Inovação é indispensável para empresas e instituições se manterem eficientes, sustentáveis e se adaptarem às mudanças da sociedade. Mas nem sempre inovar está associado ao desenvolvimento de novas tecnologias. É o que mostram dois dos vencedores da edição 2024 do Prêmio Inovação, concedido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) desde 2021. A corte estadual pernambucana garantiu a premiação ao desenvolver um totem de autoatendimento. Já o consórcio formado pelos tribunais regionais eleitorais de Alagoas, do Maranhão e de Minas Gerais apostou no uso da linguagem simples para desenvolver um dos projetos reconhecidos.
O Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) deu o nome de “Sistema de Justiça Aqui” à iniciativa que conquistou o primeiro lugar na categoria “Serviços Judiciários Inovadores aos Usuários — Inovações com resultados comprovados”.
Em 2021, o então corregedor-geral da Justiça do TJPE, desembargador Luiz Carlos de Barros Figueirêdo, queria tornar mais célere o acompanhamento dos registros de pessoas que necessitam apresentar-se em juízo nas unidades jurisdicionais da corte.
O desafio foi abraçado pelos servidores da Presidência André Caetano Alves Firmo e Marta Marques Agra. Além de desenvolverem o projeto, eles mantêm a iniciativa e atuam na expansão para outras unidades. Quase 27 mil cumpridores de penas alternativas já confirmaram o comparecimento por meio do totem, com média mensal de 13 mil registros.
A prática foi concretizada em um totem de autoatendimento fabricado pelo Departamento de Marcenaria da corte pernambucana, com apoio da área de tecnologia, que providenciou os equipamentos de informática e o desenvolvimento do sistema com leitores biométricos e impressoras térmicas.
Expansão
Inicialmente, o projeto-piloto contou com dois equipamentos instalados no Fórum Rodolfo Aureliano, em Recife, atendendo às 300 pessoas que cumpriam determinações da Vara de Execuções de Penas Alternativas. Com o êxito do piloto, houve a expansão do serviço para outros fóruns da capital e do interior. Atualmente, 16 cidades são atendidas pelo sistema e cada localidade conta com duas máquinas e uma estação de cadastramento.
“Em breve, mais 40 outros vão receber os totens e, para o próximo ano, nova fase de expansão deve levar o ‘Justiça Aqui’ aos municípios do sertão, agreste e zona da mata pernambucanos”, adianta André. O servidor explica que a implantação do serviço depende de cada unidade, que utiliza recursos próprios para providenciar os equipamentos.
O funcionamento da ação é bem simples, mas trouxe agilidade e praticidade aos usuários. Quem cumpre pena alternativa e precisa comparecer mensalmente às unidades jurisdicionais do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) passou a contar com serviço mais célere. Agora, durante a primeira apresentação, com o comparecimento em juízo, é cadastrada a biometria da pessoa. Assim, nas próximas vezes, os sentenciados registram a presença de forma autônoma, em apenas 30 segundos, no totem de autoatendimento.
“Antes, a pessoa se apresentava na secretaria, precisava assinar o livro de presença e aguardar que um servidor da unidade carimbasse a caderneta atestando a presença, depois de conferir a identidade do cumpridor, por meio de documento com foto”, detalha André. Apesar de o processo demorar em torno de 15 minutos, formava fila na entrada da vara, o que trazia transtorno para a entrada e a saída do público, relata.
Ele ainda relembra que algumas pessoas vinham de longe e chegavam no fórum antes da abertura das unidades. “No totem, com a digital, não há falhas. O reconhecimento é instantâneo e a pessoa sai com seu comprovante de comparecimento impresso na hora”, explica.
Agora, o TJPE mantém conversas com outros tribunais do estado para incluir na plataforma de atendimento outros serviços. A intenção é aproveitar melhor os totens e oferecer aos cidadãos um único canal de acesso e comunicação com a Justiça pernambucana.
Linguagem simples
Já o consórcio formado pelos tribunais regionais eleitorais venceu na categoria “Serviços Judiciários Inovadores aos Usuários/Ideias Inovadoras”, com o projeto “Preste atenção nas contas! É legal e pode ser fácil”. O prêmio concedido pelo CNJ, ao estimular e disseminar soluções que integram tecnologia, sustentabilidade e inovação, promove debates e trocas de experiências transformadoras. Entre outros quesitos, é valorizado o uso da linguagem simples, como utilizado no projeto que esclareceu a candidatos das eleições de 2024 sobre a prestação de contas nas campanhas.
Uma das idealizadoras da iniciativa, a servidora Valéria Aparecida de Souza Machado, do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG), detalha que havia reclamação das zonas eleitorais quanto à prestação de contas dos candidatos. “É um tema árido e havia muitos problemas com diligências, processos apresentados fora do prazo legal, documentação errada e faltante”, relata a servidora.
Em cumprimento à Meta 9 do Poder Judiciário, Valéria disse que, após reunião do Laboratório de Inovação, Inteligência e Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Justiça Eleitoral (Liods-JE), vislumbrou uma oportunidade de desenvolver algo sobre o processo de prestação de contas. A Meta 9 prevê a implantação de dois projetos de inovação que tenham participação de pelo menos um laboratório de outro tribunal.
Assim, com a adesão do Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE-AL) e do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão (TRE-MA), encaminharam pesquisa aos diretórios regionais e municipais sobre as maiores dificuldades nesse processo. Ao mesmo tempo, colheram a opinião de representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e do Conselho Regional de Contabilidade dos três estados. Com as informações reunidas, “focamos em como reduzir erros comuns que acarretavam atraso nos processos de prestação de contas, e a solução que surgiu foi a disponibilização de pílulas em linguagem simples destinadas a advogados, contadores e candidatos”, detalha o servidor Yuri Anísio, do TRE-AL.
Para que a informação chegasse no momento certo para que o prestador de contas pudesse registrar, corrigir ou efetuar despesas da melhor forma, organizaram o trabalho a partir do calendário eleitoral. “Criamos uma linha do tempo com data inicial e final para cumprimento das atividades. Para cada marco, elaboramos um card, com informações relevantes, dicas, exemplos”, recorda a servidora da corte eleitoral mineira. Ela ressalta que a tarefa consistiu em interpretar a legislação e orientar sobre os documentos a serem reunidos.
Os cards eram divulgados nas redes sociais, na internet e nos diretórios de partidos dos três estados, de três a cinco dias antes de cada data identificada no calendário. “A ideia seria que a informação chegasse no momento certo para que o prestador de contas pudesse registrar, corrigir ou efetuar despesas da melhor forma”, complementa Yuri.
O grupo produziu ainda uma cartilha para ser distribuída aos principais bancos. A distribuição contou com apoio das zonas eleitorais que encaminharam às agências bancárias municipais. Os autores do projeto ainda cadastraram quase 1,5 mil usuários, entre representantes de partido, candidatos, advogados e contadores em listas de transmissão para o envio de todo o material produzido.
Na opinião de Yuri, o projeto feito com as regionais “trouxe perspectivas diferentes, mas que somaram nos resultados”. Ele acredita que ter chamado advogados e contadores para o desenvolvimento da solução “foi essencial, pois só com a visão de quem atua do outro lado do balcão pudemos afinar ainda mais o produto”.
O próximo passo é medir o alcance da iniciativa. “Vamos reunir o número de processos rejeitados, entregues com atraso ou mesmo prestações não entregues das eleições de 2020 e comparar com o mesmo número relativo às eleições de 2024, para verificarmos se houve redução significativa de processos irregulares”. Isso deve ocorrer após o julgamento de todas as contas. “Apesar de a entrega dos documentos ter sido em novembro, por se tratar de grande volume de processos, os juízes ainda têm prazo pra julgar e só poderemos comparar após o trânsito em julgado”, explica Valéria.
Mesmo com o trabalho ainda em andamento, o servidor do TRE-AL disse que o grupo está muito feliz com o reconhecimento obtido pelo projeto. “Fomos surpreendidos positivamente ao perceber que, mesmo sem muita tecnologia envolvida, sem desenvolvimento de softwares complexos, pudemos vencer um prêmio de nível nacional. Foi muito gratificante”, assegurou.
Texto: Margareth Lourenço
Edição: Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias