Realizado nesta sexta-feira (16/4), o terceiro e último painel do Seminário Pacto Nacional pela Primeira Infância – Região Nordeste, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), teve como tema o Aprimoramento do Sistema de Justiça para a proteção e promoção do desenvolvimento na primeira infância. O projeto Depoimento Acolhedor Itinerante, do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), foi apresentado pelo corregedor-geral da Justiça de Pernambuco, desembargador Luiz Carlos Figueiredo.
Segundo o magistrado, o serviço possibilita que crianças e jovens, vítimas ou testemunhas de violência, sejam ouvidos de forma humanizada. Em 2010, o tribunal instalou a primeira sala para colher esse tipo de depoimento em Recife, com o objetivo de oferecer o mesmo atendimento em outras comarcas. “Em novembro de 2018, foi inaugurado o serviço de Depoimento Acolhedor Itinerante, que consiste numa unidade móvel adaptada, composta por sala de depoimento especial, sala de audiências tradicional, banheiro e secretaria. O serviço itinerante foi concebido para atender a demanda existente nas comarcas que até então não foram contempladas com a instalação de uma sala para tal.”
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De acordo com o corregedor-geral da Justiça de Pernambuco, o Depoimento Acolhedor e Depoimento Acolhedor Itinerante alcançou destaque no cenário nacional. Em 2018, foram seis audiências e sete depoimentos. Em 2019, foram 234 audiências e 279 depoimentos. Em 2020, por conta da pandemia, houve queda nos atendimentos, com 93 audiências e 113 depoimentos. “As trajetórias desses serviços são marcadas por uma qualitativa prestação jurisdicional, devido ao compromisso com a proteção, o acolhimento e o respeito às características inerentes à infância e juventude, assim como a observância aos normativos legais vigentes.”
Proinfância
O Projeto de Proteção à Infância e à Adolescência (Proinfância), boa prática premiada pelo Pacto Nacional pela Primeira Infância, também foi apresentada. O promotor de Justiça e coordenador auxiliar do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça da Infância, Juventude e Educação (Caojipe) do Ministério Público do Ceará, Flávio Corte Pinheiro de Sousa, falou sobre os bons resultados da iniciativa.
Ele destacou que a prática é simples e pode ser facilmente replicada em municípios de todo o Brasil. O projeto tem como objetivo especificar um fluxo organizacional cujas informações colhidas pelos delegados e juízes sobre a existência de filhos ou dependentes das pessoas encarceradas efetivamente cheguem a uma equipe multidisciplinar capaz de sistematizar essas informações, visitar as famílias, levantar suas concretas necessidades e identificar as intervenções sociais, educacionais e psicológicas necessárias, bem como garantir que a repercussão do encarceramento do genitor, genitora ou responsável seja o menor possível sobre os filhos ou dependentes.
Sousa elencou as bases legais que levaram o projeto a ser concebido: Art. 227 da Constituição Federal, Art. 3º item 2 da Convenção dos Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas (ONU), Resolução CNJ 213/205 e o Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.257/2016). “E essa legislação promoveu alteração, dentre outras legislações, no Código de Processo Penal para garantir que as autoridades públicas responsáveis pela investigação, processamento e julgamento dos atos criminosos, além de garantir a aplicação da lei penal, garantam igualmente que o encarceramento do suposto criminoso repercuta o mínimo possível nas crianças e nos adolescentes.”
Segundo o promotor de justiça, o Proinfância foi concebido em 2016 e concretizado em 2017. “Um dos desafios que enfrentamos, especialmente nesse período de pandemia, é a necessidade de ampliação da equipe multidisciplinar, maior articulação com a rede de garantia de direitos, dados de acesso às famílias incompletos ou desatualizados, redução do contato direto com os presos e presas, além da redução da realização de atendimentos presenciais e visitas domiciliares.”
Justiça Restaurativa
Já o juiz do Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE) e membro do Comitê Gestor de Justiça Restaurativa do CNJ, Haroldo Luiz Rigo da Silva, falou sobre o uso dessa prática na primeira infância. A Justiça Restaurativa é uma abordagem que envolve, tanto quanto possível, todos aqueles que têm interesse numa ofensa ou dano específico, num processo que coletivamente identifica e trata os danos, necessidades e obrigações decorrentes da ofensa, a fim de restabelecer as pessoas e endireitar as coisas, na medida do possível.
“Começamos a tentar buscar nessa conexão das duas normativas, que são o Marco Legal da Primeira Infância e a Resolução CNJ n. 225/2016, os espaços de encontro para a política da primeira infância e para a intervenção restaurativa. Sabemos que a Justiça Restaurativa se desenvolve em três dimensões: a relacional, que é a técnica aplicada ao caso concreto, institucional, onde ressignificamos as instituições que trabalham em prol da efetivação da política, e social, onde visualizamos a transformação social que aquela política trouxe para o meio social.”
O magistrado falou sobre o Programa Sergipe pela Infância e apresentou experiências e boas práticas promovidas pelos Tribunais de Justiça do Amapá (TJAP), do Piauí (TJPI), de Minhas Gerais (TJMG) e do Rio Grande do Sul (TJRS).
Defensorias Públicas
O defensor público do Ceará Adriano Leitinho Campos apresentou o mapeamento de escassez de Defensorias Públicas no Brasil e sua implicação no acesso à Justiça na primeira infância. Ele afirmou que faltam unidades da defensoria pública no Brasil como um todo. “Como garantir esse acesso à justiça à criança na fase da primeira infância ou aos seus familiares, que vai garantir a efetivação de muitos direitos fundamentais, se há escassez de defensoria?”
Hoje, o Brasil conta com 6.013 defensoras e defensores públicos estaduais em atividade, número muito aquém do necessário para atender a demanda. No caso do Nordeste, são 1.726 defensores públicos, apenas 28,7% do total, gerando um déficit de 1.812 profissionais. De acordo com o diagnóstico do Ministério da Justiça, o ideal é que um defensor público atenda cada grupo de 15 mil pessoas. Com isso, o déficit da categoria é de pelo menos seis mil defensores.
Avaliação
Para o juiz do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) e presidente do Fórum Nacional da Justiça Protetiva (Fonajup), Hugo Gomes Zaher, a relevância dos temas abordados ao longo da manhã revela o tom do CNJ e de todo Sistema de Justiça no envolvimento na proteção e promoção dos direitos da criança na primeira infância.
Ele relembrou que este mês o Pacto Nacional da Primeira Infância completou dois anos. “O que mostra que nesses dois anos já se consolidou entre os profissionais do direito a ideia de que o Sistema de Justiça é sim um parceiro nesse viés intersetorial na promoção e proteção desses direitos.”
A juíza auxiliar da Presidência do CNJ Trícia Navarro informou que, em breve, será assinada portaria conjunta envolvendo a aprovação do fluxo da escuta protegida. “Tínhamos grande expectativa com essa questão, que envolve o CNJ e cinco ministérios, entre os quais Saúde, Economia, Cidadania, Educação.”
Carolina Lobo
Agência CNJ de Notícia
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