“Não sou de ficar me lamentando e reclamando da vida. Sempre que vejo uma oportunidade, eu luto. E neste momento estou fazendo de tudo para continuar realizando o sonho da minha vida, que é ser técnica de enfermagem para mudar de vida e ajudar as pessoas através do cuidado”, conta Carla*.
Aos 34 anos, mãe solo de dois filhos e responsável por dois sobrinhos, Carla é um exemplo de resiliência e determinação. Ela foi vítima de violência doméstica por parte de seu ex-companheiro e encontrou apoio no Projeto Borboleta, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS). Por meio dele, concluiu o ensino médio no EJA (Educação para Jovens e Adultos) e atualmente realiza dois cursos: um técnico de enfermagem e outro de cuidador de idosos.
Criado em 2011, o Projeto Borboleta é uma iniciativa voltada para o combate à violência doméstica, desenvolvendo ações multidisciplinares nas Varas de Violência Doméstica de Porto Alegre, além de atividades para a prevenção à violência nas escolas e em instituições comunitárias.
De acordo com a idealizadora do projeto, a juíza do TJRS, Madgéli Frantz Machado, desde 2011, mais de dois mil homens foram encaminhados para grupos reflexivos – que debatem os ataques a mulheres -, com reincidência inferior a 5%. Desde 2016, oficinas e cursos profissionalizantes oferecidos em parceria com outras instituições beneficiaram mais de quatro mil mulheres e homens.
O projeto atua com o acolhimento individual das mulheres e homens envolvidos em situação de violência doméstica até atividades em grupo para mulheres, grupos reflexivos de gênero aos homens, encaminhamento para cursos técnicos e curso universitário (Direito) com bolsa integral, oficinas temáticas, arteterapia, além de atividades educativas e preventivas em estabelecimentos educacionais e instituições da comunidade (Maria na Escola e Maria na Comunidade).
“O próprio nome do projeto já nos remete ao processo de transformação. E essa é a contribuição do Borboleta: transformar a vida das pessoas. Mulheres e meninas acolhidas, fortalecidas, qualificadas para o trabalho, livres da violência, protagonistas das suas vidas. Homens com espaço de escuta, reflexão, responsabilização e reeducação. Livres da masculinidade tóxica”, afirma a juíza.
Justiça e Informação
O Projeto “Justiça e Informação: Violência contra Mulher, Não!”, liderado pelo juiz Silvio Valois Cruz Júnior, do Tribunal de Justiça do Piauí (TJPI), é outro exemplo de como ações educativas e de conscientização podem fazer a diferença na luta contra a violência doméstica.
Em atividade por cinco meses, em 2023, o projeto atingiu diretamente 399 pessoas através de ações educativas, rodas de conversa e a distribuição de folhetos informativos sobre os direitos das mulheres. No total, foram 10 eventos para conscientizar a população nas cidades que compõem a Comarca de Monsenhor Gil, distante cerca de 60 km da capital Teresina.
De acordo com o magistrado, o projeto permitiu que mulheres tivessem mais conhecimento sobre seus direitos, promovendo um diálogo aberto à importância da denúncia e aproximando o Judiciário da comunidade. “As rodas de conversa contaram com a participação de mais de 120 homens que demonstraram interesse pelo tema”, disse. Contudo, ele afirma que houve baixa participação daqueles com medidas protetivas em seu desfavor.
As ações foram realizadas em parceria com a Corregedoria Geral da Justiça e com a Coordenadoria da Mulher em situação de violência doméstica e familiar do TJPI, além de prefeituras.
Reconhecimento
O sucesso e o impacto positivo tanto do Projeto Borboleta (TJRS) quanto do Justiça e Informação: Violência contra Mulher, Não! (TJPI) não passaram despercebidos. Ambos foram reconhecidos nacionalmente, conquistando a categoria magistrados do prêmio CNJ Juíza Viviane do Amaral, nos anos de 2021 e 2023, respectivamente. Este reconhecimento ressalta a importância dessas iniciativas na luta contra a violência doméstica e no incentivo de uma sociedade mais justa e igualitária.
O prêmio é uma iniciativa do Conselho destinada a premiar e a dar visibilidade a ações de prevenção e enfrentamento à violência doméstica e familiar contra mulheres e meninas. Um dos objetivos é conscientizar os integrantes do Judiciário para a necessidade de permanente vigília para o enfrentamento desse tipo de violência.
Criada pela Resolução CNJ n. 377/2021, a premiação reverencia a memória da juíza do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Viviane Vieira do Amaral, vítima de feminícidio praticado, em dezembro de 2020, pelo ex-marido.
*Nome fictício utilizado no texto para não identificar a entrevistada
A Justiça por Todas Elas
Ao longo do mês de março, a Agência CNJ de Notícias publica uma série de reportagens sobre ações do Judiciário pela garantia do direitos das mulheres. Esses conteúdos compõem a campanha “A Justiça por Todas Elas”, idealizada pelo CNJ em alusão ao Dia Internacional da Mulher, em 8/3. Uma página dedicada à campanha e uma cartilha são algumas das iniciativas da ação que tem como foco idosas, crianças, trabalhadoras, mulheres privadas de liberdade, com deficiência, adolescentes, vítimas de tráfico, grávidas, mães e lactantes, indígenas e LGBTQIAPN+.
Texto: Maria Paula Meira
Supervisão: Beatriz Borges
Agência CNJ de Notícias