Em uma tarde repleta de significado, o Poder Judiciário tocantinense, por meio da Comissão Permanente de Acessibilidade e Inclusão e em parceria com a Escola Superior da Magistratura Tocantinense (Esmat), promoveu nessa segunda-feira (2/12), no auditório do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins (TJTO), um evento marcante para celebrar a inclusão e a acessibilidade. A ação, alinhada à celebração do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência (3 de dezembro), ofereceu reflexões profundas e experiências práticas sobre diversidade e inclusão no ambiente corporativo.
A abertura foi conduzida pelo desembargador Pedro Nelson de Miranda Coutinho, presidente da Comissão Permanente de Acessibilidade e Inclusão, que ressaltou o valor da escuta ativa na construção de políticas inclusivas. “Nenhum tema poderia ser mais relevante este ano, pois foi escolhido por meio da escuta de pessoas com deficiência e distintas. Um verdadeiro ato de respeito às diversidades das deficiências”, afirmou.
Ele também mencionou a Lei nº 14.992, de 2024, que visa ampliar a inclusão de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no mercado de trabalho, reforçando que a inclusão começa na base.
“Sabemos que a inclusão deve iniciar bem antes disso, por meio de acesso à educação inclusiva e aos serviços de saúde, garantindo o atendimento integral das necessidades das pessoas com deficiência para que elas possam se desenvolver com dignidade e ingressar com decência no mercado de trabalho”, comentou.
O desembargador Marco Villas Boas, diretor geral da Esmat, exaltou a relevância das capacitações para a sensibilização.
“Capacitar pessoas para promover a inclusão é um passo fundamental, pois o conhecimento transforma não apenas as práticas, mas também os corações. Estamos aqui para reafirmar que acessibilidade e diversidade não são apenas valores, mas também direitos essenciais que fortalecem a democracia e a justiça”, destacou.
Já a desembargadora Maysa Vendramini Rosal, corregedora-geral da Justiça e presidente eleita do TJTO, enfatizou que a “acessibilidade vai além da adequação física dos espaços. Envolve a promoção de uma cultura inclusiva que permita que todas as pessoas estejam inseridas e se sintam parte do processo”.
Palestra e Café Sensorial
A palestra, conduzida por Marcelo Pires, CEO da Consolidar Diversidade nos Negócios, ofereceu uma reflexão crítica sobre capacitismo e práticas empresariais que tratam a inclusão de forma superficial. “A razão e a importância de a gente se relacionar como gente é entender de gente”, provocou Marcelo, reforçando que valores virtuosos são os que conectam a humanidade.
Moderada pela juíza do trabalho Suzidarly Ribeiro Teixeira Fernandes (TRT-10), a palestra também destacou a responsabilidade de as empresas promoverem a inclusão por convicção, e não por obrigação legal. “Que você [Marcelo] consiga sensibilizar mais e mais empresários para que contratem pessoas com deficiência, não só para não serem multados ou processados, mas também porque enxergam no outro o ser humano, e não a sua deficiência”, afirmou a magistrada.
Após a palestra, Marcelo conduziu o Café Sensorial, uma experiência interativa que convidou os participantes a vivenciar, por alguns minutos, situações que simulavam alguns dos desafios enfrentados por pessoas com deficiência, promovendo reflexões sobre empatia e comunicação inclusiva. A dinâmica envolveu vendar parte do grupo e, em outra parte, restringir a entrada de som por meio de fones.
Enquanto os participantes relataram experiências transformadoras, pessoas com deficiência compartilharam vivências em que destacaram a relevância de práticas inclusivas. Michele Veras, estudante de Direito da Universidade Federal do Tocantins (UFT), que tem baixa visão, e Poliana Ferreira, ou Polly, como prefere ser chamada, acadêmica de Jornalismo e cega devido ao glaucoma, atuaram como assistentes durante a atividade. Ambas destacaram o impacto da inversão de papéis, ao ajudar pessoas sem deficiência a enfrentarem, de forma simulada, desafios relacionados à deficiência visual. “As pessoas não explicam o que estão entregando, apenas dão e fica por isso mesmo”, observou Polly.
Para Michele, momentos como este reforçam a necessidade de sensibilização contínua. “É desafiador conduzir uma pessoa com deficiência, mesmo para nós que temos deficiência. Eu trabalho com eventos inclusivos e ainda encontro dificuldades nessa condução. Isso reflete como a sociedade ainda não está preparada para lidar com essas questões”, afirmou.
Dinalva Tavares, servidora do Centro de Apoio Pedagógico para Atendimento à Pessoa com Deficiência Visual do Tocantins, que é cega, considerou a experiência tranquila no que diz respeito à alimentação. Já Leidimar Bastos, também servidora do CAP, que participou com os olhos vendados, identificou a ausência de comunicação como o maior obstáculo. “Para mim foi tranquilo, porque já trabalho com isso e convivo muito com a Dinalva. O que não foi tranquilo foi o fato de alguém me entregar um copo, colocar na minha mão sem explicar o que era. Eu simplesmente comi. Mas o que mais observei é que muitas pessoas não estão preparadas para lidar com isso; algumas ficaram perdidas, sem orientação”, refletiu Leidimar.
Mesa-Redonda
A mesa-redonda “Além das Barreiras” reuniu vozes de profissionais com deficiência, como Pedro Henrique Nunes, Agnaldo Quintino e Marques Elex, que compartilharam os desafios e as oportunidades enfrentadas no mercado de trabalho. Foi um espaço rico de trocas, onde experiências pessoais revisitaram questões urgentes sobre inclusão e acessibilidade.
“Tão importante, ou até mais importante do que a acessibilidade, é a boa vontade das pessoas que nos cercam, visto que o leque de tipos de deficiência é infinito, com necessidades diversas, é difícil conseguir uma acessibilidade perfeita”, apontou Pedro Henrique.
Marques Elex afirmou que nutre o desejo de ver o capacitismo relegado ao passado e a invisibilidade sendo rompida por uma inclusão plena e eficaz. “Assim como Martin Luther King alimentava um sonho, eu também alimento um sonho: que o capacitismo seja lançado nos porões do passado, e a capa da invisibilidade seja despedaçada pela inclusão plena e efetiva, que essa batalha seja vencida por todos nós que acreditamos nela”, revelou.
Já Agnaldo Quintino destacou o evento como um marco histórico.
“Hoje é um dia histórico, eu com 51 anos de idade nunca vi um evento composto só por pessoas com deficiências. É um avanço, o Tocantins está avançando”, mencionou.
Durante a condução da mesa, Eva Portugal compartilhou experiências pessoais de sua rotina como cadeirante, destacando a universalidade da acessibilidade. “A acessibilidade é para todos. Em qualquer momento da vida, podemos precisar dela,” afirmou, trazendo à reflexão a importância de estruturas inclusivas em todos os âmbitos sociais.
Já a coordenadora da mesa, Patrícia Idehara, sublinhou um dos principais propósitos do evento: provocar uma mudança de mentalidade em relação às contratações tanto no setor público quanto no privado. “O objetivo é dar um ‘start’ na virada de chave, mostrando que o assistencialismo deve ser a última alternativa. É preciso desmistificar a ideia de que a pessoa com deficiência não é eficiente. Elas têm o direito à dignidade de serem produtivas, de comprar, vender, recolher impostos e fazer a economia girar”, ressaltou.
Lançamento do Dia “D” da Empregabilidade
O evento possibilitou outro momento significativo: o lançamento do Dia “D” da Empregabilidade da Pessoa com Deficiência, coordenado pelo Sistema Nacional de Emprego (SINE) e pela Secretaria de Estado do Trabalho e Desenvolvimento Social (Setas). O diretor do Trabalho da Setas, Kleber Wessel, destacou que todos os doze postos do SINE no Tocantins serão mobilizados para atender pessoas com deficiência de forma mais inclusiva.
“Nossa intenção é triplicar o número de vagas destinadas às pessoas com deficiência, promovendo uma semana de conscientização e sensibilização que vá além do mercado de trabalho, alcançando também a inclusão plena na sociedade. Este evento do Tribunal de Justiça foi uma grande fonte de aprendizado. Saio daqui com mais informação, mais consciência e ainda mais motivado para desenvolver esta iniciativa”, afirmou Wessel, reforçando a capacidade das pessoas com deficiência, que descreveu como “verdadeiros super-humanos”.
Fonte: TJTO