A repetitividade das ações previdenciárias, tema que mais gera processos na Justiça federal, foi tema de pesquisa encabeçada por magistrados do juizado especial da Seção Judiciária de São Paulo , do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), apresentada na última quinta-feira (5/5) no Seminário de Pesquisas Empíricas Aplicadas a Políticas Judiciárias, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Outro estudo apresentado tratou do alcance social dos juizados especiais cíveis em cidades de porte médio do Maranhão, estado com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
O seminário ocorre desde maio de 2021 e apresenta e discute pesquisas sobre o Judiciário. Nesta edição, foi a vez de se debater o fenômeno crescente da judicialização previdenciária e a presença recorrente dos mesmos litigantes nas varas e juizados especiais federais. “Estamos na era das evidências. Trazer dados a partir de pesquisas é um salto qualitativo para o Judiciário, que não pode trabalhar no achismo”, afirmou a juíza auxiliar da Presidência do CNJ e coordenadora do Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ, Lívia Peres.
Junto com a Escola de Magistrados do TRF3, os juízes pesquisaram as características da repetitividade de ações de pedidos de benefícios por incapacidade – responsável por 12% da demanda do juizado especial de São Paulo. Os dados revelaram que há um crescimento de ajuizamento de processos nessas unidades desde 2015. E que em 23% dos casos há pedidos repetitivos.
As causas da repetitividade não foram detectadas pelo estudo. No entanto, a pesquisa concluiu que não foi identificado um comportamento abusivo por parte das pessoas que buscam obter judicialmente um benefício previdenciário por incapacidade. Entre 2015 e 2019, foram distribuídos 1,1 milhão de processos no TRF3, dos quais 23% (261 mil) eram ações repetitivas (de pessoas que ingressaram com mais de uma ação) e 12% (136 mil) relativos a benefícios de incapacidade – auxílio doença (maioria), aposentadoria por invalidez ou auxílio acidente.
A grande maioria desses casos (79,7%) entrou com dois processos e 16% com três ações. O estudo também revelou o percentual de resultado das perícias médicas (que embasam a concessão ou não dos benefícios): em 56,5% elas foram desfavoráveis às pessoas.
Foram utilizadas três técnicas de pesquisa: levantamento de dados (de 2015 a 2019); análise de movimentação processual e de conteúdo dos processos judiciais; e grupo focal (pesquisa qualitativa) com atores institucionais. “Fiquei impressionado como juízes de todo o país sentiam a mesma angústia e dificuldades em relação a esse tema, deixando claro que é uma questão nacional, com variações pequenas de acordo com a região”, afirmou o juiz federal Ricardo de Castro Nascimento, um dos responsáveis pelo levantamento.
População vulnerável
A outra pesquisa apresentada no Seminário abordou a importância da presença dos juizados especiais cíveis na melhoria da qualidade de vida da população de municípios mais vulneráveis. A pesquisa elaborada em tese de mestrado da juíza Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) Lavínia Helena Macedo Coelho, titular de juizado especial há 10 anos, demonstra que o resultado de processos judiciais pode atenuar as desigualdades sociais. “Onde tem uma unidade do juizado especial julgando – sobretudo esses processos que são gerados por demandas repetitivas, relativos a empréstimos consignados, revisão de contratos – acaba havendo um incremento social na comunidade, em geral, mais vulnerável”, explicou o presidente do TJMA, desembargador Paulo Sérgio Velten Pereira.
O levantamento, feito em comarcas de médio porte e de IDH mediano, entre 2017 e 2019, revelou que as pessoas que acessam os juizados especiais não são as mais vulneráveis. Segundo Lavínia Macedo, mais de 50% das pessoas que entram no juizado especial têm nível superior. Além disso, 30% têm 2º grau, mais de 80% estão empregadas e a maioria ganha mais de dois salários mínimos. “Esse homem não tem nada a ver com o homem do Maranhão, que tem o segundo pior nível de escolaridade do país e ganha pouco mais de 500 reais. Os juizados foram pensados na década de 1970 para acolher os mais vulneráveis. Será que a gente não pode aperfeiçoar o Sistema de Justiça para favorecer o acesso dos mais vulneráveis? Será que não estamos trabalhando para os já privilegiados?”, questionou a juíza.
A magistrada reforçou a necessidade de se investir nos juizados especiais, que resolvem as ações em tempos mais curtos que na Justiça comum. Na cidade de Pedreiras, segundo Lavínia, uma ação no juizado tramita em 1/7 do tempo em que tramita na capital do estado. Ela também afirmou que é preciso que os juizados se desloquem para as cidades menores, ribeirinhas, para levar a Justiça aos menos privilegiados. “É um brasileiro que precisa que a Justiça chegue até ele.”
As pesquisas empíricas aplicadas a políticas judiciárias contribuem para aumentar o conhecimento daqueles que lidam diretamente com a prestação jurisdicional. Os Seminários são realizados por meio do Departamento de Pesquisas Judiciárias, sempre às quintas-feiras, de 15 em 15 dias.
Regina Bandeira
Agência CNJ de Notícias
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