Projeto de prevenção da violência doméstica em comunidades piauienses vence Prêmio do CNJ

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Foto: Divulgação CNJ.
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Em apenas três meses de funcionamento, o Projeto Justiça e Informação: violência contra a mulher, não! alcançou mais de 500 pessoas, dentre mulheres, homens, crianças e jovens, com informações sobre machismo, relacionamentos tóxicos e formas de se combater a violência contra a mulher. Os bate-papos com os moradores dos municípios piauienses de Miguel Leão, Monsenhor Gil e Curralinhos foram realizados pelo juiz Silvio Valois Cruz Junior do Tribunal de Justiça do Piauí (TJPI), vencedor do prêmio CNJ Juíza Viviane Vieira do Amaral, na modalidade Magistrados.

A 3ª edição do evento ocorreu no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), durante a 2ª Sessão Extraordinária de 2023 (26/09), e os encontros movimentaram as três cidades, que juntas, têm aproximadamente 16 mil habitantes.

O aumento dos crimes de gênero nos últimos anos no país vem sendo chamado pelo presidente do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso, de “epidemia”, e é uma das principais frentes de trabalho do órgão de aperfeiçoamento do Judiciário. De 2019 a 2022, o índice de feminicídios cresceu mais de 10% no Brasil. O Piauí não chega ao topo desse ranking, mas integra a lista dos 10 estados mais violentos, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). De acordo com a Secretaria de Segurança Pública do Piauí (SSP/PI), o número de feminicídios cresceu 44% no estado no primeiro trimestre desse ano, em relação ao mesmo período do ano passado.

Descrença na denúncia

Os números do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) também apontam que apenas uma em cada dez vítimas de feminicídio no estado tinha medida protetiva de urgência (MPU). A tragédia piora quando analisa especificamente a população negra: a cada 10 casos de feminicídio, seis vítimas são mulheres pretas. Em 2022, das 24 mulheres mortas no Piauí, somente três denunciaram a violência. Os dados reforçam o que o juiz Sílvio Valois Cruz Júnior, titular da comarca de Monsenhor Gil, destaca em relação ao combate à violência familiar: “o silêncio frente aos casos não apenas protege os agressores, como deixa as vítimas mais expostas a crimes ainda mais bárbaros”.

O magistrado contou, ainda, que a discrepância entre os casos de violência e a formulação da denúncia – que é o que vai permitir que o caso seja apurado, que medidas sejam tomadas e que o autor seja punido – foi um dos motivos que o levou a desenvolver o projeto. “Eu sabia que estavam acontecendo casos de violência doméstica na cidade, mas simplesmente eles não chegavam até o judiciário e não viravam processos. Isso me chamou a atenção. E, quando eu conversava com as mulheres, elas me diziam que denunciar o crime não iria mudar a situação delas e que não adiantaria nada”, conta o magistrado.

Ao estabelecer o contato direto com as pessoas da comunidade por meio do projeto, o magistrado percebeu o grau de deficiência das instituições de segurança em cidades do interior. Segundo Valois, jovens e mulheres que participaram do projeto, contaram ter buscado ajuda nas delegacias de polícia, mas não raro encontraram as delegacias fechadas.

“O atendimento, muitas vezes, é feito por homens que não estão capacitados nem atualizados nas temáticas de direitos humanos e de gênero, o que gera vergonha e desestímulo para as meninas denunciarem os crimes nesses espaços. Aqui, em Monsenhor Gil, estamos trabalhando para criar uma comarca acessível. Eu digo a todos que venham ao Fórum, que tragam as suas questões e que venham conversar. Aqui temos como orientá-las, contribuindo para melhorar e até mesmo salvar vidas”, diz Sílvio Valois Júnior.

A premiação e a ajuda no combate à violência

Instituído em 2021, o Prêmio CNJ Juíza Viviane do Amaral contempla projetos e ações que promovam a proteção de mulheres contra a violência doméstica e familiar. Ao reverenciar a memória da juíza Viviane Vieira do Amaral – assassinada pelo marido no dia de Natal, na frente de suas filhas, em 2020 – a premiação incentiva a prática de experiências no âmbito do Judiciário que contribuam para o enfrentamento da violência doméstica contra a mulher. Dessa forma, seis categorias são premiadas: tribunais, magistrados e magistradas, atores do sistema de Justiça Criminal, organizações não governamentais, mídia e produção acadêmica.

A iniciativa visa a combater o aumento significativo da violência contra a mulher, que se reflete em números no Judiciário brasileiro. Em 2022, a justiça recebeu 640.867 novos processos de violência doméstica e familiar e/ou feminicídio, que agora tramitam em varas exclusivas e não exclusivas, com 550.620 medidas protetivas de urgência concedidas. Só no ano passado, o número de feminicídios subiu 6,1% em relação a 2021, quando houve comprovação de 1.437 casos de mulheres assassinadas em situação doméstica.

Texto: Regina Bandeira
Edição: Carolina Sette
Agência CNJ de Notícias

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