Desigualdades marcam a rotina de adolescentes privadas de liberdade, aponta estudo

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Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ.
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Desigualdades econômicas, de gênero e de raça, elementos enraizados em nossa sociedade refletidos no sistema de justiça, é a realidade de adolescentes grávidas privadas de liberdade. A análise está na pesquisa de campo Relatos da invisibilidade: representações de atores públicos sobre a aplicação do marco legal da primeira infância no cenário penal e socioeducativo feminino, desenvolvida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, que analisa qualitativamente o universo de adolescentes que estão em regime de internação. O levantamento também inclui jovens mães de crianças de até 6 anos de idade do diagnóstico nacional da primeira infância.

Ao todo, 180 interlocutores participaram das entrevistas, com 62 profissionais do Poder Executivo municipal ou estadual; 40 do Poder Judiciário; 32 da sociedade civil; 23 do Ministério Público; e 23 da Defensoria Pública. Foram ouvidas as comarcas de Santarém, Ananindeua e Marabá (PA); Parnamirim, Ceará Mirim e Natal (RN); Aracaju e Nossa Senhora do Socorro (SE); Maceió (AL); Porto Alegre, Pelotas e Torres (RS); Campinas, Guariba e Tupi Paulista (SP); Campo Grande e Ponta Porã (MS); e Cuiabá (MT).

Marco Legal

A invisibilidade das adolescentes, incluindo as que pertencem a povos tradicionais (quilombolas e indígenas), é agravada pelo descumprimento do Marco Legal da Primeira Infância. A normativa, entre outros fatores, indica que o Poder Público deve garantir às adolescentes mães em privação de liberdade convivência com os filhos e as filhas na primeira infância.

“O desafio principal é reconhecer as adolescentes, em especial aquelas que são gestantes e mães, não somente como autoras de atos infracionais, mas como pessoas que têm direitos a serem zelados”, ressalta a publicação.

De acordo com a pesquisa, produzida no âmbito do Diagnóstico da Situação de Atenção à Primeira Infância no sistema de Justiça, caso a convivência com a criança não seja autorizada ou restrita a curto período, muitas vezes, ocorre a destituição do poder familiar e a permanente ruptura do vínculo materno-filial.

Capacidade de ressocialização

A relação materno-infantil, conforme análise das pesquisadoras Ana Gabriela Mendes Braga e Bruna Angotti, citada no relatório, é tratada como mecanismo adicional de punição. Ou seja, a “hipermaternidade, seguida da brusca hipomaternidade, se somaria à pena de prisão, gerando e aguçando o sofrimento”. Na prática, hipermaternidade e hipomaternidade se caracterizam pela convivência excessiva seguida da ausência de convivência.

A essa visão punitiva somam-se os chamados obstáculos culturais, que são apontados pela pesquisa de campo como um fenômeno que se relaciona com o “conservadorismo social”. A tendência desse conservadorismo é cobrar maior punição aos indivíduos “considerados desviantes, como mulheres e adolescentes que, respectivamente, tenham cometido crime e ato infracional”. O que seria um comportamento facilmente identificado na sociedade, de modo geral, também é percebido no sistema de Justiça.

Outro aspecto que chama atenção a respeito da detenção de jovens grávidas é a possibilidade da concessão de liberdade assistida. A medida restringe direitos, mas não impõe o afastamento total da adolescente de sua família e de sua comunidade. De acordo com a pesquisa, na avaliação de integrantes do Ministério Público, adolescentes envolvidas em roubos ou homicídios, atos graves, entretanto, não terão direito à liberdade assistida.

Os magistrados se dividem, quanto ao assunto, já que muitos fundamentam as decisões, segundo a pesquisa, no ato infracional que envolve violência contra pessoas. De acordo com a experiência de defensores entrevistados se o delito envolver uma arma, os magistrados tendem a fundamentar com base na violência objetiva e na periculosidade da adolescente. A possibilidade de reiterar outras práticas infracionais também é avaliada pelos juízes.

No entanto, outros magistrados entendem a infância como prioridade absoluta e decidem pela liberdade assistida mesmo nos casos de atos infracionais considerados graves. A pesquisa destaca que para esse grupo específico de magistrados o direito à convivência com a mãe se sobrepõe à gravidade do ato.

Dispositivo Legal

Criado em 2019 pelo CNJ, por meio de articulação com órgãos dos Poderes Executivo e Legislativo, o Pacto pela Primeira Infância prevê uma série de ações destinadas à melhoria das condições necessárias para a proteção integral do melhor interesse da criança, sobretudo, nos primeiros 6 anos de vida. O período, que inclui a gestação, é considerado fundamental para o desenvolvimento do ser humano.

Texto: Ana Moura
Edição: Karina Berardo 
Agência CNJ de Notícias

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