“Um país que não protege sua infância e sua juventude está fadado ao fracasso social e ao subdesenvolvimento humano”, declarou o presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Luiz Fux, durante a abertura do evento “O Poder Judiciário na Qualificação do Atendimento Socioeducativo”, nessa quarta-feira (8/9). “Essa proteção envolve garantir oportunidades a todas as crianças e jovens, em garantias que igualmente se estendem aos adolescentes autores de ato infracional e àqueles em restrição e privação de liberdade, demandando ação integrada entre todos os Poderes, numa verdadeira política de Estado.”
O encontro, que segue até esta sexta-feira (10/9), é dividido em duas etapas. Durante a abertura, cerca de 400 pessoas acompanharam o lançamento de dois manuais sobre temas que permitem a operacionalização do princípio da capacidade taxativa estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no HC 143.988 – as centrais de vagas e as audiências concentradas.
Na decisão, o STF limitou o ingresso nas unidades socioeducativas de internação ao patamar máximo de 100% de sua capacidade, índice que passou a ser válido para todo o território nacional. “A decisão se tornou referência na garantia da dignidade humana dos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa, reconhecendo a necessidade de extinção definitiva da superlotação desses estabelecimentos”, pontuou Luiz Fux.
O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Sérgio Luíz Kukina, ressaltou a necessidade de cooperação entre todas as entidades e instituições que atuam no tema, “de modo que estejam engajadas em qualificar o cumprimento da medida de internação segundo os parâmetros da brevidade, excepcionalidade e condição peculiar de desenvolvimento dessa população”.
Foi o que também destacou a representante-residente do Escritório do Pnud no Brasil, Katyna Argueta. “Instituições que oferecem um atendimento qualificado para a garantia de direitos desde o primeiro ato processual contribuem para construção de trajetórias de inserção desses indivíduos na sociedade e alcançam os melhores resultados.”
A segunda parte da programação é dedicada à formação de magistrados e magistradas, equipes multidisciplinares, Defensoria Pública, Ministério Público e Poder Executivo de todas as regiões do país. O evento integra as atividades do programa Fazendo Justiça – parceria entre o CNJ e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) que incide em desafios estruturais da privação e restrição de liberdade.
Ações concretas
Durante o encontro, o ministro Fux destacou que o Fazendo Justiça vem propondo ações concretas para enfrentar a superlotação em unidades socioeducativas. “A Resolução CNJ n. 367 propôs o estabelecimento de diretrizes e normas gerais para a criação da central de vagas do sistema estadual de atendimento socioeducativo, no âmbito do Poder Judiciário, enquanto a Recomendação CNJ n. 98 orienta tribunais e autoridades judiciais quanto à realização de audiências concentradas para reavaliar as medidas socioeducativas de internação e semiliberdade.”
As normativas são o referencial para os dois manuais temáticos lançados no evento. O Manual Resolução CNJ 367/2021 – A Central de Vagas do Sistema Estadual de Atendimento Socioeducativo aponta como os poderes públicos locais podem criar centrais de vagas e colocá-las em funcionamento. O serviço é responsável por gerir as vagas das unidades socioeducativas de internação, semiliberdade e internação provisória, em conformidade com o limite máximo de ocupação, e já está em funcionamento em diversos estados.
Já o Manual sobre Audiências Concentradas para Reavaliação das Medidas Socioeducativas e de Semiliberdade e Internação tem como objetivo auxiliar autoridades judiciais na implementação, preparação, realização e monitoramento das audiências concentradas com foco na reavaliação das medidas socioeducativas de semiliberdade e internação, conforme estabelece a Recomendação CNJ n. 98/2021.
“A publicação desses produtos de conhecimento compõe um conjunto de iniciativas do programa Fazendo Justiça voltadas a fortalecer ações em todo o ciclo da justiça juvenil, tendo como perspectiva qualificar as portas de entrada e de saída do sistema, aprimorando, assim, o atendimento socioeducativo no país”, destacou o juiz auxiliar da Presidência do CNJ no Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Prisional e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF/CNJ), Antonio Tavares.
Atividades formativas
O painel “O papel do Poder Judiciário na qualificação do atendimento socioeducativo” abordou a importância da decisão do HC 143.988 para a qualificação da porta de entrada e do aprimoramento da qualidade do atendimento socioeducativo. O diálogo reuniu a juíza Suzana Massako Hirama, auxiliar do ministro do STF Edson Fachin, relator do HC 143.988; e o membro do Comitê dos Direitos Humanos da ONU Luis Pederneira.
Além do histórico do HC, o painel apresentou critérios e parâmetros a serem observados pelas unidades de privação de liberdade a partir da decisão, bem como impactos da liminar e do julgamento. O diálogo também colocou em destaque as diretrizes da Convenção sobre os Direitos da Criança, ratificada por 196 países, incluindo o Brasil, e a Observação Geral Nº 24 do Comitê dos Direitos das Crianças das Nações Unidas. Aspectos como idade mínima para a responsabilização pela justiça juvenil, impactos de medidas de privação de liberdade prolongadas e mecanismos não centralizados de justiça estiveram entre os temas abordados.
Nesta quinta-feira (9/9), a programação reúne especialistas para debater o princípio numerus clausus e o controle da lotação das unidades socioeducativas, bem como o serviço da central de vagas a partir da experiência de estados que já o implementam. A programação se encerra amanhã, com painel sobre a Recomendação CNJ n. 98/2021 e sobre audiências concentradas e suas experiências práticas.
A atividade conta com certificação do CNJ, emitida mediante inscrição cujo link é disponibilizado na descrição dos eventos durante a transmissão no YouTube.
Marília Mundim
Agência CNJ de Notícias
Reveja o primeiro dia do evento no canal do CNJ no YouTube