e faz divisa com o Suriname, a Guiana Francesa e o Amapá. Seu território é entrecortado pelos rios Arraiolos, Paru, Chicaia e Jari, ao longo dos quais vivem 147 comunidades ribeirinhas.

Para se adequar às características geográficas da região, o Ribeirinho Cidadão dividiu a Comarca de Almeirim em rios, atendendo várias comunidades a cada etapa do projeto, que está na sua segunda versão. A primeira fase ocorreu no Rio Arraiolos, em julho passado. Agora, o destino da equipe foi o rio Paru.

Números – Entre os dias 9 e 13 de setembro, o projeto realizou 3.687 atendimentos em Almeirim, 680 deles pelo Poder Judiciário. Foram 127 audiências e 120 sentenças. Os advogados da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) realizaram 597 consultas jurídicas e o cartório extrajudicial efetuou 166 registros civis. O cartório eleitoral fez 115 regularizações eleitorais e a Polícia Civil emitiu 299 carteiras de identidade.

Na área da assistência social, foram 153 cadastros realizados. Médicos e enfermeiros realizaram 486 atendimentos, além de 158 coletas para tipagem sanguínea. O projeto também realizou atividades socioeducativas e pedagógicas, com jogos e exibição de filmes.

Segundo o juiz Márcio Bittencourt, da comarca de Almerim e coordenador do projeto, os profissionais se dedicam a esse trabalho de forma voluntária. Além da OAB e Polícia Civil, também houve participação da prefeitura do município. “A nossa equipe sai de barco para uma comunidade que se torna sede, como é Barreiras, aqui no rio Paru, e atende as demais comunidades vizinhas, aquelas que ficam a cerca de duas ou três horas de viagem”, explicou o magistrado.

Parcerias – Nesta segunda fase, 33 comunidades ribeirinhas foram atendidas por uma equipe de juízes, advogados, servidores de cartórios eleitoral e extrajudicial, além de médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, psicólogos e assistentes sociais. O projeto conta ainda com as participação de secretarias municipais de Educação, Saúde e Meio Ambiente. “São parcerias essenciais para a realização do projeto. Há quem dê a alimentação, o combustível, o transporte, enfim, é um trabalho em conjunto”, enfatizou o juiz.

O isolamento geográfico que impede o acesso dos cidadãos a serviços básicos é uma realidade também para o município vizinho de Porto de Moz, onde a juíza Fernanda Azevedo Lucena é titular da comarca. “Fiz questão de me voluntariar neste projeto para aprender e poder levá-lo também para o município de Porto de Moz. A realidade é bem parecida e é importante levar esses serviços básicos a todos”, disse a magistrada, que atuou na realização de casamentos, audiências e palestras.

O objetivo da presidente do Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), desembargadora Luzia Nadja Nascimento, é levar o projeto Ribeirinho Cidadão para outras regiões do estado. “Temos muito orgulho dos resultados do projeto e queremos estendê-lo para outras comarcas distantes e de difícil acesso, como a região do Marajó. As dimensões continentais do nosso estado exigem que o Judiciário vá até o cidadão”, observou.

Documento – Depois de enfrentar uma viagem de duas horas de barco, Antônia Tavares, da comunidade de São Francisco de Ananaí, chegou a Barreiras em companhia de dois filhos. “Trouxe meu filho mais criança para consultar e já recebemos o remédio. Trouxe também o Nanderson para tirar a identidade, porque no ano que vem ele vai fazer o ensino médio em Almeirim”, contou ela. “Queria tirar a identidade faz tempo, mas minha mãe não tinha como me levar para fazer isso. Agora, já tenho documento e estou muito feliz”, comemorou Nanderson Tavares, de 15 anos.

A ribeirinha Maria Madalena de Oliveira trouxe a mãe, Sebastiana, para organizar os documentos e receber a aposentadoria, que foi suspensa por causa de três registros de nascimento com erros. “Onde moramos alaga, então minha mãe perdeu o registro dela. Quando foi tirar outro, escreveram o nome dela errado, porque ela não conseguia falar e eu não podia ir com ela. Com o nome errado, ela perdeu a aposentadoria”, relatou Maria.

Em uma sala isolada, psicólogos e assistentes sociais atenderam famílias com diferentes problemas: de casos de abuso sexual à violência familiar e brigas. “Teremos que voltar mais vezes. São muitos os casos de abuso sexual. É necessário uma atenção maior para as famílias ribeirinhas”, afirmou a assistente social Wanessa Silva.

União estável – Durante o projeto, também foram realizados reconhecimentos judiciais de união estável. Raimundo da Paixão e Maria Célia vivem juntos há 30 anos e decidiram oficializar o casamento. “É bom a gente fazer aquilo que está dentro da lei. Agora, será até que a morte nos separe”, garantiu Raimundo. Sua história serviu de inspiração a outros casais, como Sebastião e Elielza, juntos há mais de 15 anos. “Ela engravidou e eu assumi meu compromisso de pai. Hoje, assumo diante dos juízes um novo compromisso com ela. A Elielza é a mulher da minha vida”, declarou Sebastião.

Fonte: TJPA