Uma ferramenta para mensurar o acesso à Justiça pela população brasileira, o Índice de Acesso à Justiça (IAJ) foi lançado nesta segunda-feira (22/2) durante o segundo painel do webinário II Democratizando o Acesso à Justiça: Justiça Social e Poder Judiciário no Século XXI. O levantamento foi feito pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). A diretora-executiva do Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ) do CNJ, Gabriela Moreira de Azevedo, falou sobre o ineditismo da publicação: “É a primeira vez que temos um índice de acesso à Justiça feito pelo Poder Judiciário. Isso não existia antes. Esse índice traz componentes da população de desigualdade social”.
Acesse aqui a íntegra do levantamento.
O estudo se propõe a construir um índice de acesso à justiça por meio dos 89 tribunais existentes no Brasil, nos cinco segmentos de Justiça, incluindo ainda, três tribunais superiores. Três tipos de capital simbólico são integrados para a construção do indicador: Capital Humano (Cidadania), Capital Humano (População) e Capital Institucional (Judiciário). Cada um dos capitais contém diferentes dimensões, sendo o reconhecimento de direitos e deveres, vulnerabilidade e acesso a serviços públicos, as dimensões do Capital Humano (Cidadania); o Capital Humano (População), por sua vez, apresenta uma única dimensão, que engloba o perfil da população e sua dinâmica demográfica; por fim, o padrão de resolução de conflitos, a distribuição e o acesso a serviços públicos e a inovação tecnológica são dimensões do Capital Institucional (Judiciário).
“É um índice muito completo, que traz várias dimensões sociais e do Judiciário com intuito de mostrar onde há mais acesso e onde há menos acesso à Justiça”, disse Gabriela. No eixo Cidadania, por exemplo, estão aspectos como analfabetismo, os nascidos vivos de mães entre 10 e 19 anos de idade, o déficit de altura e peso para a idade e os domicílios com água canalizada. No eixo População, leva-se em consideração a proporção de mulheres, de idosos e de cor não branca em relação ao total da população, desigualdade de renda (Coeficiente de Gini) e a taxa de escolarização. E no eixo Judiciário, há o tempo médio da decisão, a taxa de magistrados e de unidades por habitantes e os casos novos de 1º grau por 100 mil habitantes.
De acordo com o relatório, os dez estados com menores índices de acesso estão todos na região Norte e Nordeste. Por sua vez, nas Justiças Estadual, Eleitoral, Trabalho e Federal, observa-se um padrão nos resultados: os maiores Índices de Acesso à Justiça correspondem aos tribunais das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, salvo algumas exceções, a exemplo do TJPA, TJPE, TJCE, TRE/RO, TRE/PE e TRE/TO. “Isso mostra de fato o impacto da desigualdade social do Brasil no acesso à Justiça”, afirmou.
Outras pesquisas
A diretora do DPJ/CNJ também apresentou o que o Poder Judiciário está fazendo em relação às pesquisas e levantamento de dados com recorte mais focado para o racial. “As pesquisas empíricas em questões raciais são difíceis, porque hoje a gente verifica que nem todos os tribunais têm registros administrativos adequados; os processos judiciais, mesmo sendo eletrônico, não têm o componente cor/raça; e, mesmo dentro do Poder Judiciário, o cadastro de magistrados, servidores, terceirizados e estagiários nem sempre existe”, elencou.
Gabriela apresentou dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre desigualdades raciais por cor ou raça no Brasil, que apontam que 29,9% dos cargos gerenciais são ocupados por negros/pardos; a taxa de analfabetismo é 2,3 vezes mais frequente entre os negros/pardos; negros/pardos representam 2,4 vezes mais frequente abaixo da linha da pobreza (inferior a US$ 1,90/dia); e os negros/pardos estão quase 3 vezes mais frequente entre as vítimas de homicídio. O CNJ está em processo de levantar os dados para insumo de elaboração de políticas públicas.
Entre as atividades em andamento, além da criação do Índice de Acesso à Justiça, estão: uma pesquisa sobre aplicação da Resolução 230/2016, que é uma demanda do GT de questões raciais, coordenado pela conselheira Flávia Pessoa; a atualização do estudo de cotas raciais e do levantamento do número de negros em bancas de concurso; além do aprimoramento das Tabelas Processuais Unificadas (TPUs), com a inclusão, na última versão das tabelas (fevereiro/2021), da separação de injúria por preconceito, abarcando o preconceito por condição de pessoa idosa, condição de pessoa com deficiência, cor, etnia, identidade de gênero, orientação sexual, origem e raça.
Ainda nesse âmbito, a diretora anunciou uma pesquisa, ainda a ser lançada, sobre influências recíprocas entre a imprensa jornalística e digital e o Sistema de Justiça, realizada pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP).
Ao final, a conselheira Flávia Pessoa, que conduzia o evento, enalteceu a importância do Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ). “É um órgão criado por lei, não é apenas um órgão interno do CNJ, para subsidiar as políticas públicas que são tratadas no nosso dia a dia. Por isso é fundamental sempre termos esse olhar para as pesquisas.”
Justiça Social e Poder Judiciário
O II Democratizando o Acesso à Justiça: Justiça Social e Poder Judiciário no Século XXI, que foi realizado durante todo o dia, buscou debater sobre ações que visem à democratização do acesso à Justiça e projetos destinados ao combate da discriminação, do preconceito e de outras expressões da desigualdade de raça, gênero, condição física, orientação sexual, religiosa e de outros valores ou direitos protegidos ou que comprometam os ideais defendidos pela Constituição Federal de 1988.
Carolina Lobo
Agência CNJ de Notícias