Estadão publica editorial sobre juizados e CNJ

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Sob o título "A reforma dos Juizados", o jornal O Estado de S. Paulo publica editorial analisando a situação dos juizados especiais e a atuação do CNJ no sentido de colaborar para o melhor funcionamento destes órgãos. Leia abaixo a íntegra do texto.

"Introduzidos no País há quase duas décadas e meia e concebidos para dirimir litígios de baixo valor e permitir o acesso ao Poder Judiciário dos segmentos menos favorecidos da população, os Juizados Especiais estão vivendo uma situação paradoxal. Por causa do seu sucesso, eles não vêm funcionando bem. Como foram criados para resolver questões corriqueiras com agilidade e rito simples, eles estão atraindo uma demanda muito maior do que podem atender. Estão congestionados e correm o risco de se tornarem tão lentos quanto a Justiça comum.

Essa é a conclusão de um dos mais completos levantamentos já realizados sobre os gargalos estruturais da primeira instância da Justiça – a que tem contato direto com a sociedade. Realizada pelo Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais (Cebepej), com apoio do Ministério da Justiça, o trabalho é tão atual e oportuno que levou o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a propor um "pacto social" para a reforma dos Juizados. Apresentada à cúpula da magistratura estadual e federal, a idéia foi aprovada na última reunião do Colégio Permanente de Presidentes dos Tribunais de Justiça, que se realizou em Brasília no início do mês.

Para se ter idéia da importância dessa iniciativa, basta saber que os Juizados Especiais Federais receberam 1,7 milhão de novos processos em 2004, enquanto a primeira instância da Justiça Federal protocolou 960 mil novas ações. No entanto, apesar de atender a quase o dobro da demanda da Justiça Federal, os Juizados Especiais Federais recebem apenas entre 10% e 20% dos recursos destinados a ela. O mesmo problema ocorre com os Juizados Especiais Estaduais, cuja maioria funciona em instalações precárias, com número insuficiente de funcionários e magistrados. Contam, no total, com somente 751 juízes, contra 7.609 na primeira instância da Justiça estadual. Com isso, um magistrado do Juízo Comum recebe 915 novos processos por ano, em média, enquanto cada juiz de Juizado Especial recebe 2.093 novas ações.

Essa distorção, segundo a pesquisa do Cebepej, se deve ao modo como a cúpula do Judiciário encara os Juizados Especiais. Em alguns Estados, eles são vistos como uma "justiça de segunda classe". Em outros, não são considerados prioritários, apesar da quantidade de causas que têm de julgar. "Há locais em que são designados para esses Juizados não os magistrados mais vocacionados, mas os juízes tidos como problemáticos. Há unidades da Federação em que são designados para esses Juizados os juízes com denúncias de corrupção, juízes perseguidos por algum motivo, juízes com suspeitas de comportamento não exemplar e até por homossexualismo", afirmou Maria Teresa Sedek, professora da USP e consultora do Cebepej, na reunião do Colégio Permanente dos Presidentes dos Tribunais de Justiça.

Por isso, a reforma e a expansão dos Juizados não depende de mais recursos para o Judiciário, mas de uma distribuição mais racional dos recursos existentes e de uma mudança de mentalidade na cúpula da instituição. "É preciso melhorar recursos humanos e de informática", diz Rui Rosado, ministro do Superior Tribunal de Justiça e um dos autores da lei que criou os Juizados Federais. "A falta de investimento afeta o bom funcionamento dos Juizados. Não se quer com isso afirmar a falta de verbas públicas destinadas ao sistema judicial, que, no Brasil, chegam a ser 3,6% maiores que em muitos países de Primeiro Mundo. Quer-se apontar que, em muitos casos, a organização interna da Justiça não reconhece nos Juizados institutos prioritários para sua legitimação, conferindo menor aporte de recursos do que o necessário para sua consolidação e, muitas vezes, relegando-os a um papel coadjuvante da Justiça comum", endossa o secretário de Reforma do Judiciário, Pierpaolo Cruz Botini.

O "pacto social" firmado pelo CNJ e a cúpula da magistratura federal e estadual com o objetivo de melhorar a qualidade dos serviços judiciais prestados à população de baixa renda, modernizando os Juizados Especiais, é um fato inédito na história do Judiciário. Ele mostra que esse Poder saiu da letargia em que se encontrava e começou a fazer as reformas que deveria ter iniciado há muito tempo. Com grande atraso, a Justiça finalmente passou a agir em consonância com as expectativas de quem a sustenta com seu suor e trabalho".