No Senado, CNJ destaca esforço junto ao Poder Executivo para fechamento dos hospitais de custódia

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CSP - Comissão de Segurança Pública Comissão de Segurança Pública (CSP) promove audiência pública interativa para debater política antimanicomial. Foto: Geraldo Magela/Agência Senado
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A uma semana de ser comemorado o Dia Nacional da Luta Antimanicomial (18/5), os impactos e desafios para se implementar – a partir de 28 de agosto –, em sua totalidade, a Política Antimanicomial, determinada pela Resolução CNJ n. 487/2023, foram levados a debate em audiência pública na Comissão de Segurança Pública do Senado Federal, nesta terça-feira (7/5).

O regulamento normativo aprovado no ano passado prevê, entre outras medidas, o fechamento dos hospitais de custódia em todo o país. As regras reorientam para adequado atendimento e tratamento das pessoas com transtorno mental ou qualquer forma de deficiência psicossocial em conflito com a lei mediante a utilização dos equipamentos da rede do Sistema Único de Saúde (SUS), como preconiza a Lei n. 10.216/2001 – Lei da Reforma Psiquiátrica – e a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), o juiz Luís Geraldo Lanfredi destacou o esforço feito pelo Conselho, no sentido de instrumentalizar a política a partir dos novos paradigmas e modelos trazidos pelo Parlamento brasileiro, sobretudo instando o Poder Executivo, por meio do Ministério da Saúde e das secretarias estaduais e municipais, a fim de remanejar recursos para o reaparelhamento da rede de saúde destinada a oferecer o tratamento adequado às pessoas que cumprem medidas de segurança.

“A resolução do CNJ procura trazer sentido e conferir algum regulamento à disciplina legal, zelando pelo endereçamento adequado do compromisso com novos modelos terapêuticos que nos permitam tratar com dignidade pessoas que necessitam ter um tratamento de saúde compatível com seus quadros clínicos e não serem submetidas a uma vida degradante, com o agravo de seu sofrimento mental”, disse o magistrado, na abertura da audiência pública. O assunto tem gerado debates, principalmente em relação ao encaminhamento desses pacientes inimputáveis para atendimento ambulatorial nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs), Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT) ou Hospitais Gerais.

Centros de tratamento ambulatorial

Vale ressaltar que o número de pessoas que cumprem medida de segurança no país é de pouco mais de 2 mil pessoas, ou seja, 0,4% da população em privação de liberdade no Brasil. Dessas, aproximadamente 600 já cumprem o tratamento na modalidade ambulatorial (nos CAPs, em sua maioria).

Desenvolvidos para substituir os hospitais psiquiátricos, essas unidades especializadas atendem pessoas em sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves ou persistentes, ou mesmo dependência de álcool e outras drogas. Atualmente, há quase 3 mil CAPs em funcionamento no país.

Um dos cinco autores de requerimento para colocar o tema em debate, o senador Sérgio Moro (União-PR) ressaltou a boa intenção da política pública do CNJ, mas ponderou que a medida gerou críticas em parte da comunidade médica. “A maior preocupação é quanto ao fechamento dos hospitais psiquiátricos e o atendimento desses inimputáveis que tenham cometido crimes graves”, indicou.

O coordenador do DMF explicou a necessidade de se repensar o sistema de saúde para atender a essas pessoas de uma maneira correta. “O que estamos fazendo não resolve. Acentua o problema. Diferentemente de uma pena, medidas de segurança não têm tempo específico de vigência. Podem durar toda uma vida. E essas pessoas podem ficar esquecidas lá dentro, onde terminam por perder seus vínculos familiares. Do que mais elas precisam é de equipamentos adequados. De pessoas preparadas e que as submetam a protocolos condizentes com seus projetos terapêuticos singulares. Essa necessidade, elas nunca vão encontrar em um ambiente com conotação prisional, informado pela lógica do cumprimento de penas de prisão. Elas precisam de um tratamento curativo que lhes permita superar as disfunções psicossomáticas que experimentam. Hospitais de custódia não são hospitais, nem têm se apresentado como espaços de tratamento para cumprir essas finalidades. São locais onde impera o improviso, a precariedade. A regulamento editado pelo do CNJ volta a nos lembrar da Lei Antimanicomial, que vem sendo ignorada há 22 anos. Todos precisamos atuar para vencermos as limitações de um modelo que não aproveita a ninguém, nem a própria sociedade”, completou Luis Lanfredi.

O secretário estadual de Administração Penitenciária de São Paulo, Marcelo Streifinger, contou a experiência no estado, onde há 937 pessoas nessa situação e afirmou que o Executivo tem feito um trabalho terapêutico individualizado de desinternação progressiva. O trabalho vem sendo desenvolvido nos últimos 30 anos além de um programa de visitações virtuais, que ajuda a recompor os vínculos familiares.

“Não são criminosos, são doentes”

Streifinger reforçou haver uma união entre [secretaria] de Saúde, Administração Penitenciária e Judiciário para ajudar essas pessoas. “Elas erraram sim, mas não no nosso parâmetro. Precisam de cuidados. Uma sociedade democrática não pode colocar um doente para ser morto”, afirmou. “São pessoas que não têm autonomia e algumas não possuem mais quaisquer vínculos familiares. São essas pessoas que nos preocupam. Hoje, há equipes que tomam conta delas, mas, se esse sistema mudar, o número de cuidadores irá aumentar. É uma questão complicada e o prazo é exíguo”, ponderou.

O promotor de Justiça do Ministério Público de Goiás Haroldo Caetano citou a experiência do Programa de Atenção Integral ao Louco Infrator (Paili), iniciativa inovadora e humanizada implementada em Goiânia em 2006 que atende pessoas em medida de segurança.

“Há casos de pessoas que cometeram crimes violentos e, hoje, estão acolhidas e inseridas. Quem tem condição e autonomia fica só, mora sozinho, e é acompanhado pelo programa com suporte da rede dos CAPs. Na rede de saúde mental, esse acompanhamento nunca cessa, é contínuo”, explicou.

Texto: Regina Bandeira
Edição: Thaís Cieglinsky
Agência CNJ de Notícias

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