O Estado de S. Paulo: “CNJ anula um absurdo”

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O jornal O Estado de S. Paulo publicou nesta segunda-feira (11/09) editorial sobre a atuação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O material faz menção à decisão do Conselho com relação à promoção de magistrados na Paraíba. Leia abaixo a íntegra do editorial:

"Na última reunião do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) teve-se mais uma comprovação da falta que fazia um órgão encarregado de promover o controle externo da magistratura e moralizar os usos e costumes de alguns braços e instâncias do Poder Judiciário. Entre as questões discutidas e votadas pelos conselheiros, a mais polêmica foi novamente a do nepotismo no Judiciário.

Tratou-se de um recurso impetrado pela Associação dos Magistrados da Paraíba (AMPB) pedindo a anulação das sessões do Tribunal de Justiça (TJ) daquele Estado que, no segundo semestre de 2005, decidiram as promoções, por merecimento, de três juízes, um para ser titular da 5ª Vara de Família e dois para atuarem no Juizado Especial Civil de Campina Grande. Segundo a AMPB, em vez de justificar sua decisão com critérios objetivos, como manda a Resolução nº 6 do CNJ, os desembargadores paraibanos recorreram a argumentos absurdos.

O caso não apenas expõe os métodos de escolha que vários juízes de segunda instância utilizaram durante décadas para favorecer filhos, compadres, amigos, mulheres de amigos e fiéis da mesma religião, mas também mostra como a moralização da Justiça continua sendo um grande desafio, uma vez que muitos magistrados continuam se recusando a acatar a legislação que têm de seguir e aplicar. E é esse o caso da Resolução nº 6 do CNJ, que foi baixada em 2005 com o objetivo de pôr fim ao nepotismo nas promoções de juízes, obrigando os TJs a substituir as votações secretas por votações abertas e a adotar parâmetros objetivos, para evitar o prevalecimento de critérios políticos e corporativos.

Na primeira sessão realizada pelo TJ da Paraíba para preencher os três cargos em Campina Grande, os desembargadores insistiram na votação secreta, desafiando a Resolução nº 6 do CNJ.  Mais tarde, o TJ foi obrigado pelo CNJ a cancelar essa sessão e, na que foi realizada em seguida, esta com votação aberta, os candidatos escolhidos foram os mesmos indicados na sessão anterior, sendo um deles filho do presidente da corte.

O mais espantoso foram os argumentos apresentados para fundamentar o "merecimento" dos três nomes indicados. Um dos desembargadores afirmou que um dos três nomes por ele escolhido havia ingressado nos quadros da Justiça paraibana no mesmo dia em que a corte comprara uma imagem de Nossa Senhora. Outro justificou sua decisão pelo fato de uma juíza, sua escolhida, ser casada com um grande amigo seu. Um terceiro desembargador justificou o nome de sua preferência alegando que, durante determinada solenidade na Justiça local, ele demonstrara humildade ao se levantar da cadeira em que estava para que um casal nela sentasse. Um quarto desembargador votou numa juíza sob a alegação de que, no passado, ela recebera um elogio do ministro Hamilton Carvalhido, do Superior Tribunal de Justiça. E houve até mesmo quem fez questão de explicitar o critério do compadrio: "Confesso abertamente, senhor presidente, que voto nele porque é seu filho."

Tão ou mais estapafúrdia foi a conduta do presidente do TJ da Paraíba. Em vez de se declarar impedido de participar da sessão, ele não apenas compareceu a ela, como ainda votou no filho que, evidentemente, acabou sendo um dos três nomes escolhidos. E, ao justificar o desrespeito ao princípio constitucional da moralidade e aos critérios de objetividade exigidos pela Resolução nº 6, esse mesmo dirigente afirmou que, "se existe excesso ou omissão de um ou outro desembargador no momento do voto, tal fato não ensejaria prejuízo no resultado final, considerados os votos mínimos necessários para a composição da lista".

Os integrantes do CNJ, obviamente, não aceitaram esses argumentos e deram ao TJ da Paraíba o prazo de 15 dias para apresentar uma nova lista de promoções. "O excesso ou omissão não foram de um ou outro desembargador, mas sim da maioria absoluta dos mesmos", disse um dos conselheiros, após afirmar que o modo como o TJ da Paraíba agiu nesse lamentável episódio configura um "verdadeiro simulacro de cumprimento da norma constitucional e da Resolução nº 6".

Agora se compreende por que vários dirigentes de cortes estaduais e federais tanto se opuseram à aprovação do controle externo".