Lideranças históricas feministas contam luta pela conquista de direitos no Brasil

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Painel sobre o Movimento das Mulheres na Constituinte de 88 durante 2ª Edição do Encontro Mulheres na Justiça. Foto: Luiz Silveira/Ag.CNJ.
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“Conquistamos o direito à igualdade, mas a igualdade ainda está, em sua maior parte, apenas na lei, não na vida concreta das mulheres brasileiras. Nossa geração quebrou uma brecha nessa parede, mas ainda falta derrubar a porta”. A frase dita pela ativista histórica pelos direitos humanos no Brasil Hildete Pereira de Melo emocionou os participantes da 2ª edição do encontro Mulheres na Justiça: Novos Rumos da Resolução CNJ n. 255, nesta quinta-feira (31/8).

O evento reuniu, de maneira remota, duas ativistas que participaram do processo de elaboração da Constituição Federal de 1988 – Hildete Melo e Schuma Schumaher –, transformando o evento em uma aula sobre a atuação de mulheres que, na década de 1980, por meio de suas ações, garantiram diversos direitos para a sociedade brasileira. Entre eles, o Sistema Único de Saúde (SUS); a licença-maternidade de 120 dias; os direitos a trabalhadoras domésticas; a posse de terra para mulheres; a liberdade de expressão e de greve para qualquer categoria profissional e a igualdade salarial entre homens e mulheres.

O evento aconteceu no último dia do mês de agosto, quando – há 37 anos – foi elaborada a Carta das Mulheres Brasileiras, encaminhada aos parlamentares constituintes e à sociedade civil e deu origem a boa parte dos avanços do texto constitucional. O relato de experiência das duas mulheres que atuaram ativamente na elaboração do documento integrou a extensa programação do evento, que debate a participação feminina no Judiciário.

Atenta e participativa, a plateia aplaudiu as ativistas, que criticaram o desequilíbrio de forças salariais ainda hoje vivido pelas brasileiras e apontaram para as contínuas violências pelas quais ainda passam as mulheres em pleno século XXI. “Nós conseguimos conquistar a igualdade conjugal. Antes, a mulher era submissa ao marido. E conseguir essa libertação pode parecer coisa pouca, mas não o é”, disse Hildete.

Direitos ameaçados

A ativista destacou a importância de se furar o bloqueio [das mulheres em cargos eletivos] por meio da garantia de percentual mínimo de candidaturas de mulheres. “Hoje, para garantir equidade de gênero nos cargos eletivos devemos estabelecer algo voltado ao número de eleitos”, afirmou Hildete, que reforça a necessidade de vigilância constante para com os direitos conquistados.

“A luta precisa ser constante. Hoje mesmo, o Congresso estuda avançar em um de nossos direitos”, disse, citando o debate que vem ocorrendo sobre flexibilização da cota para candidaturas femininas, que prevê a obrigação de um percentual mínimo de 30%”, completou a ativista, que observou que as mulheres terminaram o século XX mais escolarizadas que os homens, mas o prêmio foi bem maior para eles, que seguem ganhando 21% a mais que elas.

Em 1985, ano de criação do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), a professora e ativista feminista e antirracista Schuma Schumaher foi coordenadora do “Lobby do Batom”, movimento que agiu ativamente para que direitos da mulher fossem incorporados ao texto constitucional.

O trabalho feito pelo grupo repercutiu anos depois, nas eleições de 1986: a bancada feminina havia passado de oito para 26 deputadas federais. “Nem todas estavam comprometidas com pautas feministas ou antirracistas. No entanto, elas estavam atentas, eram mulheres. E quando surgiam falas ou atitudes de políticos que cerceavam nossos direitos, reagiam rápido. Nossa atuação era cuidadosa e atuante, estimulando os eleitores a pressionarem seus representantes pela defesa dos direitos”, relembra Schuma Schumaher, sobre o trabalho cotidiano que faziam nos corredores do Congresso Nacional.

Lobby do Batom

Coordenadora do “Lobby do batom”, expressão inicialmente irônica e contrária ao trabalho dessas mulheres, que marcavam presença nas votações de emendas relacionadas às matérias femininas e nas comissões e Plenário da Câmara, Schuma recorda que transformou a frase numa ação política potente.

“Nós fazíamos um lobby democrático, que respeitava as mulheres, as parlamentares e os cidadãos, acompanhando bem de perto as conquistas e os retrocessos políticos e sociais. Fazíamos cartazes ‘Estamos de olho em vocês’. Isso gerou muito bochicho”, completou, Schuma. Segundo ela, 80% das propostas contidas na Carta foram incorporadas ao texto final da Constituição.

“A lei é uma coisa muito forte e muda-la foi muito difícil. Fiquem felizes porque nós conseguimos fazer muita coisa, mas não conseguimos tudo. Agora, resta a vocês que são a geração que está aí agora, conquistar a igualdade. Vale lutar pela igualdade por nossas filhas, nossas netas. Os homens vão ter que aprender a dividir conosco. Viva as mulheres e vamos para luta, porque ainda não está completa a nossa cidadania”, Hildete, arrancando aplausos da plateia emocionada.

Painel sobre o Movimento das Mulheres na Constituinte de 88 durante 2ª Edição do Encontro Mulheres na Justiça. Foto: Luiz Silveira/Ag.CNJ.

Na presidência da mesa de debates, o conselheiro Bandeira de Mello agradeceu as duas palestrantes e reforçou os depoimentos das mulheres. “Esses espaços não foram dados, oferecidos gentilmente, mas conquistados com muita luta. Com carta, passeata, discurso, debates. E eu gostei da provocação dela de conquistar lugar entre os eleitos, não entre os candidatos. Que assim seja, muito em breve”, finalizou o conselheiro.

Texto: Regina Bandeira
Edição: Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias

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