Pelo menos 15 estados têm até o dia 28 de fevereiro para formalizar a criação de Comitês de Políticas Penais nas respectivas localidades. Previstos no plano Pena Justa, os Comitês são espaços de governança que reúnem atores ligados à pauta criminal, a exemplo de representantes do Judiciário, Executivo e participantes de movimentos ou organizações ligadas à questão penal. Essas estruturas estão presentes atualmente em onze estados.
O prazo final para criação dos Comitês foi estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347. De acordo com o STF, os Comitês devem ser criados em 15 dias a partir da publicação da decisão que homologou o plano, com prazo de contagem iniciado em 10 de fevereiro.
A criação e o desenvolvimento dos Comitês vem sendo fomentada pelo CNJ por meio de seu Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) e pela Secretaria Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública .
“É importante garantirmos não apenas a existência dos comitês, mas que seu funcionamento possa articular as instituições locais estruturantes para a elaboração dos planos estaduais e distrital e, especialmente, permitir a concretização das suas metas”, explica o coordenador do DMF do CNJ, Luís Lanfredi. “Os agentes locais terão o desafio de alinhar a estrutura e medidas de seus planos ao plano nacional, tendo um papel crucial na assimilação e customização das metas do Pena Justa, respeitando arranjos e configurações locais”.
A principal ferramenta de apoio para a criação desses colegiados é o Guia Prático de Implantação dos Comitês de Políticas Penais, publicado pelo CNJ em 2022 como parte das atividades do programa Fazendo Justiça. O programa é executado em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e a Senappen.
Sobre os Comitês
Os Comitês de Políticas Penais partem do princípio de que o ato da responsabilização é complexo e demanda um olhar atento para todas as fases do ciclo penal, desde a porta de entrada até a porta de saída. Seu objetivo é favorecer a convergência de esforços e investimentos do Estado para implementar, acompanhar e aprimorar serviços penais, agora previstos na matriz do Pena Justa.
Exemplos dessas políticas são as Centrais de Regulação de Vagas (CRV), os Serviços de Atendimento à Pessoa Custodiada (Apecs), os Escritórios Sociais para atenção às pessoas egressas, além do fortalecimento de políticas de trabalho, educação e saúde, entre outras essenciais ao processo de responsabilização penal.
Na homologação do Pena Justa, ministros do STF destacaram o caráter estratégico dos Comitês de Políticas Penais como espaços de gestão e monitoramento do plano, levando em conta as particularidades de cada território.
Os Comitês poderão optar pela criação de câmaras técnicas relacionadas aos eixos estruturantes do Pena Justa ou para o aprofundamento, proposição e acompanhamento de temas específicos. Essas câmaras podem ter a participação de autoridades do Sistema de Justiça, pesquisadores, especialistas, gestores públicos, lideranças e representantes de comunidades tradicionais.
No Tocantins, o comitê instituído em setembro do ano passado conta com representações de 24 atores do Sistema de Justiça, Poder Executivo, Poder Legislativo e sociedade civil. O grupo já se articula em quatro câmaras temáticas que refletem os mesmos eixos de atuação do Pena Justa — controle da entrada e das vagas; qualidade da ambiência, dos serviços prestados e da estrutura prisional; processos de saída e reintegração social; e políticas de não repetição.
“O mais importante dos Comitês é o levantamento da realidade local. Identificarmos nossas particularidades e aplicarmos energia no que realmente precisa ser melhorado”, diz Sibele Biazotto, advogada criminalista e presidente do Conselho Penitenciário Estadual do Tocantins, entidade que integra o comitê local.
Sobre o Guia de Implementação
Com um passo a passo detalhado, a publicação destaca como deve ser a composição do comitê. São previstos representantes do Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública, de órgãos de administração penitenciária, de secretarias estaduais responsáveis pelas políticas de proteção social, da Ordem dos Advogados do Brasil, de conselhos da comunidade, entre outras organizações da sociedade civil, a exemplo de instituições de ensino superior, movimentos negros, de mulheres, LGBTQIAPN+, conselhos de direitos e entidades vinculadas a populações específicas (indígenas, quilombolas, migrantes) e instituições religiosas.
Acesse o Guia Prático de Implantação dos Comitês de Políticas Penais
A coordenação das atividades é conjunta entre Judiciário, por meio de seus Grupos de Monitoramento e Fiscalização, e Executivo, por meio das respectivas secretarias responsáveis pela gestão das políticas penais no estado. Os Comitês devem ainda ter o apoio estratégico de órgãos dos governos locais, como Casa Civil e Secretarias de Planejamento para facilitar o processo de coordenação e participação das demais políticas públicas estaduais.
“Não basta ter boa vontade, é preciso seguir um método”, destaca Geraldo Fidélis, coordenador do GMF no Mato Grosso, onde o comitê foi institucionalizado em maio de 2024. Na Conferência Nacional de Alternativas Penais, realizada pela Senappen no final do ano passado, o coordenador do GMF do Tribunal de Justiça da Bahia, Antônio Faiçal, disse que os Comitês são um “ambiente de solução consensual e multilateral” essenciais para o Pena Justa. “A decisão judicial muitas vezes não se basta. Não posso determinar a monitoração eletrônica sem o estado dialogar comigo sobre a disponibilidade de tornozeleira, por exemplo. Essa conversa com o Executivo é essencial”, exemplifica.
No Acre, o Comitê tem promovido ações de enfrentamento ao racismo, além do fortalecimento de políticas de saúde, cidadania e combate à tortura. “A existência do comitê pressupõe que nenhum poder ou instituição, sozinho, pode solucionar as violações massivas do sistema prisional brasileiro”, conclui Andréa Brito, coordenadora do GMF no estado.
Texto: Leonam Bernardo
Edição: Nataly Costa e Débora Zampier
Agência CNJ de Notícias