Em 2023, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) possibilitou o avanço de políticas afirmativas de gênero, raciais e direitos humanos com a aprovação de uma série de resoluções e pactos voltadas ao aprimoramento dos serviços prestados pelos órgãos do Poder Judiciário. O esforço empreendido ao longo do ano possibilitou o desenvolvimento de políticas articuladas e interinstitucionais que buscam a eficiência, a celeridade e o fortalecimento de uma cultura antirracista e de combate às discriminações.
Com o Pacto Nacional do Judiciário pela Linguagem Simples, lançado durante o 17º Encontro Nacional do Poder Judiciário, em novembro, a magistratura assumiu o compromisso de eliminar o excesso de formalidade sem comprometer o entendimento do conteúdo a ser transmitido. O pacto sugere a adoção de uma linguagem direta e concisa nos documentos dos tribunais, sejam comunicados, despachos, decisões, sentenças, votos ou acórdãos.
A linguagem simples também vale para eventos promovidos pelo Judiciário, nos quais se recomenda a realização de pronunciamentos objetivos, e se possível, breves. Todos os protocolos de eventos deverão ser reformulados, por exemplo, o que engloba inclusive acessibilidade, ao orientar o uso de linguagem acessível a pessoas com deficiência por meio de libras, audiodescrição, entre outros.
Racismo estrutural
Avanços também foram registrados no combate ao racismo e na busca por equidade. A instalação do Fórum Nacional do Poder Judiciário para a Equidade Racial (Fonaer), um dos desdobramentos do Pacto Nacional do Judiciário pela Equidade Racial, foi um deles. De caráter nacional e permanente, ele tem entre suas atribuições a elaboração de estudos e propostas de medidas concretas para o aperfeiçoamento do Sistema de Justiça quanto ao tema.
Ao longo de 2023, o Fonaer trabalhou na proposta de Política de Equidade Racial do Poder Judiciário, documento que foi entregue ao presidente do Fórum, conselheiro do CNJ, o ministro Vieira de Mello Filho. A minuta passará, em breve, por avaliação e votação do Plenário.
Questão de gênero
A adoção de um olhar atento às questões de gênero nos julgamentos realizados na Justiça brasileira esteve entre as preocupações do Conselho este ano. Em março, foi aprovada a Resolução CNJ n. 492, que prevê a aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. Nesse contexto, os tribunais devem promover cursos de formação inicial e continuada que incluam, obrigatoriamente, os conteúdos relativos a direitos humanos, gênero, raça e etnia, conforme as diretrizes previstas no documento.
O protocolo traz considerações teóricas sobre a questão da igualdade e um guia para que os julgamentos que ocorrem nos diversos âmbitos da Justiça possam ser aqueles que realizem o direito à igualdade e à não discriminação de todas as pessoas. A ideia é que o exercício da função jurisdicional se dê de forma a concretizar um papel de não repetição de estereótipos, de não perpetuação de diferenças, constituindo-se um espaço de rompimento com culturas de discriminação e de preconceitos.
A mudança estrutural a partir de uma maior participação das mulheres nos cargos mais altos da Justiça brasileira também avançou em 2023. Em setembro, o Plenário tomou decisão histórica e unânime em prol da equidade na magistratura. Com a aprovação da Resolução CNJ n. 525 foi estabelecida a política de alternância de gênero no preenchimento de vagas para a segunda instância do Judiciário. Com a decisão, as cortes têm agora de utilizar a lista exclusiva para mulheres, alternadamente, com a lista mista tradicional, nas promoções pelo critério do merecimento.
Povos originários
A Resolução CNJ n. 512/2023 também representou avanço nas políticas de inclusão do Judiciário, com a previsão de cotas para o ingresso de indígenas na magistratura. O percentual, de pelo menos 3%, estabelecido pela normativa também inclui o provimento de cargos efetivos em órgãos da Justiça.
De caráter autodeclaratório, conforme critérios de raça utilizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os indígenas que se candidatarem devem incluir a informação no ato da inscrição. Serão válidas as submissões de candidatos e candidatas que residam ou não em terras indígenas.
Pessoa idosa
Para garantir aos brasileiros os direitos previstos na legislação e na Constituição Federal, também este ano o CNJ instituiu a Política Judiciária sobre Pessoas Idosas e suas Interseccionalidades. A Resolução n. 520, aprovada em setembro, busca aprimorar o tratamento da Justiça em relação a esse grupo de cidadãos, capacitar servidores e magistrados em relação a questões mais específicas e comuns que os envolvem e permitir que suas demandas sejam analisadas e julgadas em um tempo razoável, para que possam usufruir de seus direitos.
O normativo busca garantir a efetividade do princípio constitucional da razoável duração nos processos em que pessoas idosas sejam parte ou interessadas, recomendando que os tribunais observem prazos determinados, como, por exemplo, o tempo de tramitação do processo no 1.º grau, inclusive sentença, que deverá ocorrer no prazo máximo de até 15 meses.
Já nas ações civis públicas, propostas com o objetivo de garantir direitos difusos e coletivos de pessoas idosas, a tramitação do processo no 1.º grau, inclusive sentença, deverá ocorrer no prazo de até 24 meses. Em todos os casos, naturalmente serão respeitadas as particularidades da unidade de Justiça e considerada a complexidade do caso.
Ver essa foto no Instagram
Igualdade de direitos
O combate a qualquer forma de discriminação para adoção, guarda e tutela de crianças e adolescentes, por casal ou família monoparental, homoafetiva ou transgênero foi reforçado com a aprovação da Resolução n. 532/2023. O texto destaca que cabe aos tribunais zelar pela igualdade de direitos e contra intolerância nos processos de habilitação de pretendentes.
De acordo com o texto, são vedadas, nos processos de habilitação das pessoas interessadas e nos casos de adoção de crianças e adolescentes, guarda e tutela, manifestações contrárias aos pedidos pelo fundamento de se tratar de família monoparental, homoafetivo ou transgênero.
Heteroidentificação
Aprovada na última Sessão Ordinária realizada em 2023, uma nova resolução, definiu os princípios e as diretrizes que deverão orientar os procedimentos de heteroidentificação ou identificação étnico racial nos concursos de ingresso para a carreira da magistratura. A norma estipula a criação do Banco Nacional de Especialistas para composição de Comissões de Heteroidentificação no âmbito do Poder Judiciário. Os dados organizados pelo banco servirão para o cadastramento de dados de profissionais com formação em questões raciais. A Resolução entra em vigor em abril de 2024.
Tendo por base características fenotípicas das pessoas, a identificação étnico racial observa elementos como cabelo, tom de pele, nariz e boca. Não são analisados neste processo genótipo dos concorrentes, como parentesco com pretos e pardos, sendo feita apenas uma leitura racial.
Ao todo foram julgados mais 720 processos, em 39 sessões virtuais, ordinárias e extraordinárias, além da publicações de 55 resoluções e atos normativos abrangendo diversos temas.
Texto: Ana Moura
Edição: Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias