A voz das mulheres protegidas pelas medidas protetivas oferecidas pela Justiça ganhou mais força com a premiação do livro “Rupturas e Recomeços – Percepções de Mulheres sobre medidas protetivas de urgência da Lei Maria da Penha na cidade de São Gabriel – Bahia”, escrito pela advogada Leonellea Pereira. A publicação foi a vencedora da categoria “Produção Acadêmica” do Prêmio CNJ Juíza Viviane Vieira do Amaral, organizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Lançada em 2021, a premiação tem como como objetivo dar visibilidade a ações de prevenção e enfrentamento ao fenômeno da violência doméstica e familiar contra mulheres e meninas.
A obra é resultado de pesquisa acadêmica da advogada sobre processos que envolvem situações de violência doméstica e familiar, especialmente no que diz respeito à concessão das medidas protetivas de urgência previstas na Lei n. 11.340/2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha. O livro fala sobre os efeitos práticos das medidas e busca entender as dinâmicas em torno desta decisão judicial. A análise foi possível graças a realização de entrevistas semiestruturadas aliado a um breve exercício cartográfico na pesquisa de campo. Além disso, de acordo com a autora, foi realizada uma coleta de informações dos registros dos processos e inquéritos policiais iniciados entre 2006 e 2016, que foram cruzados com os dados da pesquisa do CNJ sobre a aplicação da Lei Maria da Penha.
“O que me chamou atenção na coleta de dados é que nos casos menos graves, a medida protetiva tem um poder mais forte de conseguir romper com o ciclo de violência”, afirmou a especialista, ressaltando, com isso, a importância de se procurar ajuda logo nos primeiros sinais. “Há uma dificuldade de enxergar a pessoa que pratica o ato de violência doméstica como um criminoso. Isso porque são pessoas que, na maioria das vezes, trabalham, têm sua família, uma boa relação com a comunidade. Então as pessoas não enxergam como um criminoso. Elas vêm uma pessoa grosseira, ríspida, mas não criminoso. Isso até mesmo a mulher que passa pela violência. Por isso é importante estar atenta.”
Pandemia
No ano de 2020, a cada cinco minutos foi feita uma denúncia de violência contra a mulher no Brasil. A informação é do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos que compila os dados dos canais Disque 100 e Ligue 180, totalizando 105.671 denúncias de violência contra a mulher no ano passado, das quais 72% delas foram de violência doméstica e familiar. “Temos a impressão de que os números aumentaram com a pandemia, mas na verdade ela descortinou uma situação que já existia por que as pessoas que sofriam alguma violência no ambiente doméstico passaram a não ter mais acesso a ambientes externos, como trabalho e roda de amigos, ficando mais expostas a situação de risco”, comentou Leonellea.
Apesar da aridez das entrevistas e do assunto, a advogada se diz esperançosa. “As entrevistas me emocionaram pois me trouxeram esperança. É possível sim recomeçar a vida, ter um novo recomeço, apesar de tantas dificuldades, apesar da estrutura do Estado não ser adequada. É possível acreditar numa vida sem violência lá na frente. Lembrando que a rede de apoio da família faz muita diferença”, disse. Para ela, a grande mudança passa pela educação da sociedade. “Tudo passa pela educação. A solução passa pela educação. Eu acredito que esse olhar para o respeito ás diferenças e à diversidade, e quebrando os estereótipos da nossa sociedade podem contribuir para reduzir esse número de casos tão grandes que temos no Brasil”, explicou. Ela também ressaltou o impacto positivo das medidas educativas do agressor. “Muitos deles precisam de terapia pois essa forma de se portar, com violência, foi a única forma que ele aprendeu.”
Para as vítimas, a especialista deixa um conselho. “O conselho que dou para todas as mulheres é ficar atenta e sempre procurar ajuda. Ter alguém de sua confiança. Se achar que está em situação de risco, deixa uma pessoa próxima avisada. Esse é o papel e a importância da rede de apoio. Ela faz muita diferença. Uma pessoa sozinha está muito mais vulnerável.”
Paula Andrade
Agência CNJ de Notícias