Joaquim Falcão*
Depois de receber mais de 100 reclamações sobre a lentidão dos juízes nos juizados especiais federais de Belo Horizonte, o corregedor-geral de Justiça, ministro Gilson Dipp, resolveu ir à capital mineira ver o que estava acontecendo. Afinal, os juizados especiais são a Justiça do povo, para onde correm sobretudo os que demandam contra o fisco e a previdência. Essas reclamações já tinham exaustivamente sido feitas pelos cidadãos à Corregedoria e à Ouvidoria da Justiça Federal da 1ª Região. Mesmo assim, pouco se fazia. Um só juiz foi reclamado mais de 12 vezes.
Na verdade, a situação se inverteu. Enquanto 28 varas cíveis comuns têm apenas 2 mil processos cada uma, apenas cinco varas de juizados especiais têm, cada uma, 20 mil processos. E mais, enquanto na vara comum é um servidor para cada 125 processos, na especial, a proporção é de um para 1.600. Ou seja, não faltam servidores, a alocação dos servidores é que é ineficiente. Não acompanhou a mudança da demanda por justiça. Não se trata, portanto, de mais servidores, mais recursos e mais orçamento. É questão de agilidade gerencial.
É preciso que a nova Lei de Organização da Magistratura (Loman) não engesse a administração dos tribunais. Ao contrário, que torne possível e estimule as mudanças gerenciais, que têm de ser rápidas.
O grande fornecedor de conflitos para a Justiça Federal é, sem dúvidas, a previdência social. São sobretudo, casos entre 2004 e 2008 que estão causando o engarrafamento. Casos de auxílio doença, pensão por morte, benefício por invalidez e por aí vamos. Esses casos deveriam ser resolvidos por uma justiça administrativa no âmbito da Previdência Social. A judicialização das relações entre o pensionista e a Previdência só aumenta os custos orçamentários, o déficit público e deslegitima os esforços que estão sendo feitos pelo governo para uma previdência melhor. Dificilmente haverá um Judiciário melhor, sem um Executivo capaz de atender melhor o contribuinte e os pensionistas.
Outros problemas, no entanto, podem e devem ser resolvidos no âmbito do próprio tribunal. Inexiste um atendimento eficiente para o cidadão que chega sem advogado. Inexistem procedimentos padrões sobre perícias médicas. Inexistem padrões regulares para procedimentos sobre cálculos. Tudo atrasa. Tudo torna a Justiça mais lenta. Falta padronização e treinamento.
No mês de fevereiro entraram cerca de 1.200 processos novos e só saíram cerca de 800. O estoque, digamos, o passivo imobilizado, aumenta cerca de 50% ao ano. Não vai dar certo. Ou um choque de gestão é feito imediatamente ou o cidadão transferirá a impaciência que já tem para com a Justiça Comum para a Justiça Especial. Esta corre o risco de virar, no dizer do próprio ministro Dipp, um dinossauro precoce.
Na verdade, a questão da lentidão decisória do Judiciário agrava-se a cada dia que a Justiça tem mais e mais sucesso. É mais e mais procurada. A resposta da eficiência tem que ser imediata. A lentidão tem duas causas básicas. A primeira é a inadequação da infra-estrutura operacional, como constatado pelo ministro Dipp. Diz respeito à modernização gerencial, à formação dos juízes, ao aperfeiçoamento tecnológico, ao excesso de demandas, à falta de padronização, à ociosidade de alguns setores, ao atendimento insuficiente às partes, aos excessos de recursos. Os juizados especiais foram criados para não haver recursos. Mas turmas recursais aumentam dia a dia. É uma patologia a estancar. A outra causa é o insuficiente desempenho dos juízes, a ausência ou não cumprimento de metas – como em toda profissão, existem os mais e os menos eficientes.
A situação de Belo Horizonte é na verdade um alerta, pois existem indicadores de que ela se repete em vários estados brasileiros. A boa noticia é que todos estão convictos de que navegar é preciso, mudar é preciso. E a Corregedoria Nacional de Justiça está atenta e à frente desse movimento, no fundo, à la limite, um movimento a favor do Estado Democrático de Direito.
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(*) Joaquim Falcão é diretor da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas (RJ) e membro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
Publicado no Correio Braziliense (DF), em 23 de abril de 2009