“Justiça e ciência devem andar juntas”, a afirmação foi feita pela supervisora do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde (Fonajus), Daiane Nogueira de Lira, durante a programação do Fonajus Itinerante, realizado em Florianópolis (SC) de 19 a 21 de março. No seminário O Direito e a Saúde: Repensando a Judicialização, a conselheira do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) destacou, ainda, que a judicialização da saúde se tornou uma epidemia, mas que “o Judiciário não pode conceder tratamentos sem evidências sólidas”.
De acordo com a conselheira, as decisões judiciais em processos de saúde devem ter fundamentação técnica. “A recente adoção das Súmulas Vinculantes 60 e 61 pelo Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que juízes devem considerar evidências científicas antes de conceder tratamentos e medicamentos”, lembrou. O seminário termina nesta sexta-feira (21/3).
Nesse sentido, o uso de notas técnicas para embasar as decisões é obrigatório, conforme as últimas decisões do Supremo. Segundo dados do Painel de Estatística do e-NatJus apresentados pela conselheira, há mais de 286,4 mil notas registradas no sistema. Dessas, 138.057 são notas do NatJus Nacional e outras 148.351 foram pedidas nos estados e no DF. Em 2024, foram registradas 98.631 peças, o que representou um crescimento de 40% de pedidos em relação ao ano anterior. Apenas em 2025, já foram pedidas mais de 23 mil notas técnicas aos NatJus nacional e estaduais.
Entre os principais temas tratados nas notas técnicas, estão o tratamento de autismo infantil, diabetes, neoplasia maligna (câncer) de mama e da próstata e fibromialgia. “A medicina baseada em evidências é um pilar fundamental para decisões seguras e racionais”, afirmou Daiane Nogueira Lira.
Durante a palestra O CNJ e o Pacto pela Saúde, a supervisora do Fonajus também falou sobre as mudanças que estão sendo construídas no sistema e-NatJus 4.0. De acordo com ela, a ferramenta será essencial para auxiliar o cumprimento dos Temas 1234 e 6 do STF, contribuindo para a desjudicialização e a prevenção de ações judiciais. “O novo sistema visa atender às diretrizes do STF, garantindo uma atuação judicial mais eficiente e alinhada a políticas públicas de saúde”, afirmou.
O e-NatJus 4.0 está sendo desenvolvido pelo Hospital Israelita Albert Einstein, em parceria com o Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA). A nova versão deve formar uma base de dados unificada com informações técnicas em saúde divulgadas pelo Ministério da Saúde, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) e pelos Conselhos Federais de Medicina (CFM) e de Farmácia (CFF). O objetivo é garantir uma visão abrangente e sistêmica dos dados e das análises técnicas em saúde.
Entre as inovações que serão agregadas ao sistema, está o uso de inteligência artificial, que vai sugerir os resultados prevalentes no banco de dados do e-NatJus sobre o tema pesquisado pelo magistrado ou pela magistrada e para o monitoramento, em tempo real, de todas as ações judiciais relacionadas à saúde no país.
Para isso, a plataforma será integrada aos sistemas dos tribunais e a ferramentas como o Codex e a Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br). A ideia é rastrear processos, trocar informações técnicas e jurídicas e agilizar a análise dos processos de saúde.
Para o presidente do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), desembargador Francisco Oliveira Neto, é preciso compreender a judicialização da saúde para além da simples decisão judicial. Segundo ele, o papel da magistratura não se resume a julgar, mas também a entender a complexidade dos conflitos e contribuir para soluções racionais e eficazes. “A decisão judicial, por si só, não basta. Ela precisa ser acompanhada de uma atuação inteligente do Estado para garantir a efetividade do direito à saúde”, afirmou.
Oliveira Neto disse, ainda, que é necessário qualificar ainda mais as decisões relativas à saúde a partir de informações técnicas consolidadas. “Por isso a interação entre magistrados, profissionais da saúde e gestores públicos é tão importante”, afirmou.
Fonajus Itinerante
O programa Fonajus Itinerante é uma inciativa do CNJ junto aos Comitês estaduais de saúde, a fim de promover o diálogo e fomentar a busca de soluções para a judicialização da saúde. Em Santa Catarina, a conselheira Daiane Lira destacou que houve um diálogo interinstitucional, em que foi reforçada a necessidade de pensar em mecanismos extrajudiciais de conflitos, de forma a desjudicializar especialmente as ações que tratam de medicamentos já incorporados nas políticas públicas do SUS. “Nesse sentido, é importante que, uma vez incorporados, esses medicamentos sejam concedidos pela via administrativa e não que o cidadão tenha de buscar esse direito no Judiciário”, reforçou.
O comitê estadual de Santa Catarina possui atuação plural, com a participação de diversos atores da Justiça e da Saúde. Além disso, o colegiado acaba de ampliar o convênio do NatJus de 22 para 112 comarcas.
As próximas edições do Fonajus Itinerante serão realizadas nos dias 8 e 9 de maio, no Amapá, e nos dias 5 e 6 de junho, em Minas Gerais.
Texto: Lenir Camimura, com informações do TJSC
Edição: Thaís Cieglinski
Agência CNJ de Notícias