Relatório apresentado no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas nesta terça-feira (8/3) pelo relator especial contra a tortura, Juan Méndez, defendeu a redução da população carcerária brasileira e classificou as audiências de custódia como “uma das mais importantes iniciativas em políticas públicas para combater problemas em prisões arbitrárias e tortura”. O documento é resultado de visita oficial de 12 dias realizada ao país em agosto de 2015 a convite do governo brasileiro.
As audiências de custódia foram desenvolvidas pela atual gestão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com os poderes públicos das 27 unidades da federação e, em pouco mais de um ano, evitaram mais de 15 mil prisões desnecessárias, reduzindo a população de presos provisórios. A metodologia consiste na apresentação do preso em flagrante a um juiz no prazo de 24 horas, dando mais elementos para que o magistrado avalie a legalidade e necessidade da prisão até o julgamento definitivo do caso, além de registrar possíveis alegações de tortura e maus tratos.
“O relator encoraja a expansão das audiências de custódia e conclama as cortes a considerarem o redesenho de processos com o propósito de eliminar barreiras que atualmente impedem os detentos provisórios de fazerem reclamações e que obstruem o acesso a documentos sobre maus tratos, assim como a capacidade do Estado de monitorar sua prevalência precisa”, afirmou Mendez em trecho do documento dedicado às audiências de custódia.
O relator da ONU ainda elogiou e encorajou a adoção de soluções alternativas ao encarceramento pelo governo brasileiro, como o uso de tornozeleiras eletrônicas, e apontou o êxito do projeto do CNJ citando números colhidos durante a visita. “Estatísticas mostram que as audiências de custódia, onde aplicadas, resultaram na liberação, entre 24 e 48 horas, de 43% dos detidos, em oposição aos 10% observados anteriormente”, relata.
Durante a visita ao país, Méndez participou de reunião com o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, na qual foi apresentado às iniciativas do Judiciário brasileiro relativas ao sistema carcerário. “Ao invés de construirmos novas prisões, estamos tentando evitar que pessoas que não devem ir para as prisões sejam colocadas nos presídios”, disse o ministro na ocasião. Desde a visita, as audiências de custódia foram expandidas para todo o país e tiveram sua legalidade confirmada pelo STF, com posterior regulamentação pelo CNJ.
A necessidade de reduzir a população carcerária do país, em oposição à abertura de novas vagas, também é tema abordado no documento apresentado hoje em Genebra. A demanda vai ao encontro do projeto Cidadania nos Presídios, que propõe o fim da superpopulação carcerária a partir da revisão de práticas processuais relativas a benefícios como comutação, indulto e livramento condicional. Hoje, mais de 700 mil pessoas estão presas no Brasil e a taxa de encarceramento, de 193 a cada 100 mil habitantes, continua crescendo.
Outros pontos tratados pelo relator da ONU são a revisão da Lei de Drogas para afastar o encarceramento em casos de menor poder ofensivo, a questão do racismo nas prisões, a abolição das revistas vexatórias, as ressalvas sobre as prisões privatizadas, a frequência da violência policial e a contrariedade a projetos que reduzem a maioridade penal e ao tratamento dado a adolescentes no sistema socioeducativo.
Deborah Zampier
Agência CNJ de Notícias