Seminário debate gargalos e boas ideias na proteção da primeira infância

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Sensibilidade, fluxos integrados, iniciativas e mais diálogos intersetoriais podem contribuir para promover a melhoria no cumprimento dos direitos das crianças nos mais variados setores de suas vidas: foi o que representantes do Sistema de Justiça, do Poder Executivo nacional e sa sociedade civil constataram durante os debates na tarde da última terça-feira (25/6), em Brasília, no Seminário pelo Pacto Nacional da Primeira Infância – Região Centro-Oeste, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e parceiros.

As discussões – que detectaram gargalos e boas ideias na proteção das crianças com até 6 anos de idade – fazem parte do Pacto Nacional pela Primeira Infância, assinado por 42 órgãos governamentais e entidades da sociedade civil ligadas à infância.

Para o juiz Sérgio Luiz Ribeiro de Souza, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), que mediou o painel sobre boas práticas implementadas na Região Centro-Oeste e no Tocantins, é fundamental que magistrados conheçam os programas de assistência, saúde e cultura à disposição das famílias brasileiras. “O magistrado integra uma rede de proteção que envolve o poder público e a sociedade civil. Ele tem obrigação de conversar com toda a rede para melhor utilizar os instrumentos a favor da proteção das crianças, dos jovens e das famílias. Nós temos essa obrigação”, afirmou Sérgio, que é membro do Fórum Nacional da Infância e da Juventude (Foninj), coordenado pelo CNJ. 

Vulnerabilidade

Nos workshops, no painel e nas mesas redondas, profissionais do Sistema de Justiça, da assistência social e da saúde expuseram ações e desafios para garantir proteção às crianças brasileiras, principalmente aquelas que estão em situação de maior vulnerabilidade. Atualmente, segundo o Atlas da Segurança de 2018, crianças de até 13 anos representam mais de 50% do número de vítimas de violência sexual, no país. A maior parte delas, vítima também de cotidiana vulnerabilidade socioeconômica.

Durante o painel sobre a interface entre o Sistema de Justiça e as políticas de assistência social, educação, saúde, cultura e direitos humanos na proteção às crianças na Primeira Infância, representantes do Ministério da Cidadania apresentaram dados sobre o Programa Criança Feliz, que promove visita de profissionais (médicos, assistentes sociais e psicólogos) a lares carentes, com diversos tipos de atendimento.

O programa, segundo a secretária nacional de Promoção do Desenvolvimento Humano do Ministério da Cidadania, Ely Harasawa, envolve 21 mil profissionais e já atendeu, desde 2017, 672 mil pessoas, entre crianças (565 mil) e mulheres gestantes (107 mil). O foco do programa, explicou a palestrante, é proporcionar um melhor desenvolvimento das crianças nos primeiros anos de vida.

A primeira infância compreende o período dos primeiros seis anos completos, conforme dispõe o artigo 2º, da Lei n. 13.257/2016. Segundo a especialista, essa fase é determinante para a sociabilidade futura do indivíduo e, por isso mesmo, um programa voltado a ensinar pais a estimularem a capacidade cognitiva dos filhos contribui para o desenvolvimento das aptidões dessas crianças. “É uma aposta no futuro desses cidadãos”, afirmou.

Cárcere

No workshop que debateu a proteção à primeira infância nos casos de encarceramento materno, foi levantada a necessidade de atenção às mulheres gestantes e mães encarceradas no sistema prisional. O juiz auxiliar do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) do CNJ e membro do Foninj Carlos Gustavo Vianna Direito citou que o CNJ já vem trabalhando na implementação do Sistema Eletrônico de Execução Unificada (SEEU), para aprimorar os dados sobre essas mulheres, sob custódia do Estado.

“A medida vai permitir melhor conhecimento sobre a situação das apenadas e, consequentemente, permitirá melhor definição de programas e ações específicos voltadas a elas”, disse. Além de aumentar o conhecimento sobre os processos, o magistrado revelou que o Conselho Nacional de Justiça tem investido nos centros de monitoramento eletrônico (tornozeleiras), tecnologia importante para diminuir o caos no sistema penitenciário. Atualmente, o país possui quase 800 mil pessoas em cumprimento de penas. Dessas, 767 mil são homens e 41 mil são mulheres.

A diretora do Departamento de Tratamento Penal da Superintendência dos Serviços Penitenciários do Rio Grande do Sul, Simone Fagundes Messias Zanella, apresentou a experiência do PIM (Primeira Infância Melhor) aplicado junto com o Programa Criança Feliz, de visitas domiciliares, mas direcionado às mães em prisão domiciliar. Segundo ela, o projeto tem agido como um programa de prevenção à violência e à criminalidade.

“Atendemos 40 famílias extremamente vulneráveis. Em um dos casos, a mulher estava utilizando a tornozeleira eletrônica quando foi surpreendida por uma nova voz de prisão. Seu crime foi ter ido a um Centro de Assistência Social, que ficava em um perímetro além do permitido. A rede acionou o PIM e houve uma articulação para evitar um mal maior”, contou.

O foco nas ações de prevenção e de cuidado com as crianças também foi citado como exemplo de boa prática, em uma das mesas redondas. A juíza Maria Socorro de Sousa Afonso da Silva, do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), apresentou dados do Programa Amparando Filhos, vencedor da 14ª edição do Prêmio Innovare, na categoria Tribunal. O projeto dá apoio psicológico, pedagógico, educacional, assistencial e material aos filhos de mães presas.

“São várias ações, entre elas, a de fortalecer os vínculos entre essas mães e seus filhos. Tentamos fazer com que essas experiências sejam o menos traumática para ambos. Há muita vergonha, culpa e tristeza nessas experiências”, diz a magistrada.

O bárbaro caso do menino Rhuan, assassinado pela mãe no Distrito Federal, foi apontado pela Secretária Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Petrucia de Melo Andrade, durante o painel que tratou das políticas públicas, como um exemplo de falha do sistema público social e de saúde. “Tem hora que me sinto frustrada. Principalmente, quando não chegamos a tempo de salvar uma criança. Foi o caso dele”, afirmou.

Para a secretária, o país precisa de mais cidadania e solidariedade, e os conselhos tutelares, de mais força e proatividade. “Eles precisam conversar com as redes. O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente deve fortalecer os conselhos. A sociedade civil, participar mais ativamente. Um sistema, para funcionar, precisa de engrenagens articuladas”, comparou.

O conselho tutelar é previsto no ECA – Lei n. 8.069/1990 – como órgão permanente e autônomo, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente. São cinco os conselheiros, escolhidos pela população por meio de eleição, com mandato de quatro anos.

Em um dos workshops, foi abordada a questão da adoção na primeira infância. A secretária nacional de Políticas para Família do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Ângela Vidal Gandra da Silva Martins, levantou alguns dos problemas que contribuem para a demora no processo de adoção e adiantou que a Secretaria deverá trabalhar em um projeto para reduzir o tempo de espera das crianças aptas a uma nova família. “A vida dessa criança está passando. Temos de nos concentrar nesse trabalho: ver o que está impedindo que essas crianças tenham um lar”, disse. Em outro workshop, foram debatidas as condições mínimas para permanência de crianças com pais dependentes de substâncias psicoativas.

Todos as sugestões e discussões levantadas em cada um dos grupos serão compiladas pelo Conselho Nacional de Justiça e deverão ser analisados pelos integrantes do Fórum Nacional de Infância e Juventude, para aprimoramento das ações.

Regina Bandeira
Agência CNJ de Notícias