Por muitos anos, a União, representada em juízo pela Advocacia-Geral da União (AGU), ficou conhecida no meio Jurídico como uma instituição avessa a tentativas de conciliação, que busca sempre evitar o desfecho dos casos em que aparece no polo passivo. A postura geralmente adotada é a de que o pedido do autor não procede e, portanto, todos os recursos cabíveis devem ser utilizados, seja para levar o pedido à improcedência ou para retardar ao máximo a efetivação do direito reconhecido em juízo.
Um projeto desenvolvido pela Procuradoria-Geral da União, órgão subordinado à Advocacia-Geral da União (AGU), pretende reverter essa imagem. Vencedor do Prêmio Innovare na categoria Premiação Especial, o projeto Centrais de Negociação busca aplicar e difundir práticas conciliatórias para a resolução de processos judiciais em que um mesmo direito é pleiteado em diversas ações, sejam individuais ou coletivas. O objetivo é diminuir o estoque de processos, dando maior agilidade à satisfação do direito do cidadão autor do pedido.
O foco do projeto são processos movidos contra a União, referentes a matérias repetitivas, em que a jurisprudência é favorável ao particular e não à União. Os processos que são alvo da iniciativa tramitam geralmente na Justiça Federal e podem estar em qualquer fase processual.
“Não há sentido que a sociedade brasileira continue perecendo de um anacronismo processual que prestigie a forma ao conteúdo, que prefira o litígio à solução consensuada. E se há um ator que pode e deve contribuir para este aprimoramento é o Poder Público, tanto pela sua posição de supremacia em relação ao particular, quanto por sua responsabilidade pelo elevado volume de processos em tramitação”, afirma José Roberto da Cunha Peixoto, diretor do Departamento de Estudos Jurídicos e Contencioso Eleitoral da PGU e o principal responsável pelo projeto. Segundo estimativas da PGU, o número de processos geridos pelo órgão supera 1,5 milhão.
O marco inicial do projeto é a Portaria PGU no. 2, de 14 de dezembro de 2012, que cria as Centrais de Negociação. Antes disso, a publicação da Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União (Lei Complementar nº 73), em fevereiro de 1993, e da Lei 9.469, em julho de 1997, criaram as condições necessárias para a mudança de posicionamento da AGU. A primeira, ao incluir entre as atribuições do Advogado-Geral da União a possibilidade de “desistir, transigir, acordar e firmar compromisso nas ações de interesse da União” e, a segunda, ao estabelecer as premissas que devem nortear a realização de acordos ou transações em juízo pelo Advogado-Geral da União.
A implementação da prática tem início com a identificação dos temas passíveis de serem trabalhados por meio do programa. A escolha deve levar em conta o volume de ações em trâmite, os valores envolvidos e o impacto social da medida, além da prerrogativa de serem demandas repetitivas em que a jurisprudência seja desfavorável à União. A partir do levantamento dos temas, que conta com o auxílio das centrais regionais de negociação, é feito um parecer, que é encaminhado ao procurador-geral da União. O parecer apresenta as vantagens de se utilizar métodos alternativos de solução de conflitos para pôr fim aos processos selecionados.
Aprovado o parecer, é formatado um plano de ação, em que são definidos critérios e termos iniciais e finais de juros de correção monetária, eventuais compensações, momento processual em que a proposta pode ser oferecida e margem mínima de desconto a ser negociada, entre outras premissas para a ação. Fechado o plano, as unidades regionais convocam as partes para negociação, que pode ser feita por meio de mutirões. Caso seja fechado um acordo, o processo é submetido à homologação judicial e a parte recebe o crédito devido em até 60 dias. Feito o pagamento, o processo é extinto.
Segundo informações da AGU, apenas no ano passado cerca de 17 mil processos foram finalizados com acordos, resultando numa economia direta de R$ 20,7 milhões para a União e indireta de R$ 126 milhões. Com os acordos, estima-se que 272.592 intimações podem ter sido evitadas. Em 2014, o foco do programa foram os pedidos de gratificação por desempenho feitos por servidores públicos. Para 2016, um dos temas que estão sendo avaliados é o fornecimento de tratamentos terapêuticos e medicamentos.
Tatiane Freire
Agência CNJ de Notícias