Ações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para reduzir desequilíbrios na busca pela igualdade de gênero e medidas que reconhecem e ampliam a participação das mulheres na magistratura e no Judiciário foram apresentadas na quarta-feira (10/3) pela conselheira Ivana Farina Navarrete Pena no IV Seminário Mulher, Poder e Democracia, realizado pelo Centro Cultural Justiça Federal (CCJF). O evento, realizado em meio virtual, debateu a situação feminina em diversos segmentos como na política, no Judiciário, na ciência e na cultura.
Uma das medidas mais recentes foi a aprovação pelo CNJ, em fevereiro, de resolução que torna obrigatória a distinção de gênero no Poder Judiciário. A norma engloba as carteiras de identidades funcionais, documentos oficiais e placas de identificação de setores, entre outros. Na prática, a determinação demarca a necessária flexão de gênero nas referências aos cargos de desembargadores e desembargadoras, juízes e juízas, magistrados e magistradas, servidores e servidoras no âmbito do Judiciário, rompendo com uma prática culturalmente estabelecida .
“O uso do chamado ‘masculino neutro’, que de neutro não tem nada, pois é utilizado em referência a poder mesmo, a autoritarismo/machismo , o que é fruto da cultura. Eu sou conselheira, não ocupo cargo de conselheiro, e as mulheres são magistradas, assim como os homens são magistrados. Será que algum magistrado receberia uma carteira funcional com sua definição de cargo como desembargadora? E vejam: isso não é desprezível. Ao contrário, a questão é tema relevante, traduz prática que vem da cultura do patriarcado e é um absurdo que ainda fosse mantida e, felizmente, o CNJ tratou de quebrar”, disse Ivana Farina.
Participação na magistratura
A conselheira é supervisora do grupo de trabalho formado no CNJ para estudar e analisar cenários, propor eventos de capacitação e promover o diálogo com os tribunais sobre o cumprimento da política nacional de incentivo a participação institucional feminina no Poder Judiciário. O trabalho partiu da percepção de que a participação das mulheres na magistratura é de 33%. Para verificar os motivos para o percentual baixo, foram analisados os processos seletivos de ingresso na magistratura e a composição das bancas examinadoras e das comissões responsáveis pelos concursos públicos: 30% das bancas formadas nos últimos 10 anos não possuíam mulheres em sua composição.
Com este cenário, o Conselho passou a recomendar aos tribunais que passem a observar a composição paritária na formação das comissões organizadoras e nas bancas examinadoras de concursos públicos para ingresso na magistratura. Outra iniciativa em curso é a atuação do CNJ em apoio à Agenda 2030 das Organizações Unidas. Entre as metas a serem buscadas está o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) nº 5, de igualdade de gênero.
Combate à violência
Ao expor as medidas que vem sendo adotadas na busca por maior igualdade de gênero, a conselheira abordou retrocessos ocorridos durante a pandemia como o aumento da violência contra as mulheres e a redução da participação feminina no mercado de trabalho e em postos de gerência e comando.
Dados do IBGE citados por ela mostram que a participação de mulheres em cargos gerenciais, que chegou a 38% em 2012, caiu 6 pontos percentuais nos últimos anos e tende a retroceder mais durante a pandemia. “A explicação que se dá a isso é que, em momentos de crise como o atual, o mercado tende a segregar mais. E quem está sendo mais segregado? As parcelas que tradicionalmente são as mais segregadas”, chamou atenção.
Ao abordar os desafios, ela indicou caminhos. Sobre outras ações em análise no CNJ, a conselheira informou que coordena um grupo que debate a adoção de um protocolo de julgamento com a perspectiva de gênero e que o tema está em discussão diante da necessidade de aprimoramentos nos julgamentos de crimes bárbaros praticados contra mulheres.
Ivana Farina comentou também que é preciso romper as barreiras visíveis e invisíveis que são obstáculos à igualdade entre homens e mulheres no Brasil, incluindo na magistratura, fazendo prevalecer os fundamentos da cidadania, dignidade e igualdade do Estado Democrático de Direito. “No Estado Democrático de Direito, a prevalência é a da lei e não da força e do abuso”, disse.
A palestra no IV Seminário Mulher, Poder e Democracia contou também com a participação da professora de História pela USP Maria Augusta de Castilho. Ela fez um breve retrospecto do impacto da sociedade patriarcal, lembrando rotinas determinadas pelos ditames masculinos e casos em que as mulheres saíam à rua três vezes. “Para serem batizadas, para casar e para serem enterradas”. Resquícios desses tempos ainda subsistem e se refletem nos indicadores de violência contra o sexo feminino.
Luciana Otoni
Agência CNJ de Notícias