Prática recomendada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e presente em 24 unidades da Federação, as audiências concentradas são realizadas para reavaliar medidas de internação e semiliberdade de adolescentes no sistema socioeducativo. De acordo com levantamento feito pelo CNJ em 17 unidades socioeducativas de sete estados, quase 90% dessas audiências contam com a presença de familiares ou pessoas de referência, reforçando a proposta de fortalecimento de vínculos familiares e comunitários que devem caracterizar esse momento.
A pesquisa abrange o período entre novembro de 2022 e janeiro de 2023 e inclui registros administrativos, questionários aplicados às equipes técnicas e visitas às unidades para observar as práticas. No período, 220 audiências foram realizadas nas 17 unidades socioeducativas. Os dados mostram que 72% das audiências aconteceram dentro das próprias unidades, conforme orienta a Recomendação CNJ n. 98/2021. Com base nessa primeira coleta de informações, o documento apresenta boas práticas e desafios que precisam ser superados para garantir a efetividade dessa estratégia em todo o país.
“As audiências concentradas são uma oportunidade única de aproximar a magistratura da realidade daquele ou daquela adolescente em cumprimento de medida, ouvi-los, conhecer suas famílias e o contexto em que vivem. Ter conhecimento dos dados e analisar as informações colhidas é fundamental para aprimorar essa metodologia”, destaca Luís Lanfredi, coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF).
A publicação do relatório, assim como a qualificação e fomento da política, são parte das ações do programa Fazendo Justiça, coordenado pelo CNJ em parceria com Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) para transformações nos campos penal e socioeducativo.
Desafios
O relatório ainda aponta que em 19% dos casos, a audiência foi virtual, um modelo que compromete o diálogo presencial e o contato mais humanizado – e ainda há unidades que enfrentam dificuldades para garantir a participação plena da rede de apoio daquela ou daquele adolescente. “O envolvimento da família e da rede é indispensável para o sucesso das medidas socioeducativas. Sem isso, não há como promover uma verdadeira socioeducação”, pontua o juiz auxiliar da Presidência do CNJ com atuação no DMF Edinaldo Santos Junior.
Também foram identificadas diferenças quanto ao critério para participação de adolescentes nas audiências concentradas, uma vez que em 56% das unidades, a participação foi determinada com base em critérios de priorização, como o tempo de cumprimento da medida ou a necessidade de reavaliação semestral do Plano Individual de Atendimento (PIA). Esses critérios são importantes para organizar o trabalho das equipes e garantir foco nos casos mais urgentes, mas a recomendação é que a audiência seja realizada com todos e todas, como ocorre em 44% dos casos.
PIA
O papel central do PIA na qualificação das audiências concentradas também é apontado pela publicação, com 100% dos casos analisados utilizando relatórios técnicos para subsidiar as decisões judiciais. Esse plano individual fornece uma análise detalhada da evolução de cada adolescente, garantindo uma abordagem mais eficaz no acompanhamento das medidas socioeducativas. A sistematização do PIA é destacada como essencial para assegurar o alinhamento às diretrizes legais e para fortalecer a articulação entre os diversos atores do sistema de justiça e do atendimento socioeducativo.
O relatório destaca ainda que, entre os adolescentes atendidos, apenas 9% pertenciam a grupos em condições de vulnerabilidade acrescida, como gestantes, lactantes, indígenas ou pessoas LGBTI. O levantamento reforça que a participação desses adolescentes em audiências concentradas é essencial para garantir que suas particularidades sejam consideradas e que as decisões judiciais estejam alinhadas às suas necessidades.
Para a coordenadora do Eixo Socioeducativo do programa Fazendo Justiça, Fernanda Givisiez, “o relatório nos ajuda a compreender as lacunas e a traçar estratégias que priorizem adolescentes, fortalecendo as audiências concentradas como um instrumento de garantia de direitos”.
Sobre as audiências concentradas
As audiências concentradas são boas práticas identificadas em campo pelo CNJ, por meio do programa Fazendo Justiça, para qualificar o trabalho do Poder Judiciário no sistema socioeducativo. Inicialmente, eram realizadas no Amazonas e em Pernambuco, e com o apoio do programa, o trabalho foi institucionalizado, qualificado e expandido para 24 estados.
A partir da aprovação da Recomendação CNJ n. 98/2021, foi lançado o Manual sobre Audiências Concentradas em evento on-line de formação que durou três dias. Realizada em setembro de 2021, a transmissão ao vivo pelo YouTube do CNJ reúne mais de 7,4 mil visualizações. O tema foi abordado juntamente ao da Central de Vagas, que qualifica a porta de entrada do socioeducativo.
Texto: Renata Assumpção
Edição: Nataly Costa e Débora Zampier
Agência CNJ de Notícias