A dor da mulher: Cármen Lúcia escuta as vítimas da violência doméstica

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Advogadas, artistas, fisioterapeutas, juízas, mães: a violência contra a mulher é uma dor que une milhares de brasileiras. Às vésperas do Dia Internacional da Mulher, a ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), se reuniu com cinco delas e ouviu relatos emocionados de quem já encarou a brutalidade que deixa marcas no corpo e na alma. “Eu quis ouvir a dor das mulheres que passaram por experiências traumáticas, que são compartilhadas por todas as mulheres do mundo”, afirmou a ministra. 

Sandra Batista foi uma das mulheres que atendeu ao convite da ministra. Em 2016, ela perdeu uma das filhas para a covardia. Aos 20 anos, a estudante Louise Ribeiro teve a vida interrompida por um colega da Universidade de Brasília, que a asfixiou e queimou parte do seu corpo porque ela não quis continuar um relacionamento amoroso.

“Hoje, eu revivi tudo o que aconteceu com a minha filha, mas a gente não pode fugir. Temos de unir a nossa dor, nossa força, nossas histórias. A vida continua e essa união mostra que não estamos sozinhas”, disse, emocionada. 

A fisioterapeuta Cristina Lopes concorda com Sandra. Há três décadas, ele teve 85% do corpo queimado após seu então marido, movido por um ciúme doentio, atear fogo nela. “Estou realmente muito surpresa com a sensibilidade da ministra Cármen Lúcia. Só mesmo uma mulher para propor uma coisa tão real e, ao mesmo tempo, tão doída.” 

O agressor de Cristina foi condenado a 13 anos e 10 meses de prisão. A punição é referência no combate à violência doméstica no Brasil.  “A Lei Maria da Penha foi um marco na história brasileira, pois um crime que não é punido é permitido.” Cristina, hoje com 52 anos, se formou em fisioterapia, tem especialização no tratamento de queimados, e é vereadora em Goiânia.

O ódio de um ex-companheiro também motivou a agressão sofrida pela advogada Letícia Pereira, 30 anos, outra convidada do encontro. Moradora de Juiz de Fora/MG, em fevereiro de 2015, ela foi espancada a pauladas, por — supostamente — ter traído o homem com quem namorou por dois anos. “Ainda sou refém do medo, mas acho importante essa postura de humanização do Poder Judiciário. Tivemos uma reunião muito emocionante com Cármen Lúcia”, disse Letícia.

 files/conteudo/imagem/2018/03/4b00c3d68345f58873f22e21f6091764.JPGDa direita para esquerda,  Letícia, Sandra, Cristina, Cármen Lúcia, Tatiane e Mariene. FOTO: Gil Ferreira/Agência CNJ, 

O caso de Letícia foi o primeiro em Minas Gerais a ser enquadrado na Lei Maria da Penha e a ir a júri popular. O agressor da advogada foi condenado a 10 anos e oito meses de prisão por tentativa de feminicídio duplamente qualificado – motivo torpe e sofrimento desnecessário à vítima. Letícia teve afundamento de crânio, fraturas no braço direito e na mão esquerda. Ela ficou 14 dias internada e, desde então, precisou fazer sete cirurgias.

“Ainda vivo com medo e iniciativas como essa ajudam a amenizar esse sentimento”, explica Letícia. Até hoje, como consequência do espancamento, a advogada tem fortes dores de cabeça, vive com acompanhamento psicológico e psiquiátrico e se submete a tratamento para recuperar o movimento das mãos e dos braços.

Fortalecimento

A juíza Tatiane Moreira de Lima, que atua justamente em uma vara de violência doméstica em São Paulo, se viu vítima de um drama em 2016. Um homem, que era parte em processo sob responsabilidade da magistrada, invadiu o gabinete dela e ameaçou incendiá-la e matá-la. O trauma causado pelo episódio acabou superado. Ela passou a difundir um programa de recuperação de homens que agridem mulheres e fazer palestras sobre o assunto.  

O agressor foi condenado a 20 anos de prisão por tentativa de homicídio e cárcere provado. Para Tatiane, a vivência faz parte do passado. “Esse encontro promovido pela ministra promoveu o fortalecimento de todas as mulheres, para que elas não se calem e consigam superar a violência. Juntas, percebemos que somos muito mais fortes”, afirmou a juíza. 

Um desentendimento entre a cantora e atriz Mariene de Castro, 39 anos, e seu então companheiro acabou em violência doméstica, em 2012. A baiana, que tem um filho com seu agressor, prestou queixa por lesão corporal e ameaça e ainda aguarda o fim do processo que tramita na Justiça.

Entusiasta da Lei Maria da Penha, ela pede mais mobilização das pessoas, homens e mulheres. “Nessa semana dedicada à mulher, um encontro como esse só pode repercutir positivamente. Acho que foi uma grande oportunidade para mulheres falarem de suas dores e de suas histórias, com muita verdade, muita entrega e muita sinceridade. Clamamos por um país sem violência, de homens mais generosos, de pessoas mais humanas”, lembrou Mariene. 

Estado-Juiz

Para a ministra Cármen Lúcia, ouvir o relato dessas mulheres é uma oportunidade de dar voz a quem teve a vida marcada pela violência. “O Estado, que assumiu a responsabilidade de fazer a justiça no sentido humano, no plano do Estado-Juiz, tem que dar espaço para que essas pessoas falem, para que possamos dar a oportunidade da sociedade contribuir com as mudanças e também mudar a estrutura estatal que garanta que haja punição. Eu quis me reunir com pessoas que têm o que falar e querem ser ouvidas”, disse a presidente do STF e do CNJ.

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Letícia Pereira

Moradora de Juiz de Fora (MG), a advogada Letícia Pereira foi agredida a pauladas, em fevereiro de 2015, pelo ex-companheiro. O caso foi o primeiro no estado de Minas Gerais a ser enquadrado na Lei Maria da Penha e a ir a júri popular. Em agosto de 2016, Quéssio Claudomir da Silva foi condenado a 10 anos e oito meses de prisão por tentativa de feminicídio duplamente qualificado – motivo torpe e sofrimento desnecessário à vítima. 

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Cristina Lopes

Hoje fisioterapeuta e vereadora em Goiânia, aos 20 anos, Cristina Lopes Afonso foi vítima da fúria do então marido. Em 1986, o ex-companheiro, movido por ciúmes, jogou álcool no seu corpo e ateou fogo. Ela teve 85% do corpo queimado. O agressor recebeu condenação de 13 anos e 10 meses de prisão. A punição é, até hoje, referência no combate à violência doméstica no Brasil. Cristina se formou em fisioterapia e tem especialização no tratamento de queimados. 

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Tatiane Moreira de Lima

Titular da Vara de Violência Doméstica do Fórum do Butantã, em São Paulo, Tatiane Moreira de Lima é juíza há 11 anos. Em 2016, ela viveu um drama quando um homem invadiu seu gabinete e ameaçou incendiá-la e matá-la. O agressor respondia a processo na vara sob comando da magistrada por ter agredido a ex-mulher. Ele foi condenado a 20 anos de prisão por tentativa de assassinato e cárcere privado. No ano passado, Tatiane criou uma campanha contra o assédio sexual nos ônibus, trens e metrôs na capital paulista. 

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Mariene de Castro

Cantora e atriz baiana, Mariene de Castro foi vítima de violência doméstica e, em 2012, prestou queixa por lesão corporal e ameaça contra o ex-companheiro com quem teve uma filha. Um ano depois, a assessoria da artista se manifestou sobre caso, destacando que Mariene reforçou sua crença na Justiça, especialmente na eficácia da Lei Maria da Penha na defesa de mulheres vítimas de violência doméstica. 

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Sandra Batista

Em março de 2016, Sandra Batista, mãe da então estudante de biologia da Universidade de Brasília Louise Ribeiro sofreu um duro golpe. A filha de 20 anos foi brutalmente assassinada por um colega de faculdade que premeditou o crime. Aluna brilhante, a jovem foi asfixiada e teve o corpo parcialmente queimado. No ano passado, o agressor acabou condenado a 23 anos de prisão por homicídio quadruplamente qualificado: motivo torpe, meio cruel, recurso que dificultou a defesa da vítima e feminicídio. 

 

 

Thaís Cieglinski

Agência CNJ de Notícias