A relação afetiva que mãe e bebê estabelecem entre o oitavo e o décimo oitavo mês de vida da criança a influenciará para o resto da vida. Segundo o médico e ministro da Cidadania, Osmar Terra, é nessa fase da vida que se dá o desenvolvimento emocional dos seres humanos. Os sentimentos que o bebê desenvolver nessa época afetarão a forma como ele vai se comportar em relação às demais pessoas que encontrar na juventude, vida adulta e velhice. Mestre em neurociência pela Universidade de Brasília (UnB), Terra foi o convidado do painel que abriu o Seminário sobre o Pacto Nacional pela Primeira Infância – Região Centro-Oeste, organizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília, nesta terça-feira (25/6).
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O objetivo do evento é discutir com especialistas, agentes públicos e representantes da sociedade civil formas de garantir os direitos das crianças com até 6 anos de idade, faixa etária da chamada primeira infância. Embora o tema seja objeto do artigo 227 da Constituição Federal, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e do Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.257/2016), cerca de 6 milhões de brasileiros nessa faixa etária ainda vivem em condição de vulnerabilidade social, conforme alertou o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, na abertura do seminário.
“É na primeira infância, período que vai do nascimento até os primeiros 6 anos, que se formam as raízes da personalidade, as bases e experiências que irão sustentar toda a estrutura emocional e psíquica do ser humano’, afirmou Dias Toffoli. Em vulnerabilidade social, faltam à infância direitos, como à segurança e a proteção do abandono.
Segundo o ministro da Cidadania, Osmar Terra, ao tomar como referência o adulto com quem mais se relaciona – a mãe ou a cuidadora, em alguns casos –, ela passa a considerá-lo uma base segura, com que contará em caso de socorro. A experiência sensorial com essa pessoa vai moldar a maneira de se relacionar com os demais ao longo da vida. “Ele organiza, em torno dessa experiência, suas redes emocionais, a partir da voz, da expressão do rosto da mãe. A criança duplica a frequência cardíaca quando a mãe faz cara de zangada. Se o rosto dela está alegre, não. É assim que ele vai entender o lugar do outro, o sentir do outro. A partir do décimo oitavo mês, esse potencial interpretativo diminui”, afirmou.
Osmar Terra advoga a teoria do apego, do psiquiatra e psicanalista britânico, John Bowlby, que constatou em seus estudos com indivíduos de várias espécies que os jovens acompanham os adultos, como estratégia de sobrevivência – e a correspondência no comportamento humano. “Até oitavo mês, o bebê vai no colo de qualquer um. Depois, começa a estranhar o colo de quem não conhece”.
Uma primeira infância com estímulos agressivos para a criança – com negligência, abandono ou abuso – pode aumentar os níveis do hormônio cortisol, causar o chamado “estresse tóxico”, destruir neurônios e causar lesões cerebrais, segundo Osmar Terra. O pesquisador canadense Richard Tremblay investiga as repetições dos padrões agressivos do comportamento na vida adulta. “Ele encontrou níveis altos na frequência de agressões físicas em crianças entre 1 e 3 anos e aos 15 anos. Quanto mais altos os eventos de agressividade na primeira infância, mais intensos eles se repetiam na adolescência e início da vida adulta”, afirmou.
Segundo o conselheiro do CNJ que presidente do Fórum Nacional de Fórum Nacional da Infância e da Juventude (Foninj), Luciano Frota, cabe ao Estado interferir nesse padrão de abandono e interromper a repetição do ciclo da pobreza com políticas públicas para esse segmento populacional. “Se o Estado não comparece com políticas públicas, não é com bala ou com prisão que vamos resolver. Precisamos é de acolhimento. É isso que precisa ser feito para se construir uma sociedade mais justa e mais fraterna. Não tem outro caminho a não ser investir na primeira infância e na juventude”, disse Frota.