Novas ações no campo das inspeções prisionais qualificam respostas do Judiciário

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Recife, 16/08/2022 - Inspeção nas Unidades Prisionais de Pernambuco - Presídio ASP Marcelo Francisco Araújo (Curado). Foto: G.Dettmar/Ag.CNJ
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Atividade fundamental na execução penal, as inspeções judiciais nos estabelecimentos prisionais são objeto de ações em andamento no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para apoiar tribunais, magistrados e magistradas a qualificar a atuação neste campo. A ação coordenada pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do CNJ (DMF/CNJ) parte de normas e diretrizes nacionais e internacionais de direitos humanos, refinando instrumentos, técnicas e metodologias de monitoramento para a potencializar os efeitos da atuação judicial.

“A Justiça funciona bem não apenas quando responsabiliza quem deve ser responsabilizado, mas quando garante que a execução da pena está dentro dos limites da sentença, da legislação, e dos tratados internacionais dos quais o país é signatário, a exemplo da Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes das Nações Unidas, internalizada em 1991”, avalia o coordenador do DMF/CNJ, Luís Lanfredi. “Se não oferecermos uma execução penal digna e livre de tortura e maus-tratos, não podemos caminhar para uma sociedade cidadã e inclusiva”.

Para a juíza auxiliar da Presidência com atuação no DMF/CNJ Karen Luise de Souza, a partir da experiência acumulada pelo CNJ no campo do monitoramento e da fiscalização do sistema carcerário, a criação de parâmetros para apoiar as inspeções se torna um dos principais instrumentos de incidência do Judiciário para qualificar a execução penal. “Para isso, partimos do desenvolvimento de metodologias baseadas em boas práticas, do monitoramento e de processos formativos contínuos”.

A ação é realizada com o apoio técnico do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento por meio do programa Fazendo Justiça, e tem ainda o apoio da Associação de Prevenção à Tortura (APT). Além de trabalhar na atualização do formulário de inspeção judicial, o CNJ vai propor fluxos de identificação e tratamento de casos de tortura, além de publicar manual detalhando a metodologia. Também estão previstas atividades formativas presenciais e à distância, assim como estratégia de atualização do Cadastro Nacional de Inspeções nos Estabelecimentos Penais (CNIEP) e da plataforma Geopresídios.

Para a representante da APT no Brasil, Sylvia Dias, é fundamental que o Judiciário desenvolva ferramentas para auxiliar a realização das inspeções nas unidades de privação de liberdade considerando todas as suas especificidades, garantindo o que é determinado pelo ordenamento jurídico brasileiro. “A lei estabelece a previsão de realizar as visitas, mas não diz como realizá-las e quais seus objetivos, e o CNJ dá um importante passo para criar uma metodologia dirigida para juízas e juízes de como realizar essas inspeções”.

Trabalho judicial qualificado

Para a juíza do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Sonali da Cruz Zluhan, a ida constante a casas prisionais é fundamental para a atuação de magistrados e magistradas na execução penal. “Muitas vezes ocorrem fatos nas penitenciárias e presídios que não chegam ao juiz. A inspeção regular, além de auxiliar no cumprimento da pena, facilita o trabalho judicial. Aproxima, inclusive, os servidores prisionais do judiciário”.

O juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo, Jayme Garcia dos Santos Junior, argumenta que a jurisdição na execução penal não se esgota com decisões nos autos do processo. “Sempre entendi como a mais importante atribuição do juiz da execução de pena aquela que trata das inspeções. É no contato direto com os funcionários e pessoas privadas de liberdade que o magistrado conhece, realmente, as verdadeiras demandas relacionadas ao êxito de sua atuação. É também ferramenta fundamental para construir soluções e políticas interinstitucionais conjuntas com outros agentes do Estado”.

“Atualmente, há uma compreensão melhor do papel das inspeções, que é justamente dar a servidores e população prisional a oportunidade de verbalizar suas condições, seja de trabalho, seja de custódia. Estabelecimentos penais são instituições públicas e, portanto, estão sujeitas à verificação de seus resultados, da efetividade de sua razão de ser”, explica Cintia Rangel Assumpção, da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen).

O defensor público de São Paulo Leonardo Biagioni de Lima também ressalta a importância de que as inspeções cumpram um dos seus principais objetivos – o contato com a realidade das pessoas privadas de liberdade. Segundo o defensor, é importante diversificar a origem das informações para que se fortaleça uma visão judiciária mais qualificada sobre a realidade local.

Atuação conjunta

É justamente para apoiar tribunais na construção de políticas interinstitucionais conjuntas que o CNJ vem realizando uma série de correições em parceria com a Corregedoria Nacional de Justiça com foco na privação de liberdade, sendo que a qualificação das inspeções judiciais é um dos temas abordados. Recentemente, houve ações em Pernambuco, Ceará  e Amazonas.

A metodologia é especialmente elaborada e adaptada à realidade local a partir de levantamentos prévios com informações objetivas. As atividades incluem inspeções nas unidades de privação de liberdade, verificação do funcionamento dos sistemas e plataformas eletrônicas, capacitações para melhor utilização dessas plataformas e, especialmente, reuniões com representantes de entidades locais e sociedade civil para análise e levantamento das principais demandas.

“Quem está nessa posição [de representante de entidades locais] conhece melhor a realidade das pessoas presas. Conhece as especificidades de cada unidade, de cada pavilhão. E conhece porque conversa com sobreviventes e familiares de quem está preso naquela unidade ou, até mesmo, porque é familiar ou sobrevivente, e aí sabe muitas coisas em detalhes”, aponta o sociólogo Fabio Candotti, da Frente Estadual pelo Desencarceramento do Amazonas.

“A escuta de todos os atores envolvidos – sociedade civil, egressos e familiares, pessoas privadas de liberdade, Ministério Público, Conselho Penitenciário, Poder Executivo, entre outros – é fundamental para o desenvolvimento de soluções sustentáveis a longo prazo”, ressalta a coordenadora adjunta do Eixo de Cidadania do programa Fazendo Justiça, Pollyana Alves.

Texto: Renata Assumpção
Edição: Nataly Costa e Débora Zampier

Agência CNJ de Notícias

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