Cinco equipes, cada uma com cinco magistrados e três servidores do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), deram início nessa segunda-feira (2/9) a uma imersão que visa o julgamento de algumas das principais ações ambientais no âmbito das Seções Judiciárias do Tribunal Regional Federal da 1ª Região.
A imersão para o programa, que recebeu o nome de “Priorização da Jurisdição Ambiental da 1ª Região”, ocorre inicialmente sob a forma de um curso e acontece presencialmente na sede da Escola de Magistratura Federal da 1ª Região (Esmaf), em Brasília/DF. A ação foi concebida e é promovida pela Corregedoria Regional da 1ª Região (Coger) sob a condução do desembargador federal Ney Bello.
O objetivo é não só reduzir o número de processos pendentes, mas, também, fortalecer a capacidade das equipes judiciais em lidar com questões ambientais complexas, promovendo, assim, a justiça e a sustentabilidade ambiental. A ação também está alinhada com a política instituída pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) referente ao Programa Judicial de Acompanhamento do Desmatamento na Amazônia (Projada).
Na abertura do curso, na manhã de segunda-feira, 2 de setembro, o corregedor regional da Justiça Federal da 1ª Região, desembargador Ney Bello, afirmou que o projeto nasceu de uma tentativa material de resolver uma série de ações ambientais no âmbito da Amazônia Legal que estão na 1ª Região e que aguardam soluções.
Os motivos para a demora no andamento das ações são variados, como o volume de processos, complexidade das questões, ausência de materialidade e instrumentos suficientes para resolvê-las, especialmente nos casos das varas de jurisdição plena, que lidam não apenas com as questões ambientais como também com ações muito distintas.
O desembargador Ney Bello destacou, ainda, que, em uma triagem, para se conhecer o quantitativo dessas ações no âmbito da 1ª Região que necessitam de uma atenção mais precisa (para poder avançar nesses feitos com qualidade e velocidade), chegou-se a um número de quase quatro mil processos.
A ideia é que o programa, que se inicia com as questões ambientais, poderá se estender para outros temas que estão sob a competência da Justiça Federal.
O começo de uma transformação
Para participar do programa, foram convidados especialistas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), além de peritos da área ambiental que pudessem ajudar magistrados a conhecerem, de forma mais objetiva, o panorama do desmatamento no Brasil, principalmente na Amazônia Legal.
Segundo o corregedor, o objetivo com esse convite a outras instituições foi propiciar a magistrados e servidores, que lidarão diretamente com os casos, qual é o cenário real do desmatamento e porque é necessário que o Judiciário tenha uma atenção especial ao tema.
Em relação ao Projada, iniciativa do CNJ para monitorar as ações ambientais, Ney Bello citou que a 1ª Região está entre as que mais têm casos na sua jurisdição atualmente. “[O programa] é apenas uma perna do projeto. Temos um projeto específico de criação de cargos na Amazônia, cargos que nunca tivemos, como perito ambiental, perito veterinário, [entre outros], uma série de funções ambientais da Administração Pública que também fazem parte disso, bem como a criação de algumas varas específicas na área da Amazônia”, afirmou o corregedor da 1ª Região.
Entender o olhar técnico e jurisprudencial
A área técnica relacionada às perícias também terá espaço durante essa ação, contando com profissionais que ajudarão os magistrados a entenderem quais são as informações e os pontos principais que precisam verificar para compreenderem, analisarem e validarem laudos.
Conversar sobre a jurisprudência do Tribunal também será uma das frentes da ação proposta pela Corregedoria. Desembargadores criminais da Terceira Seção do Tribunal farão workshops para explicar como a Corte julga as questões, sempre com a visão de avançar na jurisprudência dessas ações. “Além de o conhecimento metajurídico, ecológico, sistêmico e ambiental, vamos ter a exposição da jurisprudência ambiental do Tribunal”, reforçou o corregedor.
Metodologia: o uso da inteligência artificial para auxiliar nas causas ambientais
O último ponto essencial para fechar a concepção do projeto foi concebê-lo para funcionar com o uso da inteligência artificial, ou seja, utilizá-la no processo de construção da decisão judicial. O que, segundo o desembargador Ney Bello, “não significa substituir o juiz”, mas utilizá-la para recolher elementos que ajudarão o magistrado a decidir.
Conjurar todas essas questões de uma maneira operativa tornou-se, enfim, a finalidade do programa, que terá 30 horas de carga horária divididas em pouco mais de uma semana.
Rafael Lima da Costa, juiz federal da 1ª Turma Recursal da Seção Judiciária do Maranhão, explicou como o uso da inteligência artificial pode auxiliar nesse programa.
“Em regra, as argumentações utilizadas são extensas, a documentação desses processos também é extensa e há laudos periciais detalhados. A inteligência artificial vai tentar analisar toda dessa densidade de informações, extrair os dados e estruturar esses dados para facilitar a compreensão das questões controvertidas, permitindo então que a equipe de trabalho possa tomar decisões amparadas em todas as informações que são organizadas com a utilização da inteligência artificial”, disse o juiz.
O juiz Rodrigo Gonçalves de Sousa, atualmente magistrado na Seção Judiciária do estado de Goiás, também atua no projeto e reforçou que o treinamento promovido pela Coger quer capacitar juízas e juízes, servidoras e servidores para uma utilização ética, segura e eficiente da inteligência artificial. “Os recursos de IA serão usados como ferramentas de apoio para magistrados e servidores, para que eles possam ter à sua disposição uma tecnologia que facilita não só na análise, mas também, na formatação de minutas e sentenças de processos considerados complexos”, acrescentou.
Também segundo o juiz em auxílio à Corregedoria Náiber Pontes de Almeida, a inclusão de um projeto de inteligência artificial aos processos de direito ambiental na 1ª Região considera o fato de que essas ações são um grande desafio para a jurisdição do Tribunal, que inclui a região Norte, a Amazônia Legal. De acordo com o juiz, a Corregedoria pensou em uma solução para que esses processos possam ser julgados de uma maneira mais eficaz, utilizando soluções tecnológicas de “primeiríssima linha”.
Por fim, a juíza federal em auxílio à Corregedoria Dayse Starlling também avaliou positivamente a evolução do projeto que partiu de uma ideia de harmonização do entendimento de magistrados e servidores e agora forma equipes para aprimorar o conhecimento em relação ao direito ambiental aplicado quanto ao uso da inteligência artificial para os processos.
“A ideia é que a gente termine aqui essa primeira rodada do projeto de priorização ambiental com vários processos já julgados, mas também com metodologia para analisar e julgar esses processos que são tão complexos”, afirmou. Por isso, concluiu a magistrada que haverá também estudos de casos com participação de juízes com experiência na questão ambiental e que já trabalharam com Amazônia Legal, como é o caso do próprio corregedor Ney Bello.
“Ampliar o treinamento para os servidores, torná-los multiplicadores desse conhecimento lá na ponta. Além disso, a gente sabe de nossas dificuldades principalmente nas áreas do interior da Amazônia, e esse curso quis priorizar os que atuam nessas localidades”, acrescentou a juíza.
A pauta ambiental é um grande desafio para o Brasil, mas especialmente para o TRF da 1ª Região, que pega aí toda a região amazônica, com suas grandes distâncias, peculiaridades, dificuldades de acesso. Então, quando a gente traz essa equipe para aprimoramento, a gente tem um grande avanço no julgamento dessas causas. E quando a gente coloca essas equipes para dialogarem com órgãos e instituições federais que estão também atuando na linha de frente, a gente ganha muito em otimizar todo esse esforço e conhecimento, porque a gente não faz nada sozinho”, pontuou.
O evento seguirá até o próximo dia 6 de setembro e ainda contará com a participação da conselheira do Conselho Nacional de Justiça Daniela Madeira e dos desembargadores federais do TRF1 Ana Carolina Roman, Pablo Zunida Dourado, além do procurador Regional Felício Pontes.