No Dia do Oficial de Justiça, servidores revelam riscos enfrentados na rotina de trabalho

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Servidores do TRF1, Márcio e Janete enfrentam desafios diários para cumprir as determinações judiciais - Foto: Rômulo Serpa/Ag. CNJ
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Diante dos inúmeros desafios no dia a dia de trabalho, eles não desanimam. Neste Dia Nacional do Oficial de Justiça, a Agência CNJ de Notícias reuniu histórias desses servidores do Poder Judiciário que não poupam esforços para transpor barreiras. Eles contam que o trabalho na ponta tem riscos, mas não recuam ante o cumprimento da missão.  

Transferido do Rio de Janeiro para o Distrito Federal, Márcio Martins Soares, de 52 anos, guarda memórias de momentos de tensão vivenciados no exercício da profissão na Baixada Fluminense. A desocupação mais marcante, conta, aconteceu em um condomínio do programa Minha Casa, Minha Vida.  

“Havia traficantes na área e muitas pessoas ocupavam as unidades habitacionais. Além do apoio da polícia, foi necessário muito diálogo para que a desocupação acontecesse de forma pacífica”, disse o servidor que hoje atua no Tribunal Regional da 1ª Região. “Por um lado, a ação era necessária porque a situação feria o direito de quem havia sido contemplado pelo programa. Por outro, havia pessoas que se encontravam ali e nem tinham para onde ir. Procurei agir de forma humana”, afirma.

Com 25 anos de profissão, a colega da Seção Judiciária do Distrito Federal do TRF1, Janete Silva Mota, 52 anos, considera o processo judicial eletrônico um marco no trabalho dos oficiais. Ela lembra de um episódio em 2001, quando participou da preparação, na região do Itapoã, de operação que envolveu 50 policiais militares, que no momento da desocupação foi suspensa por uma decisão em caráter liminar.  

Além dela, tinham sido destacados outros quatro oficiais de justiça, cinco policiais federais, dois ônibus para levar os ocupantes aos lugares de origem e cinco caminhões para retirar os pertences. “Ficamos sabendo da decisão por uma liderança e a confirmação nos chegou pela imprensa. Olha a diferença que é hoje com o PJe: a decisão sai, e rapidinho somos avisados de tudo”. 

Naquela circunstância, a polícia que daria apoio à desocupação acabou tendo de montar uma operação para retirada dos oficiais de justiça do local. “Os policiais estavam com fuzis. Havia muita gente com os ânimos alterados. Graças a Deus, acabou não acontecendo e hoje lá é uma região administrativa”, diz, aliviada.  

Comunidades indígenas 

Desde 2007 atuando em Manaus, a oficial de Justiça Simariney Fernandes Coelho, 55 anos, relembra os tempos de quando trabalhava no interior amazonense, em Jutaí e, frequentemente, tinha mandados de segurança para cumprir em territórios indígenas.  

Além das dificuldades de comunicação com aqueles que não falam português, havia os desafios logísticos. “Trabalhar no interior do Amazonas já é difícil, mas nas comunidades indígenas é mais ainda. O acesso é por rio e dependia de carona para lá. Tinha comunidade que levava cinco dias até chegar de barquinho”, rememora a oficial de justiça.  

Ela economizou e conseguiu comprar uma lancha. “Trabalhamos muito tempo com os nossos próprios recursos porque muitas vezes a parte requerente não tinha condição financeira para arcar com a despesa. Se não formos diligentes, o processo não anda”, constata.   

Com orgulho, ela considera que o empenho dos oficiais de justiça contribuiu para o Tribunal de Justiça do Amazonas ter obtido o selo Diamante do Conselho Nacional de Justiça: “Há uma dificuldade grande de fazer citações e intimações. Mas eu sentia prazer em estar ajudando essas pessoas que não tinham condições de ter acesso à Justiça e, para isso, não media esforços.”   

Desastre em Mariana 

Graziela Cristina Silva Oliveira atua como oficial de justiça em MG – Foto: Arquivo pessoal

Em 2015, o trágico rompimento da Barragem do Fundão, da empresa Samarco, mudou completamente a rotina dos oficiais de justiça que atuam em Mariana (MG). Graziela Cristina Silva Oliveira, 42 anos, servidora do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) conta que naquele ano cumpriu 1.500 intimações e que o desastre, ocorrido em novembro, veio a ter impacto em crescimento no número de ações individuais a partir de 2016.  

“Aumentou demais. Em 2016, foram 23% de mandados a mais; em 2017, 45%; em 2018 e 2019, 52%; só caiu durante a pandemia. Mas em 2022 e 2023 já houve uma elevação de 61% e 65% no número de mandados, respectivamente”, contabiliza.   

Violência doméstica

Há nove anos atuando em casos de violência doméstica, a oficial de Justiça do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul Carolina Rocha Bernhard, 38 anos, diz que seu esforço cotidiano é cumprir com agilidade os mandados: “Enquanto não consigo contato com a vítima, fico apreensiva. Não aconteceu nos casos em que atuei, mas sempre há o receio de ocorrer um feminicídio”.  

Segundo ela, por ser mulher, os riscos da profissão são maiores, como certa vez em que o agressor a recebeu em trajes íntimos quando foi realizar a entrega da intimação. “Minha única reação foi ir rápido para o meu carro. Era um local ermo e eu estava sozinha, pois, como não seria necessária a retirada dele de casa, não havia pedido escolta policial”, relata.  

Sempre que é determinada pelo juiz a saída do agressor da residência, ela vai acompanhada de dois policiais militares. Apesar de esses casos serem bem mais frequentes, há situações em que a mulher pede apoio para sair de casa com os filhos. “Temos de ser quase psicólogos. Os casos mais emblemáticos foram os em que retirei a vítima de casa. Foram casos em que elas sabiam que, se o agressor fosse obrigado a sair, acabaria retornando depois”, explica.  

Segundo Carolina, quando o homem é retirado, sai apenas com objetos de uso pessoal. Quando a mulher decide sair com os filhos, é necessário providenciar a mudança, que pode durar até dois dias inteiros. “Nesse meio tempo, a vítima se desespera, entra em conflito consigo mesma.  A Lei Maria da Penha vai muito além das medidas protetivas de afastar o agressor: envolve a questão dos filhos, da família. Foram situações muito dolorosas àquelas nas quais tive de fazer o afastamento da vítima”.   

Para transmitir o aprendizado das experiências vivenciadas a outros colegas, Carolina já participou de cursos voltados à preparação de oficiais de Justiça ao enfrentamento da violência doméstica. O programa foi coordenado pela juíza do 1º Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Porto Alegre, Madgéli Machado.  

“Eles e elas, oficiais de Justiça, são a linha de frente do Judiciário, e devem estar preparados para desenvolver as suas atividades com a sensibilidade e o conhecimento que o tema exige”, considera a idealizadora do curso “Violência Doméstica contra a Mulher: atualização para Oficiais de Justiça”, ministrado em formato virtual.

Texto: Mariana Mainenti
Edição: Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias

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