Estudo revela realidade e desafios dos Juizados Especiais

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Pesquisa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre o funcionamento dos juizados especiais revelou que o tempo médio de tramitação de um processo nessas unidades da Justiça Estadual é quase dois anos menor que a tramitação dos demais processos de 1º Grau. As ações terminam, em média, após um ano e seis meses de tramitação, enquanto casos levados à Justiça comum duram, em média, três anos e sete meses. Esse é apenas um dos dados revelados no Diagnóstico dos Juizados Especiais, apresentado na quinta-feira (13/8) durante o “Seminário Digital 25 Anos de Juizados Especiais – Diagnósticos e Perspectivas”, promovido pelo CNJ.

Acesse a publicação na íntegra

“Desde que foram institucionalmente criados pela Lei nº 9.099/95, há 25 anos, os juizados especiais tornaram-se a face mais cidadã da Justiça, uma vez que garantem a solução de conflitos de maneira mais rápida e simples”, diz a diretora do Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ) do CNJ, Gabriela Moreira de Azevedo Soares, que apresentou o trabalho. Somente em 2019, entraram por essa porta mais de 7 milhões de processos, sejam de competência cível, criminal ou previdenciária.

O estudo foi respondido por 60% dos juizados especiais estaduais (2.220) e 66% dos federais (389), de um universo de 3.727 (Justiça Estadual) e 590 (Justiça Federal). A pesquisa revelou que essas unidades têm sido cada vez mais demandadas ao longo dos anos, e conseguem grau de solução superior aos da justiça comum.

A série histórica, apontada no diagnóstico, revelou que o número de casos novos aumentou, assim como o de processos baixados e sentenças.  O número de processos pendentes, ou seja, do acervo, caiu no comparativo de 2015 e 2019.

Aumento expressivo

O diagnóstico revelou aumento expressivo no índice de conciliação nos juizados especiais federais em 2019, que alcançou 18% (em 2015, era de apenas 8%). Dessa forma, essas unidades passam a se aproximar dos patamares encontrados nos estaduais — que, em 2015 era de 18%, e em 2019 chegou a 21%. Para a presidente do Fórum Nacional dos Juizados Especiais (Fonaje), desembargadora do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) Janice Goulart Garcia Ubialli, esses números podem melhorar se houver aprimoramento nas condições de oferecimento do acesso à justiça nessas unidades.

“Muitas dificuldades enfrentadas pelos juizados estão estampadas nessa tomografia feita pelo CNJ. Devemos nos recordar que eles foram concebidos para dirimir conflitos cotidianos de maneira mais rápida e simples, de preferência por meio da conciliação. Infelizmente, os juizados ainda sofrem um descaso pelos mais conservadores. Equivocadamente, a enxergam como uma subjustiça.”

O diagnóstico revelou ainda a diferença entre a estrutura das salas de audiência dos juizados adjuntos e as dos autônomos. Na Justiça Federal, enquanto na maior parte (57%) dos juizados adjuntos (que funcionam junto a uma vara de rito comum) as audiências ocorrem em estruturas compartilhadas para outros fins, nos juizados autônomos (que atuam exclusivamente como juizados), a maior parte possui salas exclusivamente preparadas para a realização de conciliações (61%).

Na Justiça Estadual, o levantamento mostrou que não há conciliadores capacitados em todas as unidades. Nos juizados adjuntos, em 21% dos casos, há uma central de conciliação que atende a varas e juizados; enquanto nos juizados autônomos, essa taxa é de apenas 17%.

As equipes exclusivas da unidade judiciária estão presentes em 20% dos juizados adjuntos; já nos autônomos esse percentual atinge 43%. Há juizados especiais (minoria) que não atuam com conciliação:  1,1% dos adjuntos e 1,4% dos autônomos.

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Justiça Itinerante

A pesquisa também mostrou a importância da realização de edições de itinerâncias em localidades remotas, como áreas indígenas e quilombolas, feita pelos juizados especiais, e que quase sempre contam com a força de trabalho dos servidores do Judiciário, assim como de outros órgãos, por meio de parcerias firmadas entre o Poder Judiciário local. No ano passado, foram realizadas quase 3 mil dessas ações. Em 93% delas, houve conciliação e, em 75%, instruções e julgamentos.

“A itinerância é um dos pontos mais fortes e humanitários dos juizados especiais. São magistrados que fazem uma justiça disposta a ouvir o cidadão. Saem de seus gabinetes em ônibus, barcos, oferecendo uma Justiça que escuta e se faz compreendida, por meio da oralidade, da simplicidade, da economia processual e da celeridade”, afirmou a presidente do Fonaje.

Em 81% das vezes, a Justiça Estadual teve como parceiro o Poder Executivo Federal ou Estadual; a Polícia (62%); a Defensoria Pública (56%); as Forças Armadas (31%) e o INSS (25%). Os juizados itinerantes são promovidos por 16 tribunais de justiça e um tribunal regional federal e finalizaram um total de 51.336 sentenças (acordos), com mais de 335 mil pessoas atendidas.

Tecnologia

O diagnóstico também levantou questões como instalações, mobilidade, acessibilidade, tecnologias e dificuldades com sistemas digitais. O sistema mais utilizado apontado pelos JEFs foi o PJe, seguido do SAJ e do Projud. De todos, o melhor avaliado foi o Eproc, que recebeu o menor índice de queixas.

“A população encontra nos juizados uma importante porta de entrada da Justiça. Mas eles também precisam ser uma porta de saída ainda melhor. Para isso, precisamos trabalhar com mecanismos digitais, remotos, que facilitem o acesso à Justiça”, disse a presidente do Fórum Nacional dos Juizados Especiais. Ela citou o ineditismo do TJSC, durante o período da pandemia, ao realizar sessões virtuais de conciliação.

O coordenador dos juizados do TRF1, desembargador Ney de Barros Bello Filho, se disse um entusiasta do acesso tecnológico. “A pandemia nos trouxe essa nova realidade virtual que vem nos ajudando a dar vazão às demandas. Há um grande número de audiências que pode ser feitas dessa forma. A teleperícia ainda encontra certos obstáculos e muitos médicos não aceitam essa forma de atendimento. Mas isso precisa ser atualizado. Há casos menos complexos que podem ser tocados adiante, e isso garantiria o acesso à Justiça a muitas pessoas”, ponderou.

Ponto de partida

Ney Filho também citou a baixa inclusão digital do país como um desafio. “Quando fazemos mutirões, parte dos problemas poderiam ser resolvidos com audiências virtuais. Garantir a justiça em lugares ermos, longínquos, ainda é um desafio imenso. Precisamos encontrar um caminho”.

Outros pontos analisados no Diagnóstico tratam de questões ligadas à gestão dos tribunais e à força de trabalho existente nessas unidades. Atuando há mais de 30 anos em juizados especiais, o juiz Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) Roberto Chiminazzo Júnior ressaltou que o diagnóstico apresentado pelo CNJ “é um começo, não um ponto de chegada”, e reforçou a necessidade de haver reestruturação física, com criação de mais salas, melhorias dos sistemas tecnológicos, assim como uma atenta capacitação de seus operadores. “O corpo de servidores precisa ser eficiente e bem preparado uma vez que a atermação (processo de ouvir o cidadão com a sua demanda e transformá-la em um termo a ser dirigido ao juiz) é feita por esses profissionais em 76% dos casos, como mostrou o próprio diagnóstico.”

Para Chiminazzo, o estudo deve ser utilizado pelo CNJ para se avançar na superação das carências encontradas e na replicação das experiências positivas, que devem ser compartilhadas. O último diagnóstico sobre os juizados foi feito em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) em 2013. O levantamento realizado no ano passado foi encomendado pelo Grupo de Trabalho instituído pelo ministro Dias Toffoli por meio da Portaria 126/2019, para estudar melhorias na atuação dos juizados especiais estaduais, federais, cíveis, criminais e da fazenda pública.

Regina Bandeira
Agência CNJ de Notícias