Na segunda-feira (30/11), foi dada a partida para um esforço que une todo o país. Para abrir os trabalhos da Semana Nacional de Conciliação, o Judiciário estadual mineiro trouxe uma surpresa: o projeto “Conciliação em Domicílio”, idealizado pelo oficial de justiça Luiz Antônio Braga de Oliveira, de Governador Valadares (MG). A iniciativa será testada na comarca, em formato piloto.
Esse não foi o único destaque. A programação incluiu momento cultural com um quinteto de cordas, palestras, homenagens e interação com o público por meio da internet, reforçando que o compromisso do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) com a cultura da paz passa pela criatividade, pela tecnologia e pela mudança de mentalidade.
De acordo com o presidente Gilson Soares Lemes, a tradição da beligerância resultou num volume de mais de 78 milhões de processos. Por isso, o investimento na conciliação não visa apenas a “desafogar o Judiciário, que poderia então direcionar os seus esforços para as questões mais complexas, que exigem o braço forte da lei”, mas a mudar o paradigma vigente.
“Queremos contribuir para tornar nossa sociedade menos litigante e mais disposta a dialogar. As soluções construídas pelas partes têm mais chances de pacificar os conflitos entre as partes, se comparadas àquelas impostas por decisões judiciais. Por isso, é importante que os cidadãos brasileiros assumam esse protagonismo, com autonomia e maturidade.”
Liderança
Lemes destacou que em 2020, pelo quarto ano consecutivo, o TJMG apresentou o melhor índice de conciliação entre as cortes estaduais de grande porte. Outras conquistas são a instalação do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc Virtual), que viabiliza audiências à distância, por meio de videoconferência.
“O Judiciário mineiro tem também atuado, como mediador, para o alcance de consensos históricos, chamando à mesa de negociações as partes e contribuindo para pôr fim às disputas. Ainda nos primeiros 100 dias desta gestão, intermediamos a celebração do importante acordo que definiu os parâmetros para a reabertura de bares e restaurantes durante a pandemia de covid-19, na capital mineira.”
Sobre o projeto Conciliação em Domicílio, o chefe do Judiciário mineiro afirmou que os oficiais de Justiça poderão informar as partes sobre a possibilidade da autocomposição e, se for o caso, certificar o outro lado sobre eventual proposta de conciliação. Com o apoio da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (Ejef), esses servidores passarão por curso de capacitação em conciliação e mediação.
“Se bem-sucedida, a iniciativa poderá ser expandida para outras comarcas, e o movimento da conciliação se beneficiará de todo um exército de oficiais de justiça atuando como conciliadores. Essa é apenas mais uma ação — e outras virão — que revela o empenho e o comprometimento do Poder Judiciário em incentivar, disseminar e fortalecer a mediação e a conciliação.”
Concórdia
O 3º vice-presidente e responsável pela Assessoria de Gestão de Inovação (Agin) do TJMG, desembargador Newton Teixeira Carvalho, lembrou que a Resolução 125/2010, que institui a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses, completa dez anos, em que exigiu de seus promotores paciência e sabedoria para modificar o modelo tradicional, belicoso e demorado.
O desembargador agradeceu aos representantes das instituições presentes, por sua dedicação à causa da conciliação, o que permitiu encerrar ações em tramitação por meio de acordos e, em alguns casos, até evitar a judicialização de questão. “O Judiciário deve ser o último refúgio, não o primeiro, como ocorre atualmente no Brasil.”
Ele defendeu que conciliar é uma verdadeira urgência, mas que isso deve ser feito com qualidade. “O consenso precisa ser construído democraticamente, e isso não é improvisado nem pode ser apressado, requer tempo. Por outro lado, sabemos que o processo judicial é desgastante e frustrante. Daí acreditarmos que os métodos autocompositivos devem ser difundidos perante toda a sociedade.”
O direito de ação, segundo o 3º vice-presidente, implica a solução rápida, do contrário não é efetivo. “Trata-se de apostar na cultura da paz e na proatividade, na compreensão. Quando se busca entender o outro, podemos vê-lo como um indivíduo, incentivando a escuta, enfrentando o legalismo extremado, o conservadorismo, a lógica de litígio e a burocracia habituais nas disputas judiciais para implementar uma nova postura, de cooperação.”
Comunicação pacificadora
O juiz Haroldo Dutra Dias, da comarca de Contagem (MG), discorreu sobre a necessidade de ir além de uma comunicação meramente não-violenta, conceito desenvolvido por Marshall Rosenberg, psicólogo clínico dos EUA, para chegar à “comunicação pacificadora”, que incorpora técnicas de negociação, mediação e conciliação.
O magistrado e pesquisador destacou que as emoções têm um papel importante não apenas nas interações humanas, mas também na tomada de decisões. Por isso, investir num conhecimento mais profundo e abrangente das reais motivações das pessoas, na condição de magistrado, mediador, conciliador ou mesmo na vida cotidiana, é a melhor forma de aprender a administrar a situação de conflito.
“Temos que diferenciar o pacífico do pacificador. O primeiro é o que exala paz, que emana sentimentos de serenidade, que habitualmente não cria problemas no ambiente em que está. Já o segundo é aquele capaz de desarticular a espiral do conflito, chamado justamente quando a crise se instala, ou quando o desentendimento se agrava. Ele tem que ter autocontrole, conhecimentos técnicos, habilidade para comunicação. É o sniper da paz.”
O estudioso reforçou que a missão institucional do Judiciário é levar paz à sociedade, pois não existe paz onde não há justiça. Mas, para solucionar conflitos, não basta a boa vontade, porque se trata de entrar e sair de uma situação em que as partes estão se digladiando, a fim de ajudá-las a procurar um consenso, mas sem prejulgar ou condenar. “A emoção é fisiológica; mão podemos controlar isso. Mas o comportamento, sim.”
Inovação
Diretamente do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), onde atua, o juiz André Gomma, proferiu a palestra “Novas perspectivas para a justiça consensual”. O magistrado detalhou quais inovações se tornaram concretas no acesso à Justiça ao longo dos anos. O almejado pela população deixou de ser “um mero acesso ao Poder Judiciário”, para se tornar a busca de uma solução efetiva para o conflito, por meio de uma participação apropriada por parte do Estado.
O estudioso sustentou que a autocomposição, levada à população sobretudo por meio da conciliação e da mediação, não pode mais ser considerada “uma alternativa”, mas deve ser a principal e preferencial forma de resolução dos conflitos. “Devemos tratá-la como a elementar política pública do Judiciário para a solução de conflitos.”
O magistrado acentua que hoje ainda predomina um excesso de litigiosidade no sistema de justiça. com o emprego de mecanismos que geram antagonismos entre as partes. Esse comportamento deve ser combatido com investimento em instrumentos que facilitem a pacificação entre as pessoas, pois é isso que realmente transforma a vida em comunidade e dá uma resposta satisfatória às pessoas.
“O cidadão, ao sair de um conflito, deve ter a convicção de que a melhor solução foi encontrada. Com o acordo, rompem-se alguns valores e conceitos. Entre eles, eliminar a ideia de disputa a ser vencida para controvérsia a ser resolvida, bem como a participação ativa dos operadores do Direito para um envolvimento equilibrado entre as partes.”
Homenagens
Em reconhecimento pela promoção dos meios adequados de resolução de conflitos, foram homenageados o presidente Gilson Soares Lemes; o superintendente administrativo adjunto, desembargador José Arthur Filho; a desembargadora Mariangela Meyer, 3ª vice-presidente do TJMG na gestão 2018-2020 e atual superintendente adjunta da Ejef, e o juiz José Ricardo dos Santos Freitas Véras, auxiliar da 3ª Vice-Presidência.
Receberam o reconhecimento do Judiciário estadual mineiro pela ênfase na autocomposição, ainda, o desembargador conciliador Paulo Mendes Álvares, o defensor público-geral do Estado, Gério Patrocínio Soares, o advogado-geral do Estado (AGE), Sérgio Pessoa de Paula Castro, e a vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Minas Gerais (OAB/MG), Helena Delamonica.
Também agraciados e impossibilitados de comparecer, o desembargador Nelson Missias de Morais, presidente do TJMG no biênio 2018-2020, e o procurador-geral de Justiça, Antônio Sérgio Tonet, receberão a placa enaltecendo seu trabalho pelo entendimento e pelo acordo em ocasião oportuna.
Presenças
Além do presidente Gilson Lemes, a mesa de honra reuniu o 1º vice-presidente, desembargador José Flávio de Almeida; o 2º vice-presidente, desembargador Tiago Pinto; o 3º vice-presidente, desembargador Newton Teixeira Carvalho; o corregedor-geral de justiça, desembargador Agostinho Azevedo; o vice-corregedor-geral de justiça; desembargador Edison Feital Leite; o superintendente administrativo adjunto, desembargador José Arthur Filho, o promotor de justiça Edson Ribeiro Baeta, representando o procurador-geral de justiça, Antônio Sérgio Tonet, o defensor público-geral do Estado, Gério Patrocínio, o advogado-geral do Estado, Sérgio Pessoa, a vice-presidente da OAB/MG, Helena Delamonica, magistrados, funcionários e advogados.
Compareceram à solenidade, ainda, a desembargadora Hilda Teixeira da Costa, responsável pela Justiça Restaurativa no TJMG; os desembargadores Ronaldo Claret e Henrique Abi-Ackel Torres, coordenadores, respectivamente, do Cejusc de 2º Grau e do Cejusc Virtual da Casa, o desembargador Ramom Tácio e a desembargadora Paula Cunha e Silva.
Fonte: TJMG