O racismo ambiental é mais uma forma de tratamento desigual que afeta majoritariamente pessoas pretas, quilombolas, indígenas e ribeirinhas, instaladas em locais sem acesso à água potável, em regiões contaminadas por resíduos tóxicos e constantemente palco de tragédias. Esse complexo contexto é tema de debates no “Seminário sobre direitos humanos: racismo ambiental, migrações e ações coletivas” promovido nesta sexta-feira (22/9) pelo Observatório de Direitos Humanos do Poder Judiciário no Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Na abertura do evento, a presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, ressaltou a importância da exposição e da discussão sobre situações e desafios referentes às realidades complexas envolvidas nesse cenário, como os fluxos migratórios provocados pelo impacto das severas desigualdades socioambientais e econômicas encontradas no país.
“Temos muito a refletir sobre eles para que possamos, ao menos, tentar mudar o estado de coisas atual. O meio ambiente e os seres que dele fazem parte, no presente e no futuro, clamam pela imediata redução dos índices de desmatamento, das poluições em todas as suas formas e dos diversos outros danos. A Constituição Federal enuncia o direito de todos ao meio ambiente e impõe ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”, afirmou a presidente.
O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), ministro Lelio Bentes Corrêa, destacou que o mundo precisa buscar uma forma de convivência harmoniosa entre as pessoas e os outros seres que habitam o planeta. O diálogo entre essas partes não pode ser ditado “[…] pelas regras de quem oprime, de quem discrimina, de quem explora. Ele precisa ter a participação das populações vulnerabilizadas que, infelizmente, raramente são ouvidas”, disse o presidente do TST.
O ministro ressaltou a relevância dos debates aguardados no seminário, entre eles o tema migração forçada, que frequentemente decorre dos trabalhos aviltantes à dignidade do ser humano, como o análogo à escravidão, o infantil e a exploração sexual.
Coordenadora do Comitê Executivo do Observatório dos Direitos Humanos do Poder Judiciário, a desembargadora Carmen Gonzalez, que atua como auxiliar da Presidência do CNJ, reforçou a importância de a questão ambiental estar incluída nos debates sobre direitos humanos. “Esse é um tema urgente para a nossa geração e para as gerações futuras. Não é possível falar de clima sem falar de pessoas e de direitos humanos”, disse.
Carmen Gonzalez abordou a relevância do Acordo Regional sobre Acesso à Informação, Participação Pública e Acesso à Justiça em Assuntos Ambientais na América Latina e no Caribe, conhecido por Acordo de Escazú, assinado pelo Brasil em 2018, mas que aguarda ratificação pelo Congresso Nacional para efetiva implementação. “É um instrumento histórico e fundamental para uma governança ambiental e climática transparente, participativa, inclusiva e justa e atenta à defesa da vida”, disse.
A desembargadora reforçou que a norma tem como objetivo facilitar o acesso e a divulgação de informações ambientais, assim como ampliar a participação pública no processo de tomada de decisões, além de garantir o acesso à justiça, incluindo, por exemplo, reparação de danos e resolução de controvérsias.
“O Acordo de Escazú também é inovador ao prever mecanismos específicos de proteção e direito à vida de defensoras e defensores ambientais, buscando prevenir, investigar e punir ataques e ameaças. Infelizmente é necessário lembrar que a nossa região é a mais violenta do mundo para quem se arrisca a defender o meio ambiente: segundo a Global Witness, três a cada quatro ataques contra defensores ambientais em 2013 ocorreram na América Latina”, ressaltou a desembargadora.
Ampliação das vozes
À frente do Fórum Nacional do Poder Judiciário para Monitoramento e Efetividade das Demandas relacionadas aos Povos Indígenas (Fonepi), o conselheiro João Paulo Schoucair destacou a necessária defesa da ampliação das vozes indígenas no Judiciário, assim como da aplicação de medidas concretas por parte do Sistema de Justiça em questões de interesses dos povos originários do Brasil. E citou, como exemplo de ações do CNJ, a aprovação das cotas para indígenas no âmbito do Poder Judiciário, prevista na Resolução n. 512/2023.
“Em respeito à dívida histórica do Estado brasileiro para com os povos originários desse país, o Poder Judiciário deve saber ouvir, entender suas aflições, debater eventuais soluções e, sobretudo, agir no firme propósito de dar voz àqueles que, antes de todos os outros, aqui estavam”, afirmou. Os conselheiros Marcio Freitas e Giovanni Olsson também estiveram presentes na abertura do evento.
A juíza auxiliar da Presidência do CNJ Karen Luise Souza e o desembargador Néviton Guedes, do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região (TRF-1), marcaram presença no seminário e também salientaram a importância do evento promovido pelo ODH, pioneiro na discussão sobre racismo ambiental.
No painel Vozes da Terra, foram ouvidos os depoimentos do advogado e líder indígena da Universidade do Vale do Javari (UNIVAJA/AM), Eliesio Marubo; de Wilma Melo, presidente da ONG Serviço Ecumênico de Militância nas Prisões; da defensora popular da Comissão Pastoral da Terra de São Felix do Xingu (PA), advogada Leidiane Pias Dias; e Rejane Rodrigues, defensora popular e liderança do Quilombo baiano Quingoma.
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Texto: Regina Bandeira
Edição: Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias