O documento sistematiza as discussões nos 15 painéis e mesas temáticas do evento, que reuniu especialistas, representantes do poder público e da sociedade civil para trocar informações e experiências no tema. Artigos acadêmicos e práticas bem-sucedidas no campo das alternativas penais estão integralmente disponíveis nos anexos da publicação.
“Quando falamos em alternativas ao cárcere, é preciso oferecer à sociedade uma opção satisfatória do ponto de vista da responsabilização que tenha impacto positivo na sociedade e na segurança de todos. O relatório nos ajuda a amadurecer a discussão que ocorre em torno de uma nova onda no campo das alternativas penais, que inclui a sustentabilidade financeira e institucionalidade da política”, destaca Luís Lanfredi, coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF/CNJ).
Tanto a organização do Fonape quanto seu relatório são realizações do programa Fazendo Justiça, coordenado pelo CNJ em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), com apoio da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen).
Boas práticas e desafios
O relatório destaca que, apesar de avanços na racionalização da porta de entrada por meio das audiências de custódia, permanece a preocupação com o encarceramento em massa, com sobrerrepresentação da população negra (61,68%). A ex-perita do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, Deise Benedito, lembrou que “a política de drogas no Brasil é um reflexo da continuidade do racismo estrutural, que define quem será encarcerado e quem terá privilégios, perpetuando a lógica punitivista e escravista”.
A necessidade de criação de um Sistema Nacional de Alternativas Penais (Sinape), assim como da ampliação da aplicação de Acordos de Não Persecução Penal (ANPP) como uma abordagem eficaz para delitos de menor gravidade também aparecem na publicação.
Diálogo no Executivo
Na última semana, o CNJ contribuiu com a Conferência Nacional de Alternativas Penais, realizada pela Secretaria Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública (Senappen/MJSP). O evento discutiu as alternativas penais como forma de enfrentamento do estado de coisas inconstitucional nas prisões brasileiras, objeto de trabalho do plano Pena Justa, em fase de homologação no Supremo Tribunal Federal.
Diversos tópicos discutidos no evento tratam de políticas trabalhadas pelo CNJ e pelo Executivo com o apoio do Fazendo Justiça, a exemplo dos Comitês de Políticas Penais. “Diversas questões o Judiciário não tem como resolver sozinho. É preciso conversar com o Executivo para saber se há vagas para cumprir penas em regime aberto, abertura das instituições para receber os prestadores de serviço a comunidade ou a disponibilidade de tornozeleiras eletrônicas. É para facilitar essa interlocução que os Comitês de Política Penal existem”, disse o juiz coordenador do GMF do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), Antônio Faiçal.
Para o coordenador adjunto do Fazendo Justiça, Talles Souza, a necessidade da elaboração coletiva de planos estaduais do Pena Justa levará à criação de mais comitês, uma vez que eles devem coordenar o desenvolvimento e pactuação das metas estaduais”.
Tema de publicação lançada na abertura do evento, o Serviço de Atenção à Pessoa Custodiada também foi debatido. Atualmente em 26 unidades da federação, as APECs são unidades de atendimento às pessoas presas apresentadas na audiência de custódia. Para uma das consultoras da publicação, Ariane Gontijo, o serviço APEC tem muitas proximidades com o campo da saúde. A consultora Jamile Carvalho destacou a necessidade de sustentabilidade dos serviços por meio de termos de cooperação técnica, as estratégias de acolhimento dos familiares e o desafio de garantir o atendimento também aos finais de semana.
A sustentabilidade das alternativas penais como um todo foi lembrada pela Diretoria de Cidadania e Alternativas Penais da Senappen, Mayesse Parizi. Ela defendeu que os gestores de políticas de alternativas penais se apropriem do Fundo Nacional Penitenciário – de acordo com ela, entre 2016 e 2022 o Funpen realizou 2,2 bilhões em transferências, dos quais 4 milhões foram repassados para as alternativas penais, mas apenas 0,2% foram executados.
A ligação entre alternativas penais e políticas de drogas foi abordada pela diretora de prevenção e reinserção social da Secretaria Nacional de Drogas (Senad), Nara Araújo. Ela destacou ações que o MJSP vem realizando no campo da reinserção social de populações com vulnerabilidade acrescida e usuário de drogas, que contam com o apoio do CNJ por meio do Fazendo Justiça. O programa também está contribuindo com o Executivo em uma pesquisa nacional sobre grupos de responsabilização temáticos na Justiça Brasileira – o objetivo desses grupos é desconstruir naturalizações de violências de gênero.