Movimentos sociais e instituições públicas debatem política racial para o Judiciário

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Reunião do Fórum Nacional do Poder Judiciário para a Equidade Racial (Fonaer) - Foto: G.Dettmar/Ag. CNJ
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O aperfeiçoamento do Sistema de Justiça, por meio de políticas públicas que promovam equidade racial no Poder Judiciário, está na essência da minuta de texto estruturada pelos membros do Fórum Nacional do Poder Judiciário para a Equidade Racial (Fonaer), nesta terça-feira (24/10), em um encontro que reuniu representantes de instituições públicas e entidades civis, na sede do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília. O texto, ainda não concluído, deverá concretizar-se como a Política Nacional de Equidade Racial no Poder Judiciário.

Essa foi a segunda reunião do Fórum criado pela Resolução Nº 490/2023. Entre as competências do Fonaer está a de propor, ao Poder Judiciário, a implementação de ações concretas, assim como de normativos que ponham fim às desigualdades encontradas por pessoas pretas e pardas no acesso à Justiça.

Para enfrentar o racismo estrutural e suas manifestações, o presidente do Fórum, conselheiro Vieira de Mello Filho, ressaltou o compromisso com o estabelecimento de medidas que efetivamente promovam equidade racial, assim como erradiquem as diversas formas de violência racial e outras formas de discriminação. Entre os pontos debatidos pelos participantes do encontro está a necessidade de capacitação de magistrados, magistradas, servidores e servidoras nas questões afetas ao racismo estrutural.

“Tivemos um concurso para a magistratura em que, dos 650 candidatos, 350 eram pardos. Foram aprovados 199: nenhum negro. As perguntas abordadas no concurso eram típicas questões de pé de página, ou seja, não havia como ser aprovado se o participante não tivesse feito cursinhos preparatórios. A discriminação começa na concorrência”, disse o conselheiro.

Juiz auxiliar da Presidência do CNJ Edinaldo Cesar Júnior; conselheiro Vieira de Mello Filho; secretária-geral do CNJ, Adriana Cruz; e juíza auxiliar da Presidência do CNJ Karen Luise Souza – Foto:G.Dettmar/Ag.CNJ

Vieira de Mello Filho lembrou ainda que chegou a ouvir de um presidente de tribunal que no Judiciário de seu estado ‘não havia racismo’, o que evidencia a necessidade de capacitação de toda a força de trabalho da Justiça, para que se enxergue os pontos cegos do racismo estrutural. O conselheiro também citou a dificuldade que juízas e juízes negros encontram em relação ao vitaliciamento em seus cargos. “Esses magistrados encontram mais dificuldade e discriminação nesse processo. Se não implementarmos ações concretas, nada vai acontecer”, reforçou.

O magistrado também pediu aos participantes da reunião que observassem comparativamente o número de pessoas negras na magistratura e o número de pessoas negras presas, por decisões judiciais. “Os negros são a população-alvo da restrição de liberdade: 68% dos que estão presos no sistema penitenciário masculino são negros. No sistema penitenciário feminino, 54% são negras. Temos 35 anos de Constituição Federal e só agora estamos trabalhando contra o elitismo branco da Justiça brasileira. Estamos muito atrasados”, afirmou.

A secretária-geral do CNJ, juíza federal Adriana Cruz, reiterou o compromisso do presidente do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso, com a busca pela equidade racial na Justiça. “Essa é uma das prioridades do ministro e ele nos cobra energicamente alguma ação efetiva nessa temática”, disse. “A minuta é um vetor para otimizarmos os trabalhos, mas estamos abertos para debates e contribuições da sociedade brasileira”, ressaltou.

Trabalho coletivo

O juiz auxiliar da Presidência do CNJ Edinaldo Cesar Júnior ressaltou a importância de trabalhar coletivamente as questões raciais para a resolução dos problemas estruturantes do país em relação a esse tema. “Há uma série de temas que precisamos debater e que deverão estar na regulamentação dessa política. As cotas, apenas, não resolvem o problema. Precisamos não apenas de políticas antirracistas na Justiça, mas de formas de promovê-las em todas as estruturas judiciárias. Ações que garantam a formação de formadores, porque essa é uma construção coletiva e ainda somos muito poucos”, disse.

As contribuições dos participantes do Fórum à política de equidade racial foram discutidas em subgrupos e serão incorporadas na redação do novo documento a ser apreciado pelo Plenário do CNJ. As discussões abordaram, entre outros assuntos, a efetividade das ações afirmativas já implementadas, condutas a serem contempladas nessa política e comportamentos observados nos julgamentos dos processos, no tratamento das partes e de todos os atores do Poder Judiciário.

Em termos práticos, foram sugeridos, por exemplo, instrumentos para fortalecer e ampliar o ingresso de pessoas negras nos quadros funcionais dos órgãos de Justiça, ações que visem o combate ao racismo e uma revisão no percentual de cotas em concursos públicos.

A juíza auxiliar da Presidência do CNJ Karen Luise Vilanova Batista de Souza apresentou aos participantes um relatório do trabalho referente aos últimos doze meses, desde a criação do Pacto Nacional do Judiciário pela Equidade Racial, em novembro de 2022. Ela lembrou que 100% dos tribunais aderiram ao programa voltado a adoção de condutas que promovam equidade e constituíram um gestor para conduzir as atividades relativas ao tema.

No entanto, a magistrada ponderou ter “consciência crítica” de que apenas firmar o Pacto não condiciona os tribunais a solucionarem os graves entraves que essa população encontra em termos de direitos. “Se nem mesmo a reserva de 20% estamos conseguindo cumprir, é sinal de que precisamos estar mais juntos, capacitar, criar cursos, seminários, montarmos estratégias para conseguirmos chegar na paridade de acesso, na paridade de oportunidades”, disse.

A magistrada destacou a importância da criação do Prêmio Equidade Racial na Justiça, aprovado no mês passado, para estimular os tribunais a aderirem ao combate ao racismo estrutural e institucional.

Texto: Regina Bandeira e Juliene Andrade 
Edição: Sarah Barros 
Agência CNJ de Notícias

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