A cobrança das dívidas dos profissionais com seus conselhos de classe, por regra, créditos de pequeno valor, não pode ter na judicialização seu principal meio. Esse foi o consenso da primeira parte do Seminário: Dívida Ativa dos Conselhos Profissionais, realizado no Conselho da Justiça Federal (CNJ) nesta segunda-feira (12/8).
Leia mais: Especialistas e magistrados debatem saídas para dívidas a conselhos profissionais
“A prestação jurisdicional não pode se resumir a atividade de cobrança”, enfatizou Heleno Taveira Torres, professor de direito financeiro da Universidade de São Paulo (USP). De acordo com o acadêmico, 74% de todos os processos que tramitam na Justiça Federal são execuções. Destes, metade são execuções fiscais. “Estamos gastando tempo e dinheiro com um caminho que não tem nenhuma efetividade e nem é o ideal só para cumprir o objetivo de cobrar”, comentou. “Precisamos encontrar formas alterativas para solução desse conflito pois o número de execuções fiscais vindas dos conselhos é enorme”
O professor, que participou do primeiro painel do evento, “Judicialização da Dívida Ativa dos Conselhos Profissionais”, comentou que entende que diversas leis, como a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), não proíbem mecanismos de descontos, como forma de estímulo à resolução consensual, caminho que deve ser incentivado, ele sugere a LRF não seja um “dogma absoluto”. Entre as alternativas, apresentou a realização de mutirões de conciliação, o uso das varas especiais para pequenas causas e a remissão de dívidas de valor ínfimo. O painel foi presidido pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e corregedor nacional de Justiça, Humberto Martins.
Para o juiz federal Marco Bruno, do Centro de Inteligência do Conselho da Justiça Federal (CJF), a lei de execução fiscal é de qualidade muito ruim, o que dificulta a solução dos conflitos. Ele contou que já teve que julgar uma cobrança da dívida ativa no valor de R$50. “Isso é totalmente irracional”, disse. Ele elencou algumas dificuldades que fazem com que as dívidas dos Conselhos Profissionais não tenham efetividade, entre elas a reflexão sobre o custo da cobrança, e a falta de regularização de formas de parcelamentos. “Precisamos ter uma política clara para cobranças de grandes valores e outra para cobrança de pequenos valores na dívida ativa. São atividades completamente diferentes”, explicou.
Regulamentação
O representante do Tribunal de Contas da União (TCU), ministro Weder de Oliveira, participou do painel “Conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas – Visão Geral”, presidido pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça Reynaldo Soares da Fonseca.
Weder destacou que a estrutura dessas entidades é pouco estudada apesar de sua importância. “Os conselhos profissionais movimentam anualmente R$ 4 bilhões”, ressaltou. “Para fazer uma empresa funcionar bem é preciso que ela tenha transparência nas suas informações. Quando cobramos informações, a empresa é obrigada a olhar para dentro, para seus dados e processos para entregar a demanda. Com os dados, é possível fazer críticas construtivas que irão melhorar os processos”, explicou Oliveira, ao falar sobre a necessidade de prestação de contas dos conselhos ao TCU.
Em contraponto a posição do TCU, Jenner Jalne de Morais, secretário executivo do Fórum dos Conselhos Federais, alertou que o próprio TCU demorou 16 anos para decidir que se deveria, ou não, fiscalizar as prestações de contas dos conselhos profissionais e, mesmo assim, optou por monitorar apenas os de esfera federal. “Hoje temos 15 Projetos de Lei que flexibilizam os pagamentos das contribuições aos conselhos profissionais além de outros projetos, entre eles o que proíbe a fiscalização da atividade econômica. Precisamos dar fórum especial para os conselhos profissionais sem privatizá-los”, destacou.
Acerca das modificações legais em tramitação no Congresso, o professor titular junto ao Departamento de Direito do Estado da USP, Elival da Silva Ramos, comentou sobre a legislação vigente e criticou a Proposta de Emenda à Constituição nº 108/2019, que muda a natureza jurídica dessas entidades, que deixam de ser públicas e passam a ser privadas. “Como podemos delegar a função de ‘policia’, de fiscalização, que é do Estado, para um órgão privado? Isso é totalmente inconstitucional”, questionou.
Paula Andrade
Agência CNJ de Notícias