A adoção é responsável por muitas histórias de amor, superação e felicidade. Formar uma nova família exige preparação e disposição, além de seguir as normas legais vigentes. Para a advogada Karina Berardo de Souza Teles, mãe de João (9) e Camila (8), os filhos encantam e desafiam diariamente. “A gente se torna mãe todos os dias, porque todos os dias temos de reafirmar nosso compromisso com a criação, educação, amor, cuidado, carinho e afeto dos nossos filhos, mesmo depois que eles crescem”, afirma.
A adoção no Brasil é regida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que foi alterado, dentro do tema, pela Lei nº 13.509/2017, melhorando os prazos de cada etapa. A Lei também mudou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), equiparando os prazos de licença, estabilidade e descansos especiais de pais biológicos e adotivos. Além disso, a lei reforçou a necessidade do acompanhamento das famílias pretendentes e das crianças disponíveis para adoção, pela Vara de Infância e Juventude (VIJ).
De acordo com o supervisor da Seção de Colocação de Família Substituta da VIJ do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), Walter Gomes de Sousa, o número de famílias interessadas em adotar aumenta a cada ano, especialmente após campanhas que apontam a adoção como uma referência de lar para as crianças que não o tem. Tanto é que, segundo dados do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), coordenado pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), existem atualmente mais de 46 mil famílias cadastradas, contra cerca de 9.540 crianças disponíveis.
Para Karina Berardo Teles e seu marido, Hugo Damasceno Teles, a possibilidade de adotar surgiu antes do casamento. Depois de vencer um câncer quando criança, Hugo ficou impossibilitado de ter filhos biológicos, mas eles decidiram fazer os tratamentos ao mesmo tempo que se inscreviam para a lista de adoção. “Quando decidimos entrar na fila de adoção e fazer o procedimento, foi quando eu decidi que seria mãe”, conta Karina. Por isso, a data, para ela, remete à gratidão. “Eu acho o Dia das Mães maravilhoso! Agradeço pela possibilidade de ser mãe dos meus filhos. Eu rezo muito pela vida deles, pelo direito de vida que eles tiveram, pelas mulheres que os trouxeram à vida. Tenho muita gratidão, muito respeito. Mas é um dia de muita alegria, de receber carinho, de ficar junto e de agradecer. Representa um dia de gratidão!”, afirma.
Preparação
Karina e Hugo são advogados, envolvidos como voluntários há mais de 10 anos na ONG Aconchego, em Brasília, e na Associação Nacional de Grupos de Apoio à Adoção (ANGAAD). Eles participaram das discussões que propuseram mudanças à Lei da Adoção (12.010/2009), que deu origem à Lei nº 13.509/17.
Para eles, a nova legislação reforçou o papel das varas de infância e da juventude (VIJs) e a obrigatoriedade da realização do curso preparatório para aqueles que têm interesse em se habilitar no CNA. “O curso prévio para habilitação, o estudo psicossocial e os acompanhamentos da VIJ são imprescindíveis e, na minha visão, não podem ser flexibilizados”, disse Hugo Teles.
No TJDFT, o curso tem duração de um mês, com um encontro por semana. Os participantes precisam ter 100% de frequência para serem habilitados. De acordo com o supervisor Walter Gomes, são abordados os aspectos da adoção, dificuldades, desafios, convivência familiar, desenvolvimento de vínculos afetivos, respeito à história de vida da criança. “Insistimos que é preciso trabalhar com a verdade, ética, naturalidade e demais medos da família, para que não haja descarte no primeiro problema que surgir”, afirma.
No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Coordenadoria da Infância e Juventude (CIJ), informou que todas as comarcas devem oferecer o curso de preparação para adoção. Para tanto, a CIJ criou o projeto “Primeiro Passo”, que estabelece diretrizes para as comarcas, orientando a como executar o curso. “Em princípio, em qualquer processo de habilitação para a adoção, a família deve ser avaliada em sua totalidade, inclusive com os filhos biológicos se já existirem, pois a não aceitação por um de seus membros pode vir a culminar em uma adoção frustrada”, explica a juíza-coordenadora da CIJ do TJRS, Nara Cristina Neumann Cano Saraiva.
A advogada Karina Berardo reforça a importância da preparação para receber os filhos que virão. Ela e o marido fizeram o curso oferecido pela VIJ, tanto para a adoção de João, que aconteceu em 2009, quanto para a chegada de Camila, em 2012. De acordo com ela, eles também participaram de cursos na ONG Aconchego e, após conhecer o trabalho, permaneceram no grupo das famílias para entender todo o universo e possibilidades, o que era a espera, a chegada e a pós-adoção. “É muito bom a gente se preparar, quer seja pai biológico ou por adoção. Quanto mais você se prepara, melhor vai ser para todos. E a gente ainda “apanha muito”, brinca. Para eles, o acompanhamento com os grupos de apoio também é muito importante, pois todos partilham as vivências e experiências. “Essa é a maior diferença: é o preparo por meio dos grupos de apoio de adoção (GAA), através do compartilhamento de experiências”, diz a advogada.
Hugo Teles conta que o movimento social formado pelos GAAs ainda é pouco conhecido, mas o trabalho, muito relevante. “Os espaços de discussão e de criação de identidades fornecidos pelos grupos são muito mais efetivos. Até porque as reuniões não se limitam à pré-adoção, o que contribui significativamente para a redução dos tristes casos de desistência e devoluções”, explica.
Para a presidente da Aconchego, Soraya Pereira, as famílias vão se ajudando, criando uma rede de apoio. Os participantes do GAAs em Brasília pretendem lançar um livro de relatos, contando como funciona o processo. O material já está pronto e agora o grupo busca uma editora para fazer a publicação.
Walter Gomes ressalta que o envolvimento com os grupos de apoio é muito positivo, pois as famílias encontram ajuda e trocam experiências. Conforme explica Karina Berardo, quanto mais conhecimento, maior a compreensão de tudo o que acontece, porque algumas coisas são muito difíceis e inerentes à condição de adoção, por exemplo, não saber sobre doenças hereditárias, explicar para as crianças o que aconteceu até que eles chegassem à família ou como funciona a adoção. “Meus filhos são negros, é uma adoção interracial. Então, temos de explicar a diferença da nossa cor, a beleza disso, mas também os desafios. Ao participar dos grupos de apoio da adoção, conhecendo a experiência de outras pessoas e como funcionam as etapas, isso nos ajuda bastante”, ressaltou.
Mesmo com as dificuldades, Karina disse que vale a pena insistir na adoção. “Meu conselho para as famílias que estão esperando é: não desistam. Seja qual for a dificuldade, tem solução. Não fiquem esperando, sejam presentes no processo e toda dúvida e dificuldade que possam ter no período da adaptação, da adoção, não tenham vergonha. Procurem um grupo de apoio à adoção e busquem ajuda, porque, se desejam ser pais, isso vai acontecer, pois há várias crianças e adolescentes aguardando por esse encontro maravilhoso”, instruiu.
Podem se cadastrar para adoção qualquer pessoa solteira, casal homoafetivo, casal que não é oficialmente casado, mas tem união estável. Além disso é preciso ser maior de 18 anos e 16 anos mais velho do que o adotado ou a adotada.
Confira a lista de Grupos de Apoio à Adoção em todo o país, no site da ANGAAD.
Lenir Camimura Herculano
Agência CNJ de Notícias