O desembargador Edson Ulisses de Melo participou, como conferencista, da Sessão Virtual da Academia Sergipana de Letras (ASL) na segunda-feira (10/8). O magistrado, que também é acadêmico da ASL, abordou a temática “O sistema prisional em tempo de pandemia”, palestra que foi transmitida pelo canal do YouTube da ASL.
O desembargador, que é membro da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE), fez um breve histórico do sistema de aplicação de penas àqueles que cometem crimes e dos papéis dos poderes Judiciário e Executivo no cumprimento da legislação penal. Falou sobre a criação das unidades prisionais, que são destinadas ao cumprimento das penas privativas de liberdade, inclusive, explicando os tipos de penas e as prisões em regimes fechados e semiabertos.
Sobre a população carcerária no Brasil, apresentou o levantamento feito pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen) que apontam uma população carcerária de aproximadamente 773 mil presos, dados referentes ao primeiro semestre de 2019, entre prisões provisórias e definitivas. Com relação às medidas adotadas para conter a proliferação do coronavírus nas unidades prisionais, citou a Recomendação nº 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça, a qual resultou na substituição de 30 mil penas de prisões em presídios por recolhimento em prisão domiciliar aos detentos que apresentaram comorbidades graves.
“A situação que debatemos versa sobre dois valores importantíssimos: a liberdade, relacionada ao sistema prisional e a vida, diante do enfrentamento à Covid-19. Considerando a Recomendação nº 62, nós, nos Tribunais, nos deparamos comumente com pedidos de HCs, acompanhados de atestados médicos de presos acometidos de comorbidades graves. Consideramos nas decisões, inclusive, o alto risco de contaminação da Covid-19 em um ambiente fechado, com condições infraestruturais deficitárias e que por falta de impossibilidade maior de distanciamento social pode resultar em uma maior contaminação. No regime prisional, a possibilidade de se manter um distanciamento é quase que impossível, uma vez que as penitenciárias estão superlotadas, com espaços insuficientes devido à superpopulação carcerária”, explicou Edson Ulisses.
O magistrado refletiu sobre a flagrante superpopulação nos presídios, as péssimas condições e infraestrutura, o desrespeito à dignidade da pessoa humana. Lembrou que, no Brasil, a Constituição Federal não admite pena de morte, prisão perpétua, pena de banimento ou tratamento cruel nas prisões.
“O Brasil é o país que mais encarcera, mas o preso, além de ser uma pessoa com obrigações perante a sociedade, deve usufruir do exercício da sua dignidade. A pena de prisão é para que seja cumprido somente o afastamento social, porém sem que se admitam penas cruéis ou degradantes, conforme proíbe a Constituição Federal. Por isso, é tão importante tentar ressocializar o preso, uma vez que o preso que não tem sua dignidade respeitada, ao retornar à sociedade, sem oportunidade e indignado com o tratamento que lhe foi dado no ambiente prisional, provavelmente, irá reincidir. Não se pode mais impor ao sistema carcerário uma população esquecida, jogada para debaixo do tapete, marginalizada e que não usufrui de direitos previstos no artigo 41 da Lei de Execução Penal.”
O desembargador apresentou os dados divulgados pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), segundo o qual 883 presos foram infectados com a Covid-19, o que corresponde a 0,11% da população prisional. A taxa de mortalidade por Covid-19 no sistema prisional é 0,04 por 1000 presos, taxa menor que em países como Canadá (0,33), Estados Unidos (0,20), Itália (0,05).
Abordando o cenário sergipano, ele mostrou dados divulgados pelo Executivo, os quais revelam que dos 5.271 detentos, 6 foram infectados com a Covid-19, com registro de 1 óbito. Relatou sobre as ações de enfrentamento adotadas pelo estado de Sergipe, a adoção das medidas sanitárias para contenção do coronavírus, como a suspensão de visitas e realização de mais de 5 mil videochamadas entre presos e seus familiares e troca de cartas; a fabricação de máscaras pelo Presídio Feminino, mediante o Projeto Odara, distribuídas para a população carcerária e para servidores públicos. Destacou também que os resultados positivos no combate à pandemia na população carcerária devem-se, igualmente, às decisões judiciais que permitiram que presos em Sergipe tivessem acesso à prisão domiciliar e à liberdade provisória com o monitoramento eletrônico, em conformidade com a Recomendação nº 62, do CNJ.
O acadêmico Jorge Carvalho destacou a aula que foi oferecida a respeito do sistema prisional. “Aprendi muito com a sua fala, uma vez que nós, que não somos operadores do Direito, mas cidadãos de modo geral, temos uma percepção muito rasa do sistema penitenciário e de suas implicações.”
“Foi muito esclarecedora a conferência com números, dados muito objetivos que nos foi colocado para dar suporte a esse sentimento humanista que o senhor, Desembargador Edson, tem quando atua no TJSE, com pleno conhecimento do sistema prisional brasileiro e sergipano. Uma lição de como estão as coisas no tempo de pandemia e de como são em tempos normais”, avaliou o acadêmico Carlos Pinna de Assis.
Fonte: TJSE