Um dos princípios mais importantes do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é o direito da convivência familiar e comunitária com dignidade. Em função disso, foi criado o Dia Nacional da Adoção, celebrado anualmente em 25 de maio. A data dá maior visibilidade ao tema, incentiva a adoção no Brasil e promove a conscientização do público, esclarecendo mitos sobre a questão.
Nos últimos três anos, o Paraná registrou cerca de 1,5 mil adoções regulamentadas de crianças e adolescentes. Entretanto, ainda são mais de 400 crianças e adolescentes esperando uma nova família, ao passo que há 2,3 mil pretendentes no estado. A discrepância entre esses números acontece porque a maioria das crianças e adolescentes não se encaixa no perfil mais procurado pelas pessoas interessadas em adotar. Por exemplo, no Paraná, 76% das crianças possuem mais de 6 anos, apenas 40% não têm irmãos e mais da metade não é branca, conforme dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA).
Como explica o presidente da Comissão Estadual Judiciária de Adoção (CEJA) do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), desembargador Fabian Schweitzer, ainda há um estigma sobre a adoção tardia. “O brasileiro ainda não é tão bem preparado para adotar essas crianças de faixa etária maior. Eles acham que os adolescentes já vêm com vícios, que são ‘formadas no errado’ e que corrigir será mais difícil. Isso é uma total inverdade, essas crianças vêm com um rombo no peito. Só o que elas querem é entrar numa família e sentir amadas.”
Outro ponto que se busca desmistificar é que o foco não deve ser as pessoas pretendentes, mas sim as crianças. “A adoção, por muitos séculos, sempre foi vista como sendo um direito dos adultos e não das crianças. E isso mudou. Hoje, nós não estamos preocupados com o número de pretendentes habilitados para a adoção que ainda não adotaram, mas nós devemos estar preocupados se nós tivermos uma criança em instituição”, afirma o juiz substituto em segundo grau Sérgio Kreuz, que atua em câmara especializada em matéria da infância e juventude.
“A adoção está voltada a atender o direito da criança e do adolescente que está acolhido. Toda criança e todo adolescente, de acordo com o artigo 227 da Constituição Federal, tem o direito fundamental de crescer em um ambiente familiar. Abrigo não é lugar de criança. O papel do Judiciário é justamente esse: assegurar esse direito fundamental de que toda criança e todo adolescente têm de ter uma família”, acrescenta o magistrado.
Processo de adoção
As pessoas interessadas precisam passar por um processo para estarem habilitadas a adotar uma criança ou adolescente. “Ao contrário do que muitas vezes se propaga, o processo de habilitação para adoção é bastante simples”, explica Kreuz. Além disso, não há discriminação em relação ao perfil do pretendente: “Pode ser um casal, uma pessoa solteira, um casal heteroafetivo, homoafetivo, isso não interessa.”
Primeiro, é preciso procurar uma Vara da Infância e da Juventude da sua cidade, onde serão repassadas informações sobre os documentos que devem ser apresentados, não havendo necessidade de representante legal. Em seguida, é formalizado o pedido, junto com a documentação, e aberto o processo de habilitação para adoção. Os autos são encaminhados para a análise do Ministério Público e para uma equipe técnica, que visitará o lar da futura família para avaliar o ambiente. Por fim, o processo retorna ao Ministério Público, para dar um parecer, e ao Tribunal para que o juiz dê a sentença declarando a pessoa apta para a adoção.
Antes de concluído o processo, é necessário que pretendentes realizem um curso de preparação para a adoção. No TJPR, essa formação é fornecida periodicamente por meio da Escola Judicial do Paraná. Após estar devidamente habilitado, a pessoa será inscrita no SNA e poderá adotar em qualquer local do Brasil.
Além da adoção, outras formas de propiciar uma vida melhor para as crianças e adolescentes que estão em entidades de acolhimento são o apadrinhamento o acolhimento familiar. “Esse apadrinhamento pode se dar na forma de prestar uma contribuição financeira; a prestar um serviço, como por exemplo um médico ou um dentista que muitas vezes prestam esse tipo de serviço; ou até mesmo um apadrinhamento afetivo”, esclarece Sérgio Kreuz.
No apadrinhamento afetivo, a pessoa passa por uma capacitação para poder conviver com a criança ou adolescente fora da entidade de acolhimento. É possível passar uma tarde, final de semana ou até mesmo viajar, desde que haja autorização judicial. O apadrinhamento pode, inclusive, continuar mesmo após o adolescente deixar a instituição.
Por meio do acolhimento familiar, a pessoa irá receber a criança por um determinado período de tempo, enquanto a Justiça define se ela irá retornar para a família de origem ou se será encaminhada para adoção. Quem tiver interesse, deve buscar o serviço de acolhimento familiar da cidade, se inscrever e realizar uma capacitação.
Projetos
Para garantir o bem-estar de quem vive em entidades de acolhimento, estimular a adoção e preparar pretendentes, diversos projetos são realizados durante todo o ano no âmbito do TJPR. Uma iniciativa de destaque é o aplicativo A.DOT, uma plataforma digital que possui o objetivo de encontrar famílias para crianças e adolescentes que se encontram aptas para adoção, mas que não foram localizados interessados em os adotar. O foco principal é encontrar um lar para crianças maiores de oito anos, adolescentes, grupos de irmãos e acolhidos com deficiência ou problemas de saúde.
O aplicativo foi lançado em 2018. Seu funcionamento é simples: os órgãos responsáveis cadastram o perfil das crianças com um vídeo de apresentação e pretendentes habilitados podem acessar o conteúdo. Até o momento, o A.DOT, que já é utilizado por nove estados, possibilitou 56 adoções. No momento, são cerca de 650 crianças e adolescentes cadastrados na plataforma e mais de 10 mil acessos ativos, entre pretendentes e grupos de apoio à adoção.
Outra importante conquista foi a inclusão do A.DOT como uma fase de consulta para a adoção. Com isso, o juiz irá fazer a busca por pretendentes, primeiro, na comarca, depois no A.DOT e, por último, no SNA. “Se o juiz não possuía na comarca alguém interessado em adoção, ele ia consultar direto o Sistema Nacional de Adoção, não tinha o A.DOT”, explica o desembargador Fabian Schweitzer.
E, dentro do TJPR, o processo de busca por uma família não para no SNA. Criada em 1989 e pioneira no Brasil, a CEJA, além de ser responsável pelo gerenciamento do A.DOT, possui o fim de garantir a consolidação e a eficiência das adoções internacionais. “Se não tem no Sistema Nacional algum interessado no Brasil inteiro, o certo é mandar para a adoção internacional, e não ficar parado, e não deixar no abrigo. Porque cada dia que passa na vida dessas crianças, o tempo que passa, é inimigo da sorte”, pondera Schweitzer.
Graças a esse trabalho, o Judiciário paranaense possibilitou a adoção internacional de 51 crianças e adolescentes brasileiros nos últimos quatro anos. Está prevista, ainda, a adoção por famílias estrangeiras de, pelo menos, mais dois grupos de cinco irmãos para este ano. Para aperfeiçoar esse sistema de adoção internacional e aprimorar os procedimentos para a busca de pretendentes estrangeiros, foi criado, também, o Canal CEJA Busca Ativa. Os encontros com convidados e magistrados e servidores das Varas da Infância e Juventude possibilita a desmistificação da adoção internacional, por meio do detalhamento do seu funcionamento e de sua segurança jurídica.
Além disso, o site do TJPR possui um Banco de Boas Práticas e Projetos desenvolvidos dentro do Judiciário paranaense voltados à Infância e Juventude. Lá é possível encontrar outras iniciativas que buscam promover a adoção, como o Adoção Segura da comarca de Maringá; o Vidas que se Encontram, que contou com a parceria da Vara da Infância e da Juventude de Curitiba; e o Projeto de Intervenção com ênfase na Adoção Tardia da CIJ.
Ainda, em razão da data, o Tribunal paranaense realizou algumas ações especiais, como projeções com informações sobre adoção no Palácio da Justiça em Curitiba; divulgação de posts sobre o tema nas mídias sociais da Justiça paranaense (Instagram, Facebook e Twitter); e adesão à Campanha #AdotarÉAmor 2022 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Fonte: TJPR