Valorização do tempo de lotação e residência na comarca para fins de promoção por merecimento, prioridade em ações de formação, ampliação do quadro de pessoal e da presença de policiais judiciários, assim como prioridade na melhoria das instalações físicas. Esses são alguns dos incentivos que terão de ser adotados por tribunais e conselhos da Justiça para promover a lotação e a permanência de juízes e juízas em comarcas de difícil provimento.
A medida, aprovada por unanimidade na 6ª Sessão Virtual de 2024 do Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), encerrada na última sexta-feira (26/4), institui a “Política de Estímulo à Lotação e à Permanência de Magistrados (as) em Comarcas definidas como de difícil provimento”.
De acordo com o relator do Ato Normativo 0000927-53.2024.2.00.0000, conselheiro Giovanni Olsson, a política atende aos propósitos da atenção prioritária do primeiro grau de jurisdição, instituída pela Resolução CNJ n. 194/2014. A norma é considerada estratégica, uma vez que mais de 90% dos processos tramitam no primeiro grau de jurisdição, segundo dados do Relatório Justiça em Números 2023 (ano-base 2022).
O voto destaca que as dificuldades para a manutenção de magistrados nessas localidades foram apontadas até mesmo pelo Observatório Nacional de Causas de Grande Repercussão do CNJ/CNMP. O relatório do colegiado em 2023 chamou a atenção para a alta rotatividade de magistrados e membros do Ministério Público, o que “contribui para a morosidade do desfecho dos processos judiciais em casos de grande repercussão”.
Essa situação, conforme apontado pelo Observatório, se agrava em zonas de fronteira e cidades com pouca estrutura urbana – como saúde, educação e segurança – além de comarcas muito distantes da sede do Tribunal. Destaca o relator que, “em alguns casos, há titulares, mas não substitutos; em outros, há substitutos, mas não titulares; e ainda há casos em que simplesmente não há ninguém lotado e residindo lá”. A tramitação das demandas acompanhadas pelo grupo, pelo menos, confirma “a necessidade e a urgência de ações específicas para o enfrentamento da insuficiente qualidade da prestação jurisdicional nas comarcas interiorizadas”.
Para atender a essas questões, o relator destacou a importância da adoção de ações afirmativas, financeiras e não-financeiras, para estimular a lotação e a permanência dos juízes e juízas, com a devida valorização na proporção do tempo de continuidade no local, especialmente em relação às carreiras estagnadas e com baixa mobilidade vertical e horizontal.
Dessa forma, a nova resolução considera que essas medidas sejam estabelecidas para municípios que tenham população inferior a 30 mil habitantes; para unidades em zona de fronteira, isso é, até 150 quilômetros em linha reta de qualquer fronteira internacional; para as que estejam situadas a mais de 400 quilômetros de distância pela via rodoviária mais curta da sede do respectivo tribunal; e aquelas que possuam significativa rotatividade de magistrados e magistradas titulares ou substitutos. Nesse último caso, também devem ser consideradas questões sobre competência de matéria de alta complexidade ou demandas de grande repercussão, ou que exponha a grave risco de segurança e, portanto, podem envolver excepcionalmente Unidades em Municípios próximos da sede ou mesmo na sede do Tribunal, e a seu critério justificado, dentro de um percentual bem limitado de Unidades.
O relator afirma que, em qualquer uma dessas situações, é requisito essencial e inegociável que o juiz só será alcançado por essa política e seus incentivos se ele “estiver lotado e efetivamente residir naquela Comarca, havendo sua cessação em qualquer hipótese de autorização para residir fora da Comarca ou para teletrabalho”.
A norma diz ainda que CJF, CSJT e tribunais tem autonomia na implementação das medidas, e deverão considerar as peculiaridades de cada ramo de Justiça e as características socioeconômicas regionais, mas devem observar os limites mínimos fixados na Resolução aprovada em relação aos incentivos financeiros e não-financeiros. Devem ser contempladas obrigatoriamente, no mínimo, a valorização do tempo de lotação e residência na sede da comarca para fins de remoção e promoção ou acesso por merecimento, além da concessão de licença compensatória proporcional ao tempo de lotação e de residência na sede da comarca.
Também devem ter prioridade para participação em ações de formação presenciais ou telepresenciais e para licença de capacitação, proporcional ao tempo de lotação e residência nessas comarcas; para designação de magistrado substituto, presencialmente ou por teletrabalho, além da prioridade para a distribuição e redistribuição eletrônica de processos, preferencialmente no âmbito do Programa Justiça 4.0 e do Juízo 100% Digital, entre outros, se essas Unidades, além de distantes, tenham carga de trabalho acima da média das outras Unidades de mesma competência.
Carga de trabalho
O Plenário Virtual também aprovou por unanimidade a proposta de recomendação para instituir mecanismos que assegurem a equivalência de carga de trabalho para magistrados e magistradas do primeiro grau de jurisdição em termos quantitativos e qualitativos.
Também de relatoria do conselheiro Giovanni Olsson, o Ato Normativo 0001333-74.2024.2.00.0000 recomenda que CJF, CSJT e tribunais instituam mecanismos que assegurem o equilíbrio da carga de trabalho, considerando especialmente as especificidades das competências materiais e de classes e assuntos processuais.
De acordo com o texto aprovado, as medidas adotadas devem garantir tempo equivalente de duração do processo para o público e a proteção integral da saúde dos juízes e juízas das unidades de primeiro grau. O objetivo, segundo o normativo, é coibir a “desproporcional sobrecarga excessiva em algumas em comparação com as demais” unidades.
A recomendação é que sejam utilizados mecanismos como a distribuição ou redistribuição livre e proporcional de processos novos e/ou antigos a outras unidades judiciarias do respectivo tribunal com movimento processual abaixo da média, ou a criação de unidades ou juízos virtuais de competência ampliada, ou Núcleos de Justiça 4.0 ou na transformação de unidades físicas já existentes, mas que possuam baixo volume processual.
De acordo com o texto, a apuração da equivalência da carga de trabalho considera o quantitativo de casos novos, a cada mês; e o quantitativo de casos novos ponderado pelo grau de complexidade, a ser atribuído a cada classe e/ou assunto processual. O relator acrescentou que, em verdade, vários tribunais já adotam individualmente iniciativas similares, com muito êxito, mas deve haver uma política nacional ampla de estabelecer parâmetros para corrigir a sobrecarga excessiva e desproporcional nas cargas de trabalho, particularmente no contexto de processos eletrônicos e atuação telepresencial das partes e advogados: “o excesso de trabalho no Judiciário é a regra, mas hoje não há qualquer razão administrativa ou tecnológica que justifique que alguns Magistrados permaneçam sendo ainda mais sobrecarregados que os demais dentro da mesma competência, comprometendo sua saúde, prejudicando o jurisdicionado com o aumento da duração do processo e mesmo com a quebra da solidariedade profissional entre todos. É preciso mudar essa realidade”.
Texto: Lenir Camimura
Edição: Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias