Juízes avançam em discussões no CNJ sobre assassinato de mulheres

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Magistrados de todo o País reuniram-se no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nesta quarta-feira (26/11) para discutir ações de combate à violência contra mulheres e formas de adesão ao movimento global de enfrentamento à questão. A oficina sobre feminicídio – termo que designa o assassinato de mulheres por questões de gênero – está sendo promovida pelo CNJ em parceria com a ONU Mulheres e a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM) até esta quinta-feira (27/11).

Entre 2004 e 2009, 66 mil mulheres foram assassinadas em todo o mundo, segundo levantamento da ONU Mulheres. No Brasil, que ocupa o sétimo lugar no ranking de violência de gênero em um universo de 84 países, três mil mulheres foram assassinadas apenas na última década. A cada duas horas, uma brasileira é morta. “Como muitos casos não são registrados, os números podem ser ainda maiores”, estima Joana Chagas, representante da ONU Mulheres.

Segundo ela, o enfrentamento do tema não passa apenas por questões técnicas, mas pela mudança da cultura de gênero. “O Judiciário tem papel decisivo para que mulheres façam uso do direito à Justiça e do direito à vida. Bem registrados os laudos do Instituto Médico Legal, as informações sobre as vítimas e os inquéritos policiais, o Judiciário terá mais elementos para combater esse mal, mas o sistema precisa considerar a perspectiva de gênero. É preciso vencer a falta de vontade e de interesse que faz  que os crimes fiquem impunes”, disse.

Para a coordenadora do Movimento Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar do CNJ, conselheira Ana Maria Amarante, os números que evidenciam a violência sofrida pelas mulheres devem incentivar ações concretas. “O foco é implementar políticas públicas por meio de alteração da legislação, incluindo forma qualificada de homicídio, antes mesmo da aprovação do novo Código Penal”, sugeriu. Ela referia-se ao projeto de lei que tipifica o crime de feminicídio (PLS n. 292/2013), em tramitação no Congresso Nacional.

Debate – A secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra Mulheres, Aparecida Gonçalves, destacou que o Executivo deve ser chamado a opinar sobre o projeto, e ponderou que é melhor debater o tema previamente com a magistratura para evitar uma “lei morta” no País. “Trocar homicídio por feminicídio não é questão de linguagem. Não é só um projeto de lei. Não é debate de homens e mulheres, não é guerra dos sexos, é a discussão de um país livre”, pontuou. Ela também destacou a necessidade de um sistema integrado de dados sobre violência de gênero e de envolvimento de empresas na superação de estereótipos negativos relativos às mulheres.

Para o conselheiro Guilherme Calmon, do CNJ, a Lei Maria da Penha (n. 11.340/2006) avançou no enfrentamento à discriminação de gênero, mas ainda é insuficiente. “Apesar da sua vigência há quase nove anos, ela ainda se ressente de algumas medidas legislativas e jurisdicionais que merecem mais atenção”, disse. O conselheiro também informou que os tribunais brasileiros vão começar a identificar os casos de feminicídio a partir deste ano.

A representante do Instituto de Direito Público, Soraia Mendes, acredita que a violência contra mulheres justifica intervenção do Estado para evitar um sistema androcêntrico (focado no sexo masculino). “Aparentemente, ainda está no imaginário que existe uma honra a ser defendida, mas não existe crime passional; existe violência de gênero. Não tem possibilidade de que amor provoque violência”, argumentou.

Ao apresentar diversos dados sobre feminicídio, a especialista em violência contra a mulher Fernanda Matsuda, do Instituto Patrícia Galvão, destacou que ainda é difícil acessar informações sobre o assunto. Elisa Colares, da Secretaria de Políticas para as Mulheres, informou que o número de ocorrências registradas pela imprensa brasileira envolvendo violência de gênero é muito maior em comparação com outras partes do mundo.

Protocolo – Consultora da ONU Mulheres, Wania Pasinato falou sobre o Protocolo de Atuação para Investigação dos Crimes de Feminicídio na América Latina, concluído pela instituição em agosto de 2014 após dois anos de trabalho com diversas organizações internacionais. O documento está sendo adaptado à realidade brasileira, e a realização da oficina com magistrados no CNJ pretende colaborar com este objetivo. Dos 25 países com taxas altas ou muito altas de violência contra a mulher, 14 são da América Latina.
 
“É um trabalho multidisciplinar. Não é um documento genérico, mas uma ferramenta prática, destinada a ajudar os operadores de Justiça”, explicou Pasinato. Segundo a consultora, o documento quer oferecer diretrizes e não pretende substituir as regras já existentes no País. “O trabalho com o protocolo pode ocorrer independentemente de existir tipo penal do feminicídio na nossa legislação”, informou, conclamando magistrados a participarem da discussão do texto.
 
Débora Zampier
Agência CNJ de Notícias