Sugestões de indicadores, temas, enfoques e políticas foram encaminhadas durante as oitivas sobre a Agenda 2030, com foco nos ODS 13, 15 e 17, promovidas pela Comissão Permanente de Acompanhamento dos ODS e da Agenda 2030 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Durante a reunião pública realizada sexta-feira (21/8), membros de associações de magistrados, representantes do setor privado e especialistas expuseram suas propostas.
“Quando as condições de proteção ao meio ambiente são flexibilizadas e inobservadas, os trabalhadores e trabalhadoras sofrem seus efeitos”, ressaltou a presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), a juíza Noemia Aparecida Garcia Porto. Noemia destacou que a relação entre a pauta ambiental e a pauta trabalhista se mostrou evidente, por exemplo, quando da ocorrência da tragédia de Brumadinho.
A juíza elencou as propostas elaboradas pela Anamatra. Entre elas, a realização de levantamento qualitativo da produção judiciária, e não apenas quantitativo, e o desenvolvimento de ações de formação de magistrados e servidores na temática do combate ao trabalho escravo e ao tráfico de pessoas.
O magistrado espanhol Juan Martínez Moya, membro do Conselho Geral do Poder Judiciário de Espanha e coordenador nacional da Cumbre Judicial Ibero-Americana, afirmou a relevância do documento “100 regras de Brasília” e seus impactos na Agenda 2030. A declaração foi elaborada pela Cúpula Judiciária Ibero-americana, em 2008, e tem sido atualizada desde 2018.
“Das 100 regras, 73 foram atualizadas. O documento tem um impacto e aparece como um fio sustentador de aplicação de determinados ODS, como os ODS 1, 5, 10 e 16, mas também atravessa de forma transversal todos os objetivos, a exemplo dos que aqui nos ocupa nesta reunião”, afirmou Moya, indicando à Comissão Permanente como referência as estratégias e experiências de boas práticas que resultaram do documento. “Existe um manual comentado dirigido a juízes, defensores, fiscais, advogados, professores universitários, que comenta regra por regra e examina o impacto em todos os ODS, e que está disponível publicamente”, sugeriu Juan Martínez Moya.
A audiência pública também teve participação da juíza federal e diretora da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Clara Mota. Em nome da associação, Clara propôs que as questões relativas ao ODS 13 – Ação contra mudança global do clima atravessem a formação dos magistrados, “tanto na sua seleção para ingresso quanto nas atividades da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento”.
Para Clara Mota, “os magistrados não podem ir para zona de fronteira após admissão em concurso ou promoção para titularidade, sem um suporte nesses temas de envergadura global”. A diretora da Ajufe também pediu ao CNJ atenção à segurança de magistrados que atuam em processos que envolvem litígios de contrabando de madeira e grandes organizações criminosas que atuam contra o meio ambiente.
Indicadores para o ODS 15 e inclusão do ODS 7
Clarissa Bueno, professora e coordenadora do Programação de Pós-graduação em Direito da Universidade Positivo, apresentou na audiência sua proposta de indicadores para as metas brasileiras — adequadas pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) — referentes ao ODS 15 – Vida Terrestre. Os indicadores articulam bases de dados e fontes do Poder Judiciário brasileiro.
Em sequência, o engenheiro agrônomo Cícero Bley, apoiador técnico do Conselho Temático de Energia da Federação de indústrias do Paraná e CEO da Bley Energias – Estratégias e Soluções, sugeriu a inclusão do ODS 7 – Energia Acessível e Limpa nos debates realizados sobre questões ambientais. Bley ponderou que o sistema de transmissão de energia elétrica no Brasil não consegue penetrar na região amazônica, constituindo um déficit de acesso de cerca de 5 milhões de pessoas e 500 comunidades, entre povos indígenas, ribeirinhos, extrativistas e pelotões militares em áreas de fronteira. A dificuldade de acesso, de acordo com o engenheiro, leva a população, nessas localidades, a utilizar combustíveis fósseis como o óleo diesel, que contribuem para emissão de gases de efeito estufa.
Cícero Bley defende a utilização de biogás nessas regiões. “É necessário levar a Amazônia soluções de energia renováveis. O biogás é derivado da digestão anaeróbica de resíduos em geral. É possível fazer uma grande discussão sobre o uso de biomassa aquática, na região”, argumentou.
Mediação
Na reunião pública, o advogado e professor da PUC-RJ, Marcio Vieira Souto Costa Ferreira, frisou aspectos processuais das ações judiciais relacionadas à matéria ambiental. Marcio propôs uma inversão de perspectiva, em tais casos, que dê maior peso à tutela preventiva em detrimento da tutela repressiva. “Precisamos construir processos coletivos, estruturais e preventivos. A tutela preventiva precisa ser adotada com maior vigor do que tem sido hoje”, afirmou.
O advogado defendeu o fortalecimento de uma cultura da mediação como solução rápida e eficiente, alternativa a um longo processo judicial. “As pessoas devem estar mais preparadas para a mediação. Todas as instituições de justiça, empresas, interessados, atingidos. Todos podem se irmanar para encontrar uma solução mais rápida do que a repressiva”, recomendou.
Atuação conjunta dos Poderes
Marcello Brito, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), destacou o potencial agroambiental do Brasil e reforçou o compromisso da Abag com a Agenda 2030 e o desenvolvimento sustentável. Brito fez ponderações sobre a legislação ambiental, mencionando a Lei n. 12.651/2012, mais conhecida como “Código Florestal”, que dispõe sobre a proteção da vegetação nativa. Para ele, a legislação deixou lacunas que precisam ser resolvidas, havendo processos em discussão tanto no STF como no STJ.
O presidente da Abag sugeriu um cerco de parcerias entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, como também com a sociedade civil organizada e o setor privado, a fim de pacificar o entendimento sobre a lei em questão.
Raquel Lasalvia
Agência CNJ de Notícias