Tribunais oferecem apoio psicológico e conciliação aos superendividados

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Com o salário totalmente retido no banco para o pagamento de empréstimos consignados e uma dívida de mais de R$ 100 mil que só aumentava, a funcionária pública M.S. encontrou no Programa de Prevenção e Tratamento dos Consumidores Superendividados do Distrito Federal (PPTS), coordenado pela segunda Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), uma esperança para se estabilizar financeira e emocionalmente. M.S. é uma das 500 pessoas em situação de superendividamento que foi atendida pelo programa desde o seu surgimento, em dezembro de 2014. O programa, que tem por objetivo a prevenção e o tratamento de pessoas nessa situação, vem apresentando uma metodologia inovadora no Poder Judiciário, atuando na esfera jurídica, socioeconômica e psicossocial.

Além do TJDFT, também já foram implantados programas de atendimento aos superendividados nos Tribunais de Justiça (TJs) do Estado de São Paulo, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Paraná. A iniciativa está em conformidade com a Política Nacional de Conciliação, instituída pela Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), à medida que atua pró-ativamente na resolução de conflitos por meio de conciliação entre a parte devedora e seus credores, buscando uma prestação jurisdicional mais célere e efetiva. Por meio da conciliação, o Programa de Prevenção e Tratamento dos Consumidores Superendividados do Distrito Federal já obteve 867 renegociações e quitações de dívidas, dentre acordos judiciais e pré-processuais.

Atendimento multidisciplinar – O programa vai muito além da prática da conciliação, procurando abarcar as demandas da sociedade que podem levar ao endividamento, como descontrole das finanças pessoais, desemprego, divórcio, adoecimentos, redução de renda, aposentadoria, vulnerabilidade das pessoas idosas nas relações de consumo e distúrbios de comportamento, como, por exemplo, a compulsão por compras. Com um atendimento multidisciplinar, são realizadas mesas redondas, palestras, oficinas, sessões de orientação financeira e encaminhamento psicossocial. O programa atende não apenas consumidores que sejam parte em processos judiciais, mas qualquer cidadão que esteja em situação de superendividamento ou deseje orientação financeira.

Bola de neve – A história de M.S. é um caso clássico de superendividamento. A funcionária pública estava com sua renda totalmente comprometida, retida pelo banco para o pagamento de juros de empréstimo consignado que havia feito. De acordo com ela, o primeiro empréstimo foi feito para tratamentos de saúde – a funcionária possui fibromialgia e passou por um quadro depressivo – e, a partir daí a dívida foi aumentando, em efeito “bola de neve”, ultrapassando R$ 100 mil. “Eu não tinha a renda liberada para pagar o básico, o que me levou a contrair novas dívidas com bancos e com amigos”, relata.

Sem dinheiro para contratar um advogado e tentar renegociar suas dívidas, a funcionária procurou o programa. “Recebi muito acolhimento, como em uma família, passei por sessões com psicólogos e recebi orientação financeira, em momento nenhum me culparam por nada”, conta. M.S. Ela relata ainda a dificuldade em lidar com expressões que passaram a fazer parte de sua vida, como ”nome sujo”. “Isso parece alguém que cometeu um crime contra a população. Sempre trabalhei, faço trabalho voluntário, sou uma pessoa ética, quero pagar minhas dívidas”, diz.

Com a saúde comprometida e um quadro depressivo grave devido a situação de superendividamento, M.S. teve que se afastar do trabalho e dedica-se exclusivamente a resolver o seu problema. Como o seu salário estava retido, a funcionária viu-se impedida de fazer qualquer negociação com seus credores. Agora, por meio de uma decisão judicial obtida no mês passado que obriga o banco a liberar 70% de sua renda, ela pretende começar as conciliações.

Família endividada – Outro caso que chamou a atenção da coordenação do programa foi um casal com um filho e renda familiar de R$ 5.300 com uma dívida de aproximadamente R$ 227,5 mil, sem contar os débitos com financiamento imobiliário. A família tinha feito empréstimos consignados no valor de R$ 197 mil, diversos débitos em operadoras de celular e lojas de varejo, dentre outras dívidas. As razões para o superendividamento, conforme detectadas pelo programa, foram o desemprego, uma doença na família e o fato de gastarem mais do que ganhavam.

Com o orçamento altamente comprometido – o que acarretava danos à saúde emocional – e perturbados com as ligações dos credores, o casal participou, em março, de uma sessão familiar de orientação financeira e, até agora, já foram feitos 15 acordos judiciais e extrajudiciais com os credores. Boa parte da dívida foi renegociada e o casal continua em acompanhamento pelo Programa de Prevenção e Tratamento dos Consumidores Superendividados do Distrito Federal.

Prevenção – M.S. acredita que, após a orientação financeira que recebeu, será impossível passar por uma situação de superendividamento novamente. “A educação financeira deveria ser uma matéria trabalhada na escola”, diz. De acordo com informações da segunda vice-presidência do tribunal, de um lado acredita-se no empoderamento do consumidor, por meio da educação financeira, consciente do seu papel como sujeito ativo na relação de consumo, responsável pela boa administração de sua renda e escolhas de como gastar bem o seu dinheiro. De outro, na conscientização do credor da importância da concessão do crédito responsável e da conciliação como meio alternativo e eficaz de solução de conflitos.

Luiza de Carvalho Fariello
Agência CNJ de Notícias