Pelo 14º ano consecutivo, o Brasil foi o país que mais assassinou pessoas trans, sendo que 65% dessas mortes foram motivadas por crimes de ódio com requinte de crueldade. A maior concentração desses crimes foi observada na Região Nordeste, com 40,5% dos casos. Em 2022, foram registradas pelo menos 151 pessoas trans mortas, sendo 131 casos de assassinatos e 20 suicídios. Os dados são da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra).
Neste dia 28 de junho, Dia do Orgulho LGBTQIA+, destaca-se que a identidade de gênero de uma pessoa é uma experiência pessoal, subjetiva, vivenciada – na maioria das vezes, ainda na infância – e desenvolvida ao longo da vida.
Visando somar e tornar-se aliado na promoção de direitos das pessoas trans, o Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA), por meio do Comitê de Diversidade, tem promovido uma série de ações que asseguram e ampliam a conquista de direitos e espaços à população LGBTQIA+.
Kyra Facchnny Abreu da Silva, 33 anos, teve seu Registro de Nascimento retificado no Mutirão Trans, articulado pelo TJMA em parceria com outros órgãos. Na ocasião, Kyra conquistou uma vaga no curso de soldagem ofertado pela empresa Montisol, através do Programa “Sim, Podem”, que busca oferecer oportunidades de capacitação e empoderamento para membros da comunidade LGBTQIA+ interessados em ingressar na área de soldagem.
“O curso veio na melhor hora, estava sem trabalhar e essa capacitação abre portas para o mercado de trabalho. A Montisol veio quebrar barreiras dando essa oportunidade às pessoas do grupo LGBTQIA+”, destacou.
Entre as mudanças quanto à aceitação e inclusão de pessoas trans na sociedade, Kyra afirma que seu desejo é “que as pessoas trans sejam vistas como pessoas normais, por suas habilidades e não por suas aparências”, disse.
Matheus Mourão, homem trans, 35 anos, sonha em oferecer uma boa educação para sua filha adotiva. “Meu sonho, hoje em dia, é poder dar uma educação e um futuro bom pra minha família, ver minha filha formada, ter uma profissão e conseguir um emprego, que eu possa crescer e, assim, mostrar que pessoas trans também são boas profissionais”, revelou.
Assim como Kyra, Matheus também integra o programa “Sim, Podem” e comenta que o preconceito sempre esteve presente em sua vida. “A luta é diária. O preconceito sempre vai existir, independente do que você for, vai caber a você aceitar ou não. Antes de começar minha transição, era lésbica, então, o preconceito vinha de dentro de casa, dos próprios familiares”, disse.
Ainda segundo os dados da Antra, em 2022, foram registradas pelo menos 142 violações de direitos humanos a pessoas trans. Os registros dessas violações ocorreram em praticamente todos os estados do Brasil.
Sobre a importância de ações afirmativas para pessoas trans, Matheus relata: “O curso veio em boa hora sim. Estou desempregado, então já é uma oportunidade de entrar no mercado de trabalho. Esse programa de inclusão ajuda muitas pessoas LGBTQIA+ a terem uma profissão. Muitas vezes, as pessoas têm medo de entrar em um curso, onde não há pessoas que possam se identificar. Nesse programa somos todos iguais, todos lutando por menos preconceito, lutando por aceitação, lutando pra ter uma qualificação profissional e poder vencer na vida”.
A história de Matheus é semelhante a de milhares de pessoas trans brasileiras. De acordo com pesquisa divulgada pelo Grupo Pela Vidda, em dezembro de 2022, a formação educacional e profissional de transexuais é atravessada pela transfobia. Cerca de 36,7% dos entrevistados afirmaram ter sido vítimas de transfobia no ambiente escolar. “Antes de fazer o curso da Montisol, fiz um de frentista e como ainda não sou retificado, toda vez que me chamavam, chamavam pelo nome de registro e as pessoas que estavam em minha volta ficavam com as famosas piadas transfóbicas que são ditas todas as vezes”, contou Matheus.
Aliado do Orgulho LGBTQIA+
Em outubro de 2022, o Judiciário maranhense realizou o primeiro Casamento Comunitário gratuito direcionado à comunidade LGBTQIA+ do estado. A ação tinha como principal objetivo ofertar, gratuitamente, o acesso ao registro de casamento civil para casais constituídos por pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais em situação de vulnerabilidade social, celebrando o amor e a diversidade, contribuindo para a promoção dos direitos humanos, proteção e garantia dos direitos civis da comunidade LGBTQIA+ no Maranhão.
Compromissado com a diversidade e combate ao preconceito, o TJMA fixou na entrada do Palácio da Justiça uma placa contra LGBTfobia. A ação cumpre a Lei n. 11.827/2022, que estabelece a obrigatoriedade de afixação de placas informativas que proíbam a discriminação em razão de orientação sexual ou identidade de gênero em ambientes públicos e privados no Maranhão.
Maio de 2023 também foi marcado por mais uma ação de promoção de direitos com o mutirão Cidadania Transgênero. A iniciativa foi promovida pelo Comitê de Diversidade do TJMA, com o apoio de diversas instituições, e foi voltada ao atendimento de pessoas trans e aberta a todo o público LGBTQIA+. Na ocasião, o público teve acesso a serviços na área de saúde, formação profissional e vagas de emprego.
Judiciário e diversidade
Em 25 de março deste ano, o TJMA em seu podcast “O Mérito”, divulgou episódio especial em alusão à data em que se comemora o Dia do Orgulho Gay. Com o tema “Por que o Judiciário também deve atuar na causa trans?”, o programa entrevistou o coordenador do Comitê de Diversidade, juiz Marco Adriano Fonseca, e a ativista social e fundadora da Casa FloreSer Maranhão, Raíssa Mendonça. Na ocasião, a realidade da violência contra pessoas trans e o papel do direito na busca por justiça e igualdade foram assuntos debatidos.
Para além do Maranhão, neste mês de junho, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Sebastião Reis Júnior, lançou o livro “Translúcida” com fotos de sua autoria. A publicação é da editora Amanuense, dá visibilidade a pessoas trans e terá parte da renda obtida com a venda do livro destinada a entidades de defesa dos direitos de transgêneros.
Em Translúcida, o ministro Sebastião Reis Júnior reúne fotografias de internas transexuais feitas por ele, em visita ao Centro de Detenção Provisória Pinheiros II, em São Paulo. A obra também conta com a contribuição de vários autores, com diversas manifestações de linguagem.
Em entrevista ao STJ, o ministro falou sobre o processo de organização da publicação. “Procurei conhecidos e desconhecidos. Pessoas com formações diversas. Apresentei a ideia. Cada um escolheria uma foto e ampliaria a voz de alguém que precisava que seus sentimentos se espalhassem. Quem ler vai ver trabalhos de advogados, juízes, médicos, políticos, artistas plásticos e militares, e verá textos técnicos, cartas, ilustrações, contos, poesias e ensaios. Não houve regras a seguir. Textos livres. Cada um escreveu, ou desenhou, o que quis, o que sentiu vontade”, conta Sebastião.
Fonte: TJMA