A atuação da Justiça pode ajudar o funcionamento do Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas (Provita). Decisões mais rápidas e priorização de casos urgentes podem salvar a vida de pessoas ameaçadas que colocam a vida em risco ao cooperar com o Poder Judiciário na busca de provas de crimes.
A avaliação foi manifestada nesta terça-feira (5/10), por especialistas no tema, durante apresentação dos resultados das iniciativas de proteção do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) à representante do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no encontro, conselheira Ivana Farina.
Integrantes de uma das entidades gestoras do Provita, a advogada da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH) Diana Melo, sugeriu que o CNJ crie um grupo de trabalho para discutir como regulamentar a mudança de identidade, um dos desafios da proteção a pessoas ameaçadas por cooperar com a Justiça. A alteração de nome é uma medida extrema para proteger as vítimas ou testemunhas de crimes que correm risco potencial de sofrer nova violência.
“Sabemos que boa parte dos casos mais graves envolvem o crime organizado. Mesmo depois dos depoimentos, sentenças e prisões dos algozes, o risco não acaba. É um tipo de violência e um risco para os defensores dos direitos humanos. A mudança de nome é um dos muitos desafios. Não há regulamentação”, afirmou a advogada da SMDH, que protege 100 pessoas de 12 estados que não tem programa próprio de proteção de testemunhas.
Agilidade
De acordo com o coordenador geral dos Programas de Proteção a Testemunha e Defensores de Direitos Humanos, do MMFDH, Douglas Sampaio Franco, proteger a integridade física de pessoas ameaçadas exige diversas providências, como a cooperação com outros órgãos públicos e até empresas. E a demora em concluir um processo de mudança de identidade pode manter pessoas até dois anos no programa – e geralmente a permanência no Provita não passa de dois meses. “Nenhuma família deseja entrar ou ficar no programa por causa do custo social que demanda.”
No Serviço de Proteção ao Depoente Especial (SPDE), por exemplo, a Polícia Federal leva a família sob ameaça para um lugar onde esteja em segurança, quando não tem como incluí-la no programa de imediato, em função da urgência e do risco envolvido. Para transferir filhos de testemunhas para uma nova escola, na localidade para onde uma família sob risco é levada, as secretarias de educação locais concordam em fazer uma matrícula secreta. “Até farmácias, pousadas e restaurantes confiáveis entram nessa rede de proteção como parceiros”, afirmou Franco.
O juiz federal e membro do Conselho Deliberativo do Programa Federal de Assistência a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, Danilo Pereira Junior, fez um apelo a magistrados e magistradas que tenham processos envolvendo uma vítima ou testemunha protegida pelo Estado. “Que nós tenhamos um olhar atento e uma visão peculiar desses processos, da necessidade de se acelerar um processo para excluir essa pessoa do processo, para melhorar a instrução desse processo dessa ação penal. Faço esse apelo de juízes. Algumas deliberações que chegam ao Conselho revelam a demora na decisão de medidas básicas, como cumprimento de pena, prestação pecuniária, por exemplo.”
Direitos humanos e democracia
A conselheira Ivana Farina destacou a importância do acompanhamento das ações de proteção do Ministério relacionadas à proteção dos direitos humanos, pois protegem tanto as pessoas mais visadas por violações dos direitos humanos, como as mulheres e a população LGBTQIA+, quanto a democracia. “Tenho ciência de que essas ações são um dever que o Estado brasileiro cumpre. Não há democracia sem direitos humanos. Os valores fundantes são os mesmos: igualdade, dignidade da pessoa humana e liberdade.”
A presidente da AMB, juíza Renata Gil, destacou o trabalho realizado pelo MMFDH, apesar do orçamento limitado, em um país violento para os mais vulneráveis, como negros, mulheres e ambientalistas. “Esse trabalho do Provita gera sentimento de segurança na sociedade e proteção de verdade. Precisamos espalhar porque as pessoas não o conhecem.”
No início de 2020, o programa atendia cerca de 500 pessoas. Desde a criação do programa, nenhuma vítima ou testemunha foi morta por quem era ameaçada. Entre os principais objetivos do Provita, estão acolher, transferir de local, proteger e reinserir socialmente testemunhas de crimes e seus familiares.
Para isso, durante um período que varia entre um e dois meses, o programa paga o aluguel da testemunha, subsidia alimentação e outras despesas ligadas à sobrevivência da família, além de ajudar no acesso a serviços públicos, como educação, saúde e assistência social. Para solicitar participação no programa, a pessoa precisa estar sendo coagida ou ameaçada porque colabora na produção de provas em uma ação penal, além de estar em dia com a Justiça criminal.
Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias