Numa decisão inédita, a administração do Tribunal de Justiça de Roraima (TJRR) autorizou a realização de teletrabalho por parte de uma servidora do seu quadro funcional. A deliberação se deu a partir da solicitação da técnica judiciária Dayla Loren Marques França, lotada no 3º Juizado Especial Cível, que requereu inclusão no sistema de teletrabalho, considerando que desde novembro de 2015 ela se encontra em tratamento de saúde por prazo indeterminado em São Paulo e não queria interromper suas atividades laborais.
O regime de teletrabalho é uma modalidade de prestação do serviço público na qual o servidor exerce suas funções diretamente da sua residência, sob a fiscalização da chefia imediata ou de uma comissão. Já vem sendo utilizado como uma importante ferramenta para outros tribunais com o objetivo de melhorar a qualidade de vida do servidor e, ao mesmo tempo, promover a celeridade e a efetividade da prestação jurisdicional.
Em seu requerimento, a servidora do TJRR informou ser portadora de um tipo de câncer extremamente raro e de tratamento restrito a grandes capitais do sudeste brasileiro, mas que, atualmente, encontra-se em condições de trabalho, uma vez que o tratamento não exige internação hospitalar, mas apenas o cumprimento de um rigoroso protocolo médico, o que viabiliza sua colaboração com as atividades jurisdicionais do Tribunal de Justiça de Roraima. A técnica judiciária alegou, ainda, que o teletrabalho não prejudicará o seu tratamento.
“Durante o tratamento, percebi que algo necessitava ser preenchido. Foi quando fiz o requerimento solicitando o teletrabalho. Fiz uma pesquisa de sua implementação e protocolei meu requerimento”, explicou Dayla.
A decisão favorável à prática do teletrabalho é do presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Almiro Padilha, e foi publicada no Diário da Justiça Eletrônico desta quinta-feira (23/6). Na decisão, o magistrado explicou que, embora o TJRR não possua normatização específica para regulamentar o tema, uma vez que o Procedimento Administrativo que trata do assunto ainda se encontra na fase de estudos complementares, ele entende que o caso merece especial atenção da administração do tribunal.
O desembargador Padilha defendeu também que o caso em questão exige uma análise muito mais abrangente, pois, seja pela conjuntura atual do Poder Judiciário ou pela constante busca do alcance da dignidade da pessoa humana, “muitos conceituam-no como um supra princípio constitucional, invocando como fundamento de decidir o princípio da juridicidade administrativa, que permite à administração pública observar não apenas a lei, mas, sim, todo o ordenamento jurídico para que se possa atingir o interesse público necessário para a persecução da atividade estatal”.
Para o magistrado, restou claro no pedido que o motivo que impede a requerente de exercer suas funções junto à unidade não é a doença em si, mas sim, o fato de ter que residir em outro estado da Federação para tratá-la, posto que o estado de Roraima não disponibiliza tal tratamento. “Diante disso, o que esta Administração deve se pautar é na lealdade desta servidora, que busca no trabalho os meios necessários para manter-se no tratamento médico, promover o seu bem-estar pessoal e de sua família, sendo um exemplo a ser observado”, assinalou, ao considerar que negar o pedido seria o mesmo que violar o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
Ainda, de acordo com o desembargador Almiro Padilha, o TJRR está pronto para iniciar uma nova fase de relacionamento com seus servidores, seguindo as diretrizes da mais nova forma de realização do serviço público com transparência e efetividade, tudo em completa harmonia com os preceitos constitucionais, com as diretrizes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e com a política de valorização dos servidores adotada pela administração do tribunal.
“Mal posso acreditar, pois a decisão significa o meu retorno ao trabalho, a minha volta à atividade”, disse a servidora ao tomar conhecimento do deferimento de seu pedido, explicando que durante o tratamento percebeu que o emprego é muito importante; não somente pelo aspecto financeiro, que é muito relevante, mas sobretudo pela autoestima, bem-estar, tranquilidade e pela sensação de dever cumprido.
Dayla Loren disse acreditar que sua inclusão no teletrabalho será decisiva para sua melhora. Ela agradeceu ao presidente do TJRR, que desde o início se sensibilizou com a situação, e à atenção que recebeu do servidor Diogo Gualberto, da assessoria jurídica da Presidência, durante o trâmite do procedimento administrativo. “Sem dúvida, será um marco em minha vida, pois poderei continuar o tratamento de forma mais tranquila, sem ter que solicitar os afastamentos por licenças médicas; e com a certeza de que, mesmo a distância, estarei contribuindo com as metas que o Tribunal de Justiça de Roraima deve alcançar”, declarou.
Prática – Como previsto na decisão, a servidora, que atuará no regime de teletrabalho, deverá acordar com sua chefia imediata a rotina e metas de trabalho a serem atingidas. Relatórios de atividades devem ser encaminhados por ela à chefia imediata, que os repassará à Secretaria de Gestão de Pessoas para o devido controle da jornada de trabalho estabelecida.
Para viabilizar a nova modalidade de trabalho aplicada pelo Judiciário estadual, caberá à Secretaria de Tecnologia e Informação providenciar a configuração necessária do notebook da servidora; ou adotar outras medidas que atendam com efetividade o exercício do teletrabalho. Para essa adaptação do serviço, foi fixado prazo de três meses.
Resolução – Neste mês, o CNJ editou a Resolução 227, em 15 de junho, por meio da qual regulamenta o teletrabalho no âmbito do Poder Judiciário. O texto do ato normativo foi construído a partir da compilação das 185 sugestões recebidas em consulta pública, aberta em agosto do ano passado, pela Comissão de Eficiência Operacional e Gestão de Pessoas do CNJ, para ampliar o debate sobre a criação de regras para uma prática já adotada por alguns tribunais do país.
Foram levados em consideração pelo CNJ para a regulamentação dessa nova modalidade de trabalho fatores como o aprimoramento da gestão de pessoas ser um dos macrodesafios do Poder Judiciário; o avanço tecnológico, notadamente a partir da implantação do processo eletrônico, possibilitando o trabalho remoto ou a distância; as vantagens e benefícios diretos e indiretos resultantes do teletrabalho para a administração pública, para o servidor e para a sociedade.
Com a implantação do teletrabalho no âmbito do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça tem como objetivos aumentar a produtividade e a qualidade de trabalho dos servidores; economizar tempo e reduzir custo de deslocamento dos servidores até o local de trabalho; contribuir para a melhoria de programas socioambientais, com a diminuição de poluentes e a redução no consumo de água, esgoto, energia elétrica, papel e de outros bens e serviços; ampliar a possibilidade de trabalho aos servidores com dificuldade de deslocamento; e promover a cultura orientada a resultados, com foco no incremento da eficiência e da efetividade dos serviços prestados à sociedade, entre outros.
Fonte: TJRR