O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançou, nesta terça-feira (14/1), o Painel de Inspeções no Socioeducativo, que apresenta dados nacionais em formato inédito sobre o sistema que recebe adolescentes e jovens a quem se atribui a prática de ato infracional. O painel, que inicialmente divulgará informações do meio fechado, será alimentado por meio de inspeções judiciais realizadas periodicamente e permitirá mais transparência e modernização na análise de dados, que já foram cobrados do Brasil por instâncias internacionais.
Os dados mais recentes, referentes às inspeções judiciais realizadas entre setembro e outubro de 2024, apontam que a taxa de ocupação das 427 unidades inspecionadas está em 57,57%, com uma população total de 11.016 adolescentes, sendo que 95,5% dos adolescentes são do gênero masculino, e a maioria tem 17 anos (34%). Em relação à raça/cor, 55,4% se identificam como pardos, 18,8% como pretos, 25,1% como brancos.
Entre as novidades do painel, está a possibilidade de acessar: dados desagregados por estado; número de adolescentes por tipo de medida com recortes por gênero e raça; e informações como número de óbitos, suicídios nas unidades e processos abertos sobre tortura. Também foram incluídos dados sobre adolescentes gestantes, lactantes, população LGBTQIAPN+, pessoas com deficiência e com transtornos mentais, dados sobre o quadro de pessoal, além do acompanhamento detalhado das inspeções realizadas.
“Nos últimos anos, as informações sobre o sistema socioeducativo eram atualizadas com pouca regularidade, o que inibia o uso de dados no aprimoramento de políticas públicas e pesquisas. De forma inédita no país, teremos uma fonte de informação atualizada a partir de inspeções judiciais, dando cumprimento à recomendação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)”, destaca o juiz coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), Luís Lanfredi.
A Recomendação n. 44 da CIDH, de 2021, orienta o Brasil a estabelecer indicadores sobre Justiça Juvenil, garantindo dados atualizados e acessíveis, com desagregações que abordem questões interseccionais e tipos de medidas aplicadas. Em 2020, relatório global das Nações Unidas destacou a ausência de envio de dados, inclusive do Brasil, sobre adolescentes privados de liberdade. A falta de informações estruturadas levou à recomendação de que os Estados estabeleçam sistemas nacionais de coleta de dados, com informações desagregadas por idade, gênero e nacionalidade. A coleta regular de dados é apontada como essencial para monitorar a situação e garantir os direitos dessas populações.
Para o juiz auxiliar da Presidência do CNJ Edinaldo César Santos, o lançamento do painel para o meio fechado garante que o Brasil avance no cumprimento dessas demandas. “A expectativa é que o acesso progressivo às informações também beneficie a sociedade, promovendo maior controle social e reforçando o compromisso do país com os direitos de adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas”.
As ações do CNJ para qualificar o sistema socioeducativo integram o programa Fazendo Justiça, parceria em andamento com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento para transformações necessárias no campo socioeducativo e no campo penal.
Avanços
O painel tornou-se possível a partir de duas ações do CNJ em 2022. A primeira foi a criação de uma metodologia de inspeções no sistema socioeducativo a partir de parâmetros e diretrizes nacionais e internacionais. Esses parâmetros partem de normativas que orientam a execução de medidas socioeducativas, a exemplo dos eixos do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase).
“Antes havia um formulário de inspeção que olhava apenas para a quantidade de adolescentes dentro da unidade, sem separar adequadamente o tipo de medida e o tipo de unidade, com poucas perguntas e que não se relacionavam ao Sinase. Outra novidade é que os parâmetros foram separados pelo tipo de medida — a semiliberdade é completamente diferente da internação e as mesmas poucas perguntas eram feitas para ambas”, explica a coordenadora do Socioeducativo do Fazendo Justiça, Fernanda Givisiez.
Para permitir que juízas e juízes fizessem o registro do que foi encontrado nas inspeções, o CNJ também lançou, em 2022, o Cadastro Nacional de Inspeções em Unidades e Programas Socioeducativos (CNIUPS). A ferramenta substituiu o CNIUS para modernizar e padronizar o processo de monitoramento das unidades socioeducativas de meio fechado e dos programas e serviços de medidas socioeducativas em meio aberto, que incluem liberdade assistida e prestação de serviço à comunidade.
Desenvolvido em colaboração com magistradas e magistrados de diversas regiões do Brasil, o CNIUPS viabiliza que cada etapa da inspeção seja registrada de maneira on-line durante a visita, com o uso de celulares ou tablets e seguindo um roteiro padronizado de perguntas. O painel lançado hoje traz o compilado dos dados coletados no meio fechado, permitindo a elaboração de uma série histórica — há expectativa de lançamento do painel do meio aberto em oportunidade futura.
Texto: Renata Assumpção
Edição: Débora Zampier
Agência CNJ de Notícias
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