As hipóteses apresentadas no Diagnóstico do Contencioso Tributário Judicial foram temas em seminário realizado na terça-feira (15/2) pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O secretário especial de Programas, Pesquisas e Gestão Estratégica do CNJ, Marcus Lívio Gomes, classificou como ilógico e irracional a existência de duas instâncias autônomas e independentes para análise do processo administrativo tributário e do processo judicial tributário.
Segundo Gomes, é economicamente contraproducente que, após análises de especialistas, a matéria novamente seja apreciada pelo Poder Judiciário. “A grande complexidade hoje não advém das ações ordinárias. As teses jurídicas estão entrando no Poder Judiciário através de mandado de segurança. Isso precisa ser repensado, principalmente para questões complexas e estruturais que às vezes não buscam a garantia de um direito fundamental, mas tão somente testar uma tese jurídica.”
O coordenador-geral da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) Manoel Tavares destacou que a publicação do Diagnóstico do Contencioso Tributário marca uma mudança de paradigma fundamental na política pública sobre o tema no país. “Objetivos como resolver litígios com maior racionalidade no uso da máquina pública, melhorar o ambiente de negócios e aprimorar o sistema de precedentes fortalecendo nossa Justiça fiscal estarão mais próximos após realização desse projeto.”
O diagnóstico foi classificado pela secretária da Fazenda do Ceará, Fernanda Mara Pacobahyba, como fundamental para quem precisa estruturar uma boa gestão tributária. Segundo ela, “todos concordam que a legislação precisa ser mais simples e o fisco mais transparente, mas cada setor quer uma legislação para chamar de sua, quer uma legislação própria”.
Já a coordenadora do curso de pós-graduação e de cursos de extensão do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários, Talita Felix, observou que, depois dos planos econômicos das décadas de 1980 e 1990, houve uma mudança na percepção do sistema tributário brasileiro e contribuintes e empresários perderam medo de fazer essa provocação e parece que as coisas mudaram a partir dali.
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Para a ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a litigiosidade judicial tributária é um problema crônico e com efeitos deletérios sobre uma série de aspectos, como o impacto de múltiplas demandas sobre os mesmos temas, causando morosidade judicial. “Todos esses efeitos acabam por combinar no prejuízo da qualidade das decisões proferidas.”
Para a procuradora-geral adjunta da PGFN Adriana Rocha, a produção do estudo é o passo inicial. E não é possível retroceder. “Temos que seguir para criar um país mais próspero, no qual o ambiente de negócios seja favorecido pela segurança jurídica, pela celeridade na prestação jurisdicional e aumento da confiança do contribuinte em relação à administração tributária.”
Coordenador-geral da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, André Nardelli defendeu que as autoridades fazendárias, em âmbitos federal, estadual e municipal, de fato, utilizem os precedentes dos tribunais superiores para que haja uma redução da litigiosidade. A chefe de gabinete da Secretaria Especial do CNJ, Doris Canen, ressaltou que o Diagnóstico é o maior projeto já realizado com foco no contencioso tributário. “Estamos num mundo de novos negócios, que desafia principalmente o Direito Tributário. São negócios cada vez mais complexos. E este trabalho é um grande exemplo de cooperação entre os fiscos, os contribuintes, academia e órgãos internacionais.”
Conciliação
A juíza auxiliar da Presidência do CNJ Trícia Navarro destacou que a Resolução CNJ n. 125/2010 foi um marco ao criar a Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado de Conflitos. E observou que a Recomendação CNJ n. 120/2021 reforça a política, ao incentivar que a magistratura busque a solução consensual de conflitos tributários. “O legislador e o CNJ têm incentivado a consensualidade. Resta pendente a mudança de cultura e a mudança de postura dos profissionais de Direito, que devem compreender que o Direito Tributário pode e deve ser potencializado pelos benefícios da Justiça multiportas.”
Professor de direito financeiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Heleno Torres defendeu a arbitragem tributária e afirmou que ela pode contribuir na prevenção de litígios. Para Ricardo Almeida, assessor jurídico da Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais, o Direito Tributário é um dos últimos redutos do autoritarismo. “Conserva relações verticais e impositivas, enquanto outros ramos do próprio direito público, como o administrativo, já começam a construir relações horizontais, relações de consenso e cooperação.”
Já o assessor da Secretaria Especial do CNJ Eduardo Silva afirmou que a experiência de diálogo entre autoridades fazendárias e contribuintes pode ser mais dinâmica e mais recorrente para contribuir no avanço do sistema de justiça multiportas no âmbito tributário. E explicou que a relação entre a utilização dos meios adequados de solução de conflitos e a redução dos estoques de créditos inscritos em dívida ativa ainda não foi confirmada, mas espera que esse cenário mude nos próximos anos.
Também coordenador-geral da PGFN, João Grognet enfatizou a importância da estruturação de dados. “Não se faz política pública sem dados. A tomada de decisão depende de diagnóstico e esse produto vai permitir a entrega uma série produtos”, pontuou. Para o membro da Comissão Assuntos Tributários da OAB/RJ Leonel Pittzer, o Diagnóstico preenche uma lacuna em relação ao tema ao trazer evidências sobre o padrão modulatório das decisões do Supremo Tribunal Federal.
Maria Cristina MacDowell, especialista Líder Fiscal do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), destacou que os dados fornecidos pela pesquisa possibilitam que se analise o impacto da litigiosidade tributária no ambiente de negócio, além de apontar medidas para redução desses impactos para as empresas. Já o procurador-geral do Rio de Janeiro, Rafael Pepe, que mediou o debate, observou que a alta carga de processos é produzida pela Fazenda Pública que, invariavelmente, recorre em todos os casos, inclusive naqueles que não existem possibilidades de êxito. E que tem buscado mudar essa cultura. “Temos um regime que a regra para os processos de baixa complexidade é não recorrer aos tribunais superiores.”
Jeferson Melo
Agência CNJ de Notícias
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