Oficina foca na importância do ouvir para solucionar conflitos fundiários na Justiça

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I Oficina de Soluções Fundiárias do CJ. Foto: Luiz Silveira/Ag. CNJ
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A empatia, o exercício da compreensão e da paciência, fundamentais na construção de soluções para disputas pela terra, estão no foco de evento que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) iniciou nesta quinta-feira (27/6) e realiza até a sexta-feira (28/6). Representantes de tribunais de todo o País lotaram o auditório do CNJ, em Brasília, para a abertura da 1ª Oficina de Soluções Fundiárias. O evento reúne experiências no tratamento de ações que envolvam despejos ou reintegrações de posse, em imóveis de moradia coletiva ou de área produtiva, em imóveis urbanos ou rurais.

O presidente do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso, em vídeo, abriu a I Oficina de Solução de Conflitos. FOTO: Luiz Silveira/Ag. CNJ

A expertise do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), que conta com Comissão de Soluções Fundiárias (CSF) desde 2019, foi tema do painel de abertura da oficina. O sucesso dessa forma de lidar com os conflitos fundiários subsidiou o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 828 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em junho de 2021.

A decisão suspendeu temporariamente as ordens de remoção e despejos de áreas coletivas habitadas ocupadas antes da pandemia e perdurou até outubro de 2020. “O projeto piloto do Paraná despertou o interesse em Harvard e inspirou a decisão na ADPF”, disse, por meio de vídeo, na abertura da oficina, o presidente do STF e do CNJ, Luís Roberto Barroso, que atuou como relator do caso.

A abertura do evento contou com a presença do conselheiro José Rotondano, que coordena o Comitê Executivo Nacional de Soluções Fundiárias do CNJ, e do conselheiro do CNJ João Paulo Schoucair. O órgão publicou, em 2023, a Resolução n. 510/2023, para regulamentar a criação das comissões de soluções fundiárias pelas instituições do Poder Judiciário e instituir diretrizes para a realização de visitas técnicas a áreas objeto de litígio possessório.

Famílias impactadas

O painel sobre a experiência da Comissão de Soluções Fundiárias do TJPR foi apresentada pelo des. Fernando Prazeres (esq.) e por Patrícia Elache Canela (dir). Ao centro, está a juíza auxiliar da Presidência do CNJ Fabiane Pieruccini Foto: Luiz Silveira/Ag. CNJ

O presidente do CSF do TJPR, desembargador Fernando Prazeres, e a secretária da comissão, Patrícia Elache Canela, expuseram o método de trabalho que adotam e resultou, nos último cinco anos, na participação em 95 mediações, das quais 34 já apresentam resultados positivos. Esse trabalho impactou a vida de mais de 23 mil famílias, ocupantes de áreas sob litígio que receberam 253 visitas técnicas para orientar a busca de soluções por meio de ações de mediação.

No Paraná, o trabalho evidencia a importância das visitas técnicas aos locais de ocupação. “Elas são o coração da nossa comissão”, diz a secretária da CSF do TJPR. Para o método de trabalho funcionar, os participantes recebem um protocolo com explicações a respeito do propósito dessas ações e que esclarece quanto a comportamentos. Há recomendações quanto à restrição a fotos e ao uso de sapatos confortáveis, adequados para caminhadas longas e para o piso de terra. “Com a nossa atuação, aprendemos, por exemplo, que o uso das palavras invasor e invasão é pejorativo”, lembra Patrícia.

O modo inadequado na condução de questões relacionadas a conflitos fundiários pode culminar em violência e na remoção de famílias sem a adequada destinação, como o próprio tribunal estadual paraense verificou em três desocupações feitas entre 2017 e 2019. “Não havia preocupação em como a decisão judicial seria cumprida, nem com as suas consequências”, conta o desembargador Prazeres, que pôde testemunhar reintegrações de posse. “Fiquei me questionando sobre como deve ser o cumprimento das ordens, se deveríamos nos preocupar com as consequências socioeconômicas das nossas decisões e cheguei à conclusão que precisava conhecer as áreas de conflito e as pessoas envolvidas.”

Contexto

A percepção da complexidade das situações despertou para a importância do contexto dos envolvidos nos conflitos. “Ficamos convencidos da necessidade de conhecer o local e as pessoas, de saber por que elas aceitaram se submeter a condições de tão extrema vulnerabilidade”, explica Prazeres. “Com a aplicação de técnicas adequadas de mediação e a participação de agentes externos, as soluções vieram de maneira natural e positiva”, explica o desembargador. “Conseguimos dar um pouco mais de dignidade depois que identificamos necessidades básicas, a escuta coletiva está no âmago do processo, a capacidade de ouvir, de demostrar empatia.”

A 1ª Oficina de Soluções Fundiárias seguirá até final da tarde de sexta-feira (27/6). A programação prevê mais sete painéis, além da apresentação feita pelas pesquisadoras e o aluno da Universidade de Harvard, dos Estados Unidos, na tarde desta quinta. Duas professoras e um aluno participaram presencialmente da Oficina e apresentaram os resultados da pesquisa de campo realizada desde outubro de 2023, quando visitaram o Paraná a fim de conhecer a experiência do tribunal na mediação de conflitos fundiários.

Texto: Luís Cláudio Cicci
Edição: Sarah Barros
Agência CNJ de Notícias