Prevenir e enfrentar situações humilhantes e constrangedoras no trabalho, bem como impedir o tratamento diferenciado que inferioriza determinados grupos ou pessoas no ambiente corporativo. A partir desta semana, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) deu mais um passo para a criação de uma política que garanta a atuação e a abordagem adequada de casos desse tipo, que adoecem o trabalhador e prejudicam a execução das tarefas. Os temas assédio moral, assédio sexual e discriminação serão estudados por um grupo de trabalho instituído em 8 de fevereiro.
O colegiado fará propostas que vão integrar a Política de Prevenção e Enfrentamento do Assédio Moral, do Assédio Sexual e da Discriminação, criada a partir da Resolução nº 351/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), publicada em outubro do ano passado. O trabalho de cada um dos integrantes vai contribuir para a reestruturação da Comissão Paritária e Multidisciplinar de Estudos, Prevenção e Recebimento de Reclamações, que já atua no TJMG desde 2013.
“O grupo instituído fortalecerá os trabalhos já adotados no Tribunal para lidar com esses temas de extrema importância para os nossos públicos, sejam eles minoritários e vulneráveis ou não”, explica o superintendente administrativo-adjunto do TJMG, desembargador José Arthur Filho, que coordenará os trabalhos. Para o magistrado, o combate às atitudes de assédio e discriminação, por qualquer motivo, no âmbito das relações socioprofissionais, deve ser abraçado, garantindo aos servidores, magistrados, estagiários e colaboradores a segurança, o diálogo, a cooperação e o respeito que o ambiente de trabalho requer.
Dignidade humana
O coordenador dos trabalhos ressalta ainda que a criação de uma política vai dar mais amparo à comissão que já existe no TJMG, favorecendo a atuação de seus membros. “O combate aos casos de assédio e discriminação deve ser constante, e o Poder Judiciário precisa adotar estratégias efetivas e coletivas. Não mediremos esforços para garantir os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, com ênfase na dignidade humana e na integridade física, psíquica, sexual e moral de todos.”
O superintendente de Saúde do Tribunal, desembargador Bruno Terra Dias, que também integra o grupo criado, acredita que o processo civilizador impõe a necessidade de freios morais que impeçam ou desencorajem as atitudes de assédio e discriminação. “Esse grupo de trabalho inscreve o Tribunal como protagonista de uma transformação cultural essencial nesse processo civilizatório, nos tirando da posição de apenas espectadores.”
O desembargador alerta para o fato de que atitudes que não são éticas contaminam os ambientes, inclusive o de trabalho, motivando conflitos que se desdobram em desequilíbrios emocionais e, em situações extremas, até em transtornos de comportamento graves. Atualmente, a Superintendência de Saúde do TJMG toma conhecimento dos casos de assédio por meio da Diretoria Executiva de Administração de Recursos Humanos (Dearhu) e da Gerência de Saúde no Trabalho (Gersat). O magistrado acredita que, para o aperfeiçoamento do acompanhamento desses casos, será necessário desenvolver uma metodologia que, inclusive, leve em conta as transformações ocorridas no ambiente corporativo com a pandemia.
Conhecimento
O desembargador defende que as primeiras ações do grupo de trabalho sejam voltadas para a produção do conhecimento, que vai nortear a concepção de uma política. “Outro passo que temos em mente é a atuação voltada para a criação de um ambiente adequado, em que as vítimas se sintam seguras para revelar as situações conflitivas sem receios”, afirma. Para o magistrado, enfrentar as situações de assédio e discriminação é também uma forma de garantir a prestação de um serviço judicial qualificado ao cidadão. “Estamos falando de uma mudança cultural necessária, o que não se alcança apenas com esforço do Judiciário, mas com a participação de todos.”
A juíza Maria Isabel Fleck, presidente da Comissão Paritária e Multidisciplinar de Estudos, Prevenção e Recebimento de Reclamações acerca do Assédio Moral no Trabalho no âmbito da Justiça Comum do Estado de Minas Gerais (Coassed), explica que a resolução do CNJ e a criação do grupo de trabalho no TJMG vão melhorar a estrutura que já existe. “Já temos uma atuação consolidada e, até o período anterior à pandemia, nosso foco era a prevenção. Já estávamos conseguindo mapear as comarcas adoecidas”, detalha. A pandemia, no entanto, não apenas dificultou o trabalho, como mudou o perfil das reclamações atendidas pela Coassed.
“Tivemos um aumento no número de denúncias. Há muitos profissionais trabalhando sob pressão, sobrecarregados e muito estressados. Assim, nossa atuação deixou de ser preventiva, neste momento, e está mais voltada para a intervenção”, explica a juíza. Outra nova realidade enfrentada pela Comissão Paritária, com a pandemia, tem sido a de casos de denúncia de assédio moral coletivo. “Precisamos nos readaptar a uma nova realidade e aprender a lidar com as diferenças também nesse momento tão delicado.”
Regionalização
Maria Isabel Fleck ressalta que a política desenvolvida hoje no TJMG prioriza não só prevenir, mas também apaziguar conflitos e apontar soluções quando as situações de assédio já estão instaladas. O acréscimo do assédio sexual e da discriminação no escopo do trabalho, na visão da magistrada, apenas complementa as situações atendidas pela Comissão. “Todo caso de assédio sexual e de discriminação acaba por culminar também no assédio moral.”
Entre as sugestões da magistrada para as discussões do grupo de trabalho estão a necessidade de regionalização das ações de prevenção e combate e a integração das áreas do TJMG que atuam nos casos de assédio. A magistrada também ressalta a importância de que a equipe da Comissão seja qualificada para lidar com o tema, garantindo o sigilo das denúncias e o correto tratamento de cada caso, de forma a minimizar o medo das vítimas de denunciar.
A presidente da Comissão Paritária lembra também que o assédio moral não apenas adoece, mas leva ao absenteísmo, o que compromete significativamente os resultados do trabalho. “Precisamos reconhecer essa realidade e criar mecanismos para tratá-la. A criação desse grupo de trabalho fortalece as ações que já estamos desenvolvendo”, afirma. Em 30 dias, as propostas serão apresentadas ao presidente do TJMG, desembargador Gilson Soares Lemes.
Além do superintendente adjunto do TJMG, do superintendente de Saúde e da presidente da Comissão Paritária, integram o grupo de trabalho a desembargadora Maria Inês Rodrigues de Souza, superintendente de Equidade de Gênero, Raça, Diversidade, Condição Física ou similar; a ouvidora do TJMG, desembargadora Cláudia Maia; os juízes auxiliares da Presidência e das Vice-Presidências; o juiz auxiliar da Corregedoria-Geral de Justiça Eduardo Gomes dos Reis; o servidor Guilherme Augusto Mendes do Valle, da Secretaria Especial da Presidência e das Comissões Permanentes (Sespre), que dará apoio ao trabalho do grupo; e a servidora Sheila Augusta Ferreira Fernandes Salomé, representante do Sindicato dos Servidores da Justiça de Primeira Instância do Estado de Minas Gerais (Serjusmig). A critério da coordenação do grupo, servidores de outras áreas poderão ser convocados para participar das discussões.
Fonte: TJMG