A difusão contínua de informação e conhecimento é um dos pilares para a sustentabilidade da Ação Nacional de Identificação Civil e Emissão de Documentos para Pessoas Privadas de Liberdade, executada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em todo o país para garantir que pessoas presas sejam civilmente identificadas e tenham acesso aos seus documentos. Para debater os avanços e os desafios no tema, foi realizado na quinta-feira (12), em São Paulo, o seminário Boas Práticas da Ação Nacional de Identificação Civil e Emissão de Documentos para Pessoas Privadas de Liberdade, com transmissão ao vivo pelo YouTube do CNJ.
Organizado em parceria com a Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo (SAP-SP), o evento reuniu representantes do Executivo e do Judiciário de diversas unidades da federação, que compartilharam estratégias bem-sucedidas sobre a adaptação das rotinas de trabalho na implementação do fluxo contínuo da identificação civil no ciclo penal. “Essa ação partiu do zero para se tornar uma verdadeira política do Estado”, diz o juiz coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) do CNJ, Luís Lanfredi. “Quando olhamos para os números, para os mais de 320 mil documentos emitidos, entendemos a dimensão dessa iniciativa, que só é possível graças ao comprometimento dos inúmeros atores envolvidos e sobretudo pela adesão dos estados, que hoje são capazes de produzir boas práticas para o aprimoramento contínuo desse projeto”.
Paraíba, Ceará e São Paulo são as três primeiras unidades da federação a completarem 100% da identificação civil de suas populações carcerárias, assim como as unidades penitenciárias federais de Brasília (DF) e Mossoró (RN).
João Felipe Menezes Lopes, juiz auxiliar da Presidência do CNJ com atuação no DMF, disse na mesa de abertura que um dos objetivos de um evento como esse é justamente disseminar e entender como esses estados chegaram ao exitoso resultado, servindo de incentivo para que outros também o alcancem: “Eles conseguiram porque compreenderam a importância de biometrizar essas pessoas e documentá-las, o que é essencial para a ressocialização e a segurança pública. A identificação correta é um ganha-ganha que beneficia todos os envolvidos”.
“Eu sou apenas o portador da mensagem de milhares de funcionários que se dedicaram para identificar biometricamente nossa população prisional. O trabalho foi complicado, mas foi superado com dedicação e boa vontade”, diz o secretário da SAP-SP, Marcello Streifinger. O estado chegou à marca de 227 mil pessoas identificadas desde que a coleta biométrica começou, há cerca de um ano. “Se a gente está pensando no recomeço, em uma virada de página na vida dessas pessoas que deixam a prisão, a situação documental é extremamente relevante, porque o mundo de hoje não aceita a pessoa que é invisível documentalmente”.
Assessora-chefe de Gestão de Identificação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Marília Loyola destacou o trabalho coletivo e a cooperação entre diversas instituições. “Esse projeto lá atrás era um sonho. Hoje virou uma realidade positiva, grandiosa, com números expressivos, algo que só é possível fazer com várias mãos. Alcançamos a marca de cerca de 1 milhão de ações executadas e mais de 380 mil pessoas atendidas. É um orgulho fazer parte de algo tão valoroso, um projeto que olha para as pessoas vulneráveis e traz uma identificação segura, eficaz e correta”.
A Ação Nacional de Identificação Civil e Emissão de Documentos para Pessoas Privadas de Liberdade integra o escopo de ações do programa Fazendo Justiça, coordenado pelo CNJ em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Nesta formação específica, conta ainda com o apoio do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen), além da cooperação de mais de 150 instituições.
Estratégias e desafios
Para o secretário de estado da Administração Penitenciária da Paraíba (SEAP), João Albuquerque, um fator importante para o sucesso da operacionalização no estado foi o monitoramento realizado pela secretaria, acompanhando o cumprimento das metas por cada unidade: “Com isso, fomos identificando as fragilidades e acionando os setores competentes para a resolução dos casos, com qualificação da força-tarefa. A partir daí, criamos um documento com balanços periódicos, dando conhecimento a todos sobre a evolução das coletas”.
Larissa Braga, juíza colaboradora do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMF) no Ceará, lembra que o caminho até a cobertura de 100% da população prisional no estado passou por alguns desafios: “Todas as questões foram sendo sanadas com muito diálogo entre as autoridades do Poder Executivo, Poder Judiciário e todas as outras instituições e órgãos, além do apoio do CNJ e do PNUD por meio do programa Fazendo Justiça, que é fundamental”, diz. “Outra dificuldade muito grande que enfrentamos foi a da interiorização. Demoramos um pouco mais para fazer porque avançamos primeiro em outras questões para além da biometria. Por exemplo, criamos seis núcleos de custódia, a partir dos quais possibilitamos a apresentação da pessoa presa no prazo de 24 horas, o que exige articulação e deslocamento em todo o estado, para hoje conseguirmos ter essa biometria já na porta de entrada”, conta Larissa.
Capacitação e treinamento
Janser Ricardo Gonçalves, diretor do Grupo Regional de Ações de Trabalho e Educação da Coordenadoria de Unidades Prisionais da Região Noroeste (SP), destacou como boa prática a capacitação de servidores e a otimização dos equipamentos: “Cada unidade prisional do estado disponibilizou dois servidores para serem capacitados, e cada coordenadoria também treinou dois servidores. Com isso, quando qualquer unidade tinha algum tipo de dificuldade, a coordenadoria estaria apta a prestar auxílio. Recebemos do CNJ um total de 183 kits de biometria e alocamos esses equipamentos conforme a necessidade das unidades”, conta. Ao todo, a Ação Nacional distribuiu 5,4 mil kits biométricos em todo o país.
Carlos de Almeida Rossato, diretor da Penitenciária Industrial de Joinville (SC), conta que a força-tarefa criada no estado envolveu ainda um trabalho de conscientização sobre a importância dessa ação tanto entre servidores como também com as próprias pessoas privadas de liberdade: “No começo, houve uma reação contrária do porquê dessa identificação por parte das pessoas presas, e, a partir disso, promovemos uma conscientização sobre o quanto era importante para eles ter essa identificação e o quanto resultaria para eles depois em questões de documentos e tudo mais o que isso envolve”.
“O feedback de vocês é muito importante para nós, a partir de tudo que evidenciam na prática, e daí a riqueza de um evento como esse”, ressaltou Alexander Cambraia, coordenador do eixo de Sistemas e Identificação do programa Fazendo Justiça. “Foi muito interessante ver os diferentes desafios locais e, com isso, as diferentes estratégias que foram adotadas. Muito embora tenhamos um fluxo de informação, ele acaba sendo adaptado para distintas realidades, potencialidades e capacidades”.
Resultados e perspectivas
Desde que a Ação Nacional foi lançada, mais de 385 mil pessoas foram atendidas no fluxo de identificação civil. Por sua vez, os dados da documentação resultaram em 321 mil ações de emissão de documentos, entre certidões de nascimento, RGs, CPFs, títulos de eleitor e outros. Os dados foram apresentados pela coordenadora do Núcleo de Identificação Civil e Emissão de Documentos (NID) do programa Fazendo Justiça, Virgínia Popiel. “Pensando na sustentabilidade dessa ação, para que ela realmente flua de forma contínua, é importante destacar que dispomos também de uma equipe de suporte e atendimento ao usuário, que atende chamados com atenção às necessidades de cada estado. Além disso, temos um processo contínuo de manutenção das informações, promovendo capacitações, produtos de conhecimento e materiais informativos para que todos estejam sempre atualizados”.
Segundo ela, 8.344 chamados de atendimento e suporte a usuários desses sistemas foram realizados até hoje, e mais de 21 mil pessoas já foram impactadas em 1.089 ações de capacitação.
Para seguir aprimorando esses fluxos e o fornecimento de informações, Virgínia explica que dois produtos estão em avançado processo de desenvolvimento: o Serviço de Autenticação Cadastral (SEAC), que fomentará a legitimidade dos cadastros de partes para o Poder Judiciário, tornando-se uma ferramenta de busca confiável para obtenção de dados certificados, e um painel de indicadores, específico para consulta externa, possibilitando o monitoramento dos dados nacionais e estaduais referentes à Ação Nacional de Identificação Civil e Emissão de Documentos para as Pessoas Privadas de Liberdade.
Além disso, um quarto ciclo de capacitação on-line está previsto para acontecer em novembro deste ano, destinado a servidores e gestores nos âmbitos das secretarias de administração penitenciária e do Poder Judiciário, entre outros órgãos e instituições de interesse.
Texto: Leonam Bernardo
Edição: Nataly Costa
Agência CNJ de Notícias